
Para a grande maioria do público que acompanhou a ascensão do nome Criolo em 2011 quando, de repente, o artista estava sendo citado nos shows de Chico Buarque e cantando ao lado de Caetano Veloso o amplamente elogiado Nó na Orelha foi o álbum de estreia do rapper do Grajaú, distrito da zona sul de São Paulo. O disco se espalhou com força surpreendente e o colocou entre os nomes mais festejados da música brasileira recente.
Era natural que houvesse uma grande expectativa em torno do trabalho seguinte de Criolo, e que o cantor sofresse a pressão do segundo disco, tão comum a artistas elogiados em suas estreias.
Mas Nó na Orelha, na verdade, já era o segundo disco do paulistano Kleber Gomes, que em 2011 tinha 23 anos de carreira e um disco na bagagem o bem menos conhecido Ainda Há Tempo (2006). O sucesso chegou quando ele não esperava mais nada. Logo, o recém-lançado Convoque Seu Buda, cuja turnê chega a Curitiba em dezembro, nasceu em um clima de dever já cumprido por parte de Criolo.
"A gente se questionava qual a necessidade de fazer outro disco, já que o Nó na Orelha nos deu tanta coisa boa", explica o rapper, em entrevista por telefone para a Gazeta do Povo. "O álbum veio no sentido de uma celebração, de agradecimento a tudo o que pessoas maravilhosas me proporcionaram", diz, com a sobriedade e a generosidade que lhe são peculiares ao falar sobre o êxito tardio que ele até hoje diz não entender.
"Acho que alguma energia maravilhosa chegou e falou vamos dar uma força para esse cara, que já está há mais de 20 anos aí", brinca.
Rap e canção
Convoque Seu Buda celebra a seu próprio modo. Novamente cunhado em parceria com os produtores Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral, e em sintonia com alguns dos artistas mais interessantes da cena atual de São Paulo (como Tulipa Ruiz, Rodrigo Campos e Kiko Dinucci, que participam das faixas), o álbum mira novamente em uma sonoridade antenada e na ambivalência de Criolo como rapper e cancionista pendendo um pouco mais para o primeiro de forma não intencional, conforme explica o músico. "Poderia acontecer de não ter nenhum rap", diz. "Fizemos um passadão de todas as canções, e a partir dele, começamos a levantar as músicas que nos emocionavam mais. Tem canções de cinco anos atrás, poemas de dez, e coisas feitas esse ano", conta Criolo.
Por meio de seu rap com traços peculiares, o artista versa com ironia sobre o culto fantasioso ao luxo do ponto de vista de um funcionário de bufê em "Cartão de Visita"; trata de questões atuais pungentes como as desocupações violentas na faixa-título; e cita Edi Rock e Sabotage em "Esquiva da Esgrima".
Usando a canção, Criolo canta sobre a fragilidade dos moradores de rua diante da expansão imobiliária em "Casa de Papelão"; faz um divertido samba sobre um padeiro em dia de greve de ônibus ,"Fermento pra Massa"; e explora a música nordestina em "Pegue pra Ela", uma espécie de afro-beat com baião contornado pelos pífanos do saxofonista e flautista Thiago França, que também assina o potente arranjo de metais de "Casa de Papelão".
Das temáticas mais duras ao humor, tudo ganha um verniz de transcendência, à maneira do próprio nome que Criolo escolheu para o disco. "Dentro desse caos todo que está posto, não se pode esquecer que dentro de você existe algo positivo", diz o cantor, explicando o significado de "convocar seu buda". "Por mais difícil que seja o lance, há algo que ajuda a buscar esse equilíbrio", diz.




