Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Literatura

Em Frankfurt, escritor indígena diz que governo Dilma é retrocesso

Usando cocar, que reserva só para ocasiões especiais, e vestindo uma camiseta com os dizeres "Presidenta Dilma: não ignore nossos povos indígenas. Queremos conversar'', o escritor Daniel Munduruku, 42, fechou neste domingo (13/10) a programação brasileira na Feira de Frankfurt, ao lado do também autor de livros infantis e ilustrador Fernando Vilela.

Àquela altura, no final do maior evento editorial do mundo, o auditório brasileiro já não estava cheio como permanecera desde a manhã de sábado. Mesmo assim, a presença do único autor de origem indígena da delegação nacional atraiu brasileiros e estrangeiros interessados em questões como a instalação de usinas hidrelétricas no Brasil, a situação das reservas florestais e a maneira como o autor trata da questão indígena em suas obras infanto-juvenis.

"Aprende-se nas escolas do Brasil que o indígena é um povo do passado'', disse o autor. "Ser indígena não é ser perfeito, longe disso, é ser humano, com falhas e defeitos como todo ser humano. Isso obviamente tem que aparecer nos meus livros para que não se criem novos estereótipos. Mas existe uma magia da cultura indígena a partir da qual é possível criar."

Com mais de 40 livros publicados no Brasil, inclusive como parte de campanhas educacionais, e algumas obras traduzidas para o inglês, o espanhol e o coreano, Daniel Munduruku argumentou que sua obra "é toda voltada para educar a cabeça das pessoas".

Foi o que buscou fazer, também, durante a mesa. "Aqui na minha camiseta está escrito "queremos conversar'. Não queremos atrapalhar o progresso, frear o desenvolvimento. Queremos ser ouvidos. O que acontece hoje é que se ignora a voz as populações indígenas. Queremos que o governo olhe para os nossos povos", disse o autor, que tinha a mesma frase de protesto traduzida para o alemão nas costas da camiseta.

Ao fim da mesa, disse à reportagem que "o governo não tem chamado os povos indígenas para conversar" e que houve um retrocesso nesse aspecto no governo Dilma.

"Se houve muitos avançou no governo Lula, mais aberto ao diálogo, hoje retrocedemos. Nosso interesse é sobretudo em participar das decisões no que diz respeito às barragens hidrelétricas, que já estão acontecendo sem conversa", disse o escritor, doutor em educação pela USP e "um dos 30 autores indígenas no mercado editorial brasileiro", segundo conta.

Em Frankfurt, embora tenha aparecido em reportagens como o único autor de origem indígena da lista - algo que os alemães, sem conhecer a realidade brasileira, estranharam -, Munduruku não foi assediado pela imprensa.

Além da mesa deste domingo, participou de duas leituras para crianças em escolas. "Eram como se eles estivessem vendo um extraterrestre. Fiz toda a minha performance de pintura, o que os deixou curiosos sobre os povos indígenas e como eles vivem", contou o autor, que mora em Lorena, no interior do Estado de São Paulo.

Ameaça

A política indigenista atual do Brasil também foi tema de outro debate, na quinta-feira, no pavilhão brasileiro.

"Os direitos dos índios estão particularmente ameaçados hoje'', disse uma das principais antropólogas brasileiras, Manuela Carneiro da Cunha, que debateu com a colega Lilia Moritz Schwarcz.

"A bancada ruralista está propondo uma série de medidas que representa uma descaracterização completa dos direitos dos índios. É um ataque às conquistas da Constituição de 1988", complementou Carneiro da Cunha.

Schwarcz também tratou do racismo no país, tema que "sempre deu o que falar, desde os tempos de América Portuguesa".

Respondendo a uma pergunta do público, sobre o fato de Luiz Ruffato ter "falado mal do Brasil", Schwarcz disse que "o que estamos tentando não é falar mal, é falar mais".

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.