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Literatura

Em queda livre

O escritor João Almino, também diplomata, aborda literariamente impasses humanos em O Livro das Emoções, o quarto romance do autor que traz Brasília como cenário

João Almino trata da inevitável decadência humana em seu mais recente romance, O Livro das Emoções | Bia Wouk
João Almino trata da inevitável decadência humana em seu mais recente romance, O Livro das Emoções (Foto: Bia Wouk)

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O ser humano se move em busca de seus possíveis desejos ou para evitar aquilo que o incomoda? De outra maneira: é o amor ou o ódio o motor do homem e da mulher? Ou então seria o conflito entre o que se gosta e o que se quer evitar que motiva e faz um ser se mover? Pode ser que sim, pode ser que não. Tudo pode, não é mesmo? Tais indagações se deflagram a partir do contato com o enredo de O Livro das Emoções, romance recém-lançado, de autoria de João Almino.

A narrativa, de 254 páginas, tem como personagem central Cadu, um sujeito que já passou pela juventude, é adulto e caminha em direção, inevitável, do que chamam de melhor idade. Fotógrafo, deixa o Rio de Janeiro após ser abandonado por aquela que considerava ser a mulher de sua vida, a personagem Joana. A partir de então, estabelece-se em Brasília, oscilando entre um emprego fixo e outro "bico" em busca dos dinheiros necessários, apenas, para quitar as contas. E, em meio a esse turbilhão, procura esquecer o seu grande amor devorando uma mulher após outra.

O protagonista decide, então, fazer um acerto de contas e revisão de sua trajetória por meio da elaboração de um livro que tem o mesmo título do romance de Almino: "O livro que pretendo escrever com base no meu velho diário fotográfico poderá ser considerado um álbum de minhas memórias sentimentais e incompletas, de uma época em que eu via, e via demais. Vou chamá-lo O Livro das Emoções". O romance de Almino é feito a partir dos capítulos escritos por Cadu. Cada capítulo é batizado com um título que remete a um momento importante de sua trajetória, sobretudo mulheres. Esses capítulos dialogarão com eventuais fotografias clicadas pelo narrador. E, entre capítulos, o protagonista também fará anotações em um diário, em itálico na narrativa.

O verbo errar

Cadu, enquanto personagem ficcional, representa o sujeito (da realidade) que não se encontra, só se desencontra. Uma vez sozinho, não terá satisfação com nenhuma das muitas mulheres com quem vier a se deitar. Inesperadamente, encontra uma possível companheira, Aída. "Com Aída ao meu lado, me despia, por fim, de minhas defesas". Mas seria uma breve temporada, porque um câncer acabaria, rapidamente, com a existência de Aída e com aquele curtíssimo idílio, a dois, para Cadu. Outra vez só, o protagonista, entre vários erros existenciais, terá outra surpresa (definitiva e fatal) do destino (ou do enredo?).

O personagem central sofre pela falta de reconhecimento. "Meu problema era que os outros, me considerando um fotógrafo medíocre, não reconheciam o grande artista que vivia dentro de mim". No entanto, problema maior, para Cadu, será perder a visão. Ele ficará, irremediavelmente, cego. Um fotógrafo cego. E realizar "O Livros das Emoções", além de ser uma busca de seus rastros, será também uma tentativa de se aproximar daquela que o abandonou (Joana) e, pior que isso, o trocou por um político, sujeito que Cadu abomina.

Eduardo Kaufman, o personagem político, simboliza, para Cadu, um corrupto que sempre consegue escapar, ileso, de todas as suas muitas ações ilegais. Cadu, em suas odisséias e ilíadas pessoais, tem a finalidade, simultânea e conflitante, de exterminar Kaufman e ainda se realizar. Mas a missão falha. Não haverá vingança. Tampouco rendenção. "Minha vida foi feita de pequenos fracassos e desencontros, uma vida vivida às avessas, não pelo que consegui realizar, mas pelo que deixei de fazer".

Serviço:

O Livro das Emoções, de João Almino. Record. 256 págs., R$ 35.

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