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Música

Essa tal de Rita 'n' roll

Nunca faltam rojões e fogos de artifício no aniversário de Rita Lee. Ela nasceu no dia 31 de dezembro. Portanto, a artista mal tem tempo de comemorar a nova idade e a virada do ano. Tudo novo – e faz sentida. Ela mesma, em uma canção oitentista, já se definiu como "uma mutante, no fundo sempre sozinha". Ainda que em meio a uma multidão.

Diante do inevitável risco de a 60.ª primavera da cantora de rock mais importante do país passar em brancas nuvens, ou melhor, perder-se entre contagens regressivas, homenagens a Iemanjá e os inevitáveis shows da virada de ano, a Biscoito Fino adiantou-se e resolveu colocar o bloco de Rita na rua antes do tempo.

A gravadora carioca está lançando neste mês a caixa Biograffiti, com três DVDs dirigidos por Roberto de Oliveira, também responsável pela série de documentários musicais de Chico Buarque, lançadas pela EMI e grande sucesso de vendas. A coleção reúne imegens de shows, programas de TV e depoimentos que dão conta das quase quatro décadas de carreira de Rita, falando de sexo, drogas e, é lcaro, muito rock-and-roll.

Performer

No segundo volume de Biograffiti, intitulado "Baila Comigo", dedicado à sua relação pessoal e profissional com o marido e parceiro Roberto de Carvalho, Rita confessa gostar mais de cinema e televisão do que de música. A afirmação, vinda de um ícone da cultura pop brasileira, pode até causar uma certa estranheza, mas quem conhece um pouco mais de perto a trajetória da artista sabe que ela sempre manteve com a câmera uma relação íntima e pessoal.

Rita Lee é, sobretudo, uma performer. Cômica, debochada e surpreendente. Por isso, assistir aos três volumes de Biograffiti é mais do que uma experiência musical – é quase uma aula informal de história do rock nacional. Rita sai-se muitíssimo bem como protagonista e comentarista da própria história.

Dos três discos, o primeiro, intitulado "Ovelha Negra" (em alesão ao grande hit do disco Fruto Proibido, de 1975), é o que tem um viés mais histórico, resgatando as origens da cantora. Fala de seus pais, vasculha seu passado escolar, visitando seu antigo colégio Liceu Pasteur, em São Paulo. É lá que surgem as primeiras pistas do temperamento intempestivo e até certo ponto contraditório de Rita.

Dentre os números musicais, muitos deles ligados à fase Mutantes, banda seminal do rock nacional do qual Rita fez parte, estão "Panis e Circenses", mas o episódio também se estende ao rico período no qual Rita trabalhou com a banda Tutti Frutti, que legou à posteridade CDs importantes como Fruto Proibido, Entradas e Bandeiras (1976) e Babilônia (1978).

"Ovelha Negra" inclui duas participações imperdíveis: Caetano Veloso, que com Rita divide o microfone em uma saborosa releitura de "Eu Sou Terrível", de Roberto e Erasmo Carlos; e um inusitado depoimento do sempre verborrágico tropicalistaTom Zé.

Caso sério

Como já foi dito, o DVD "Baila Comigo" é dedicado à relação entre Rita e Roberto, iniciada em uma festa, com os pombinhos roqueiros tocando piano a quatro mãos. A união, iniciada no fim da década de 70, passou por altos e baixos, algumas separações, mas mantém-se firme e forte. Além de ter gerado três filhos: Beto, de 30 anos, João, com 28, e Antônio, 26.

O episódio, entrecortado por cenas de uma apresentação de Rita na Praia de Capacabana, no dia 20 de janeiro de 2007, tem como um de seus destaques a história da gênese da canção "Mania de Você", um dos maiores hits da dupla.

Depois de uma tórrida sessão de sexo, que, nas palavras de Rita, teria passado por vários cantos da casa, Roberto, no lugar do habitual cigarrinho, empunhou o violão e começou a dedilhar uma nova melodia. Era uma balada. Rita, por sua vez, catou uma caneta e foi escrevendo os versos ("Meu bem, você me dá água na boca/ Vestindo fantasias, tirando a roupa"). Incluída no disco Rita Lee (1979), a música é até hoje um dos maiores sucessos da carreira de ambos.

Melhor ainda, contudo, é a história do encontro musical entre Rita e João Gilberto, gravado para um especial da Rede Globo, no início dos anos 80. Juntos, cantam "Joujoux et Balagandans", clássico de Lamartine Babo. O detalhe revelado pelo episódio é que o dueto aconteceu sem que Rita tivesse ensaiado uma vez sequer com o mestre bossanovista. No horário previsto para passar o som, João, dono de um notório temperamento difícil, brigou com alguém da equipe e trancou-se, emburrado, no camarim. Ainda assim, o resultado final, incluído no DVD, é sublime, acreditem.

Filha de Eva

Filha de pai norte-americano e de mãe descendente de italianos, Rita cresceu cercada de mulheres. Além da figura materna, as irmãs Mary e Virginia tiveram enorme influência na vida e na formação da cantora. Além delas, várias outras, das cantoras do rádio a estrelas de Hollywood (leia entrevista ao lado), passando por comediantes e até bandoleiras. Essa sua relação com o feminino é discutida no terceiro – e, talvez, mais interessante – volume da caixa, Cor de Rosa Choque.

Admitindo que nunca foi "a gostosa do pedaço", Rita diz que sua imagem desprovida de carga erótica a tenha ajudado a forjar, por meio de sua obra, uma outra identidade, sobretudo em suas composições. Ela descreve-se como capaz de evocar nas letras "uma sacanagenzinha tesudinha apimentada e bem feminina", que sempre mexeu com as cabeça do seu público.

Canções como a já citada "Mania de Você" e outros hits do calibre "Banho de Espuma", "Chega Mais", "Pega Rapaz", "Final Feliz", estas últimas classificadas por Rita como rock carnavalesco, atestam esse lado libidinoso light de Rita. "Sou, com muito orgulho, uma compositora de motel", admite.

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