
"Música é como alimento. É preciso comer para ficar forte, se manter em pé." É simples assim a relação de Virgilio Savarin, 50 anos, com a música. "Quando alguém me diz que não tem o costume de ouvir música, de comprar discos, eu desconfio. Essa pessoa não deve nem ter coração", completa.
Partindo dessa lógica, Virgilio tem um coração enorme e vive de barriga cheia há quase quatro décadas. Pois foi no início dos anos 1970 que Savarin, aos 12 anos, descobriu a música, quando conseguiu um emprego de office-boy em uma das maiores lojas de discos da cidade na época, a Wings Discos. "Foi o destino que me colocou lá", explica, lembrando que havia acabado de chegar a Curitiba, vindo de Antonina, com o sonho de se tornar um jogador de futebol.
Na Wings, Virgilio fez, além de muitos clientes, amigos que o ensinaram tudo o que ele precisava saber sobre música. "Às vezes, os próprios clientes faziam questão de que eu ouvisse discos de que eles gostavam. Eu sempre tive muito respeito e muito interesse em guardar as informações que eles tinham para compartilhar comigo, pois sabia que eram seus tesouros preciosos", conta.
Em 1983, o "patrão" de Virgilio, como ele chama o ex-chefe até hoje, decidiu encerrar as atividades da Wings Discos. Não restaram dúvidas: era hora de abrir a própria loja. Foi na rua Saldanha Marinho, perto de onde funcionava a Wings, que teve origem a Savarin Records, loja que Virgilio mantém até hoje. "A loja ganhou destaque graças a um sistema que eu inventei. As pessoas que tinham discos de vinil de que não gostavam mais em casa, poderiam trocá-los ou vendê-los na loja. Fui o primeiro a fazer isso", orgulha-se o empresário, citando o principal tipo de comércio que move os diversos sebos hoje existentes em Curitiba.
Segundo Virgilio, a Savarin também foi pioneira em vender CDs na cidade, em uma época em que era difícil encontrar no comércio os aparelhos que os tocavam. "Fui para Miami comprar discos para a loja e o vendedor me mostrou alguns CDs, dizendo: essas pequenas caixinhas vão acabar com o disco de vinil". Mesmo não acreditando na profecia do norte-americano, Savarin trouxe alguns exemplares para seu estabelecimento. Um dos primeiros clientes a perceber a novidade, estranhou quando viu aquelas "caixinhas" posicionadas lado a lado com uma estampa parecida tratava-se de uma coleção de música clássica. "Vai começar a vender quadros de decoração, Savarin?", perguntou o cliente, desavisado.
Modernidade
E esta foi apenas uma das "revoluções" tecnológicas vividas por Virgilio ao longo de suas décadas como amante e comerciante de música. A mais recente, inclusive, prejudicou bastante seu negócio. "A nova geração já não compra CDs ou discos. Eles baixam as músicas da internet. Não se importam sequer em ver as capas dos álbuns que estão ouvindo", lamenta.
Mesmo com uma certa "birra" de computadores, a Savarin Records possui um site bastante completo na internet, onde é possível adquirir os produtos disponíveis na loja ou encomendá-los. "Isso foi ideia do meu filho. É ele que atualiza todos os dias", justifica, apontando para Adriano, filho mais velho, que trabalha com ele desde os 16 anos. "Minha lembrança de infância é do meu pai chegando em casa com pilhas de discos. Lembro dele limpando os vinis e colocando plásticos nas capas", conta Adriano, que pretende seguir o legado do pai e manter a Savarin viva. "Enquanto existirem pessoas com bom gosto musical, a loja vai continuar funcionando", garante o pai.
Fã do rock setentista que marcou sua juventude, Virgilio divide com os filhos além de Adriano, de 29 anos, a família é composta pelos gêmeos Tiago e Diogo, de 24 a paixão pela música e a coleção imensa de LPs e CDs: são 5 mil vinis e 3 mil discos laser. Os jovens clientes da loja também acabam compartilhando o amor de Savarin pela música. "Esses dias, um garoto de 16 anos veio aqui em busca de um disco do Jethro Tull. Fui perguntar a ele de onde conhecia o grupo e fiquei emocionado ao ver que ele estava seguindo os passos do pai, que havia mostrado a banda. Na hora pensei: nem tudo está perdido", desabafa.



