
Um dos destaques da programação paralela da Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo deste ano, encerrada ontem, foi o grande número de mesas voltada à literatura infantojuvenil, com foco maior nas obras para crianças. Os livros infantis são muito produzidos, muito consumidos, mas pouco discutidos, concluíram alguns conferencistas, entre escritores e ilustradores. O inglês Peter Hunt e o venezuelano Fanuel Hanan Diaz, críticos do segmento, falaram sobre esse mesmo assunto, mas em mesas diferentes e com focos diversos. Enquanto o primeiro falou sobre os temas polêmicos nos livros para crianças, o segundo abordou o uso de imagens no processo de leitura.
Para Peter Hunt, tanto a linguagem quanto o conteúdo dos livros infantis mudaram drasticamente nos últimos anos: "Hoje a literatura infantil é mais influenciada pela multimídia e tem um conteúdo mais explícito, com mais dualidade moral". Isso acontece, em parte, porque a partir dos anos 70 e 80, as crianças deixaram de ser protegidas do mundo adulto. "Muda-se a infância, muda-se a literatura junto."
O maior problema no modo como a literatura vem sendo feita, para o crítico, é um controle excessivo do universo infantil por parte dos autores: "os autores, adultos, temem danificar de algum modo a infância da criança, e passam a fazer livros que não oferecem nada de novo." Ele cita como exemplo, as obras infantis que tratam do futuro. "São distopias. Criam um mundo futurista assustador no qual a criança precisará viver quando crescer!", exclama. Sendo assim, adverte: "Um bom livro infantil é aquele que estabelece um espaço respeitoso de diálogo entre o mundo adulto e o infantil".
Elementos narrativos
As influências dos livros europeus e americanos na produção brasileira e latinoamericana, para o teórico Fanuel Diaz, é notória. "A literatura latinoamericana é realista e trata principalmente de problemas urbanos. A figura do garoto de rua, por exemplo, é frequente, e análoga a figura do órfão europeu. Quando o livro salta para uma dimensão mais fantástica, acontece uma tropicalização dos temas de contos de fadas", explica. Sobre isso, Peter Hunt comenta: "A literatura infantil tem como um dos objetivos dar poder às crianças. E o único poder que uma criança realmente pode ter sobre alguém maior é o poder de pregar peças e enganar, da inteligência".
Há também, segundo Diaz, uma influência no estilo de livro. O livro-álbum europeu, em que ilustração e texto se complementam, como Onde Vivem os Monstros, de Maurice Sendak, se tornou popular por propor uma nova forma de abordar a leitura. Hunt vê as novas ilustrações, menos realistas, como positivas por reforçar sua ideia de não tratar a infância do ponto de vista adulto: "Os livros antigos diziam à criança como elas deveriam escrever e desenhar. Hoje, a linguagem e as imagens estão mais próximas do universo infantil".
Peter Hunt afirma que a transformação na literatura ainda não aconteceu completamente: "Estamos no meio de uma revolução nos livros para crianças, que começou há cerca de dez anos e vai durar mais uma década pelo menos. É uma época muito excitante para o gênero."



