
Em tempos de ânimos políticos acirrados e discussões sobre os limites do humor e da liberdade de expressão, a opinião de Henrique de Souza Filho, o Henfil (1944-1988) não pode ser desconsiderada. A Editora Kuarup acaba de relançar o livro Como se faz Humor Politico 30 anos depois da primeira edição.
A obra é a transcrição de uma longa entrevista concedida ao jornalista Tárik de Souza, que continua pertinente ao momento político atual.
No prefácio da obra, o escritor Sérgio Augusto faz esta indagação: "O que estaria fazendo o inquieto Henfil se vivesse setentão no Brasil de hoje, no gozo de suas faculdades físicas e mentais?" Boa pergunta.
Considerado o mais brilhante cartunista de sua fértil geração, Henfil dá várias pistas neste livro-entrevista que acabou sendo o ultimo que publicou em vida. O volume foi uma encomenda do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), que solicitou a editora Vozes, que publicava Henfil, um livro com o título "Como se faz humor político", para integrar a Coleção Fazer.
No auge da carreira e envolvido até o pescoço com a campanha das Diretas Já, Henfil, ao invés de redigir o texto, convidou o jornalista e amigo Tárik de Souza para entrevistá-lo.
"Gravador ligado, o que rola neste livro é quase um improviso jazzístico. Não houve pauta, nem quaisquer perguntas combinadas previamente. Saímos tabelando sem deixar a bola cair até o final. O trabalho de edição foi mínimo: o que saiu do gravador já era o livro", explica Tárik.
O jornalista disse que não se surpreendeu com a atualidade do pensamento de Henfil, sobre política, imprensa e liberdade. "Ainda denso e pertinente. Em parte, porque mudam os nomes, circunstâncias e as mazelas continuam suplantando as virtudes humanas. Mas na maior parte, porque o Henfil é craque. E soa atemporal", diz Tárik.
Incorreto
Henfil talvez tenha sido o mais politizado da fértil geração de cartunistas da qual fez parte. Seu traço rápido, as críticas mordazes e o sarcasmo deliciosamente impróprio desafiaram a censura do regime militar e influenciaram a vida política e social do país nos anos 1970 e 1980. Henfil participou ativamente de movimentos importantes como a Anistia e também foi o criador do bordão e do slogan do movimento Diretas Já, que clamava por eleições diretas para a Presidência da República em 1984.
No livro, Henfil fala de se sua relação com o leitor e com seus empregadores, defende que todo humor precisa ser político e que é impossível fazer humor partidário ou panfletário. "Você pode criar um personagem para defender determinada ideia, mas, como você precisa da parceria do leitor, pode o veneno virar remédio, e vice versa", teoriza.
No final da apresentação, Sérgio Augusto conclui que Henfil provavelmente estaria "atirando em todas as direções, testando as mídias disponíveis e talvez confinado a um próprio site de internet onde pudesse dar vazão a seu humor malicioso, anárquico e politicamente incorreto para os dias de hoje". Boa resposta.





