O Graciliano Ramos que conhecemos, ou julgamos conhecer, é um sujeito de poucos sorrisos, desconfiado, muitas vezes ríspido, um tanto quanto ranzinza e quase sempre autodepreciativo. Correta ou não, foi essa a imagem que "colou" no autor de "Vidas Secas" (1938). Mas desde outubro do ano passado, data dos 120 anos de nascimento do autor, uma série de homenagens vem tentando iluminar nuances de sua personalidade . A USP realiza amanhã, quando a morte do escritor alagoano completa 60 anos, um colóquio sobre sua obra. Em abril, o documentário "O Universo Graciliano", de Sylvio Back, concorre no festival É Tudo Verdade. Os festejos devem permanecer quentes até julho, ocasião em que Graciliano será o autor homenageado pela Flip (Festa Literária Internacional de Paraty). Back vem pesquisando vida e obra de Graciliano (1892-1953) nos últimos dez anos. No início a ideia era adaptar o romance "Angústia", que Graciliano publicou em 1936, para as telas. No processo de escrita do roteiro, releu os demais livros dele, visitou Alagoas e conheceu parentes e amigos do escritor. A adaptação de "Angústia" foi suspensa, mas teve como fruto o documentário, ainda sem data de estreia no circuito comercial. "Tentei desvendar Graciliano numa espécie de road movie ao imaginário sobrevivente em torno dele." O documentário reconstitui a vida do escritor de forma não cronológica, agrupando depoimentos, por exemplo, da única filha de Graciliano ainda viva, Luiza, hoje com 82 anos, e escritores como Lêdo Ivo ( 1924-2012) e Hélio Pólvora. Em Palmeira dos Índios (AL), cidade onde Graciliano foi prefeito entre 1928 e 1930, Back encontrou um ex-engraxate de 102 anos e um ex-motorista de 92 que conheceram, ainda bastante jovens, o escritor e sua família. Namoricos Os depoimentos não trazem grandes análises literárias, mas compõem um retrato interessante e inusitado. O historiador Ivan Barros conta histórias saborosas de Graciliano pulando muros em Palmeira dos Índios para encontrar as amantes. Elizabeth Lins do Rego, filha do escritor José Lins (1901- 1957), era criança quando conheceu Graciliano e relata que ficou impressionada com o charme e a conversa dele. Em vários depoimentos surgem rumores de paixões e "namoricos" do escritor, inclusive com a escritora Rachel de Queiroz (1910-2003). Luiza, por sua vez, retrata o pai como um homem extremamente gentil, amoroso. Lembra-se de ter visto Graciliano, já muito debilitado pelo câncer, chorando pela morte do líder comunista Joseph Stálin (1879-1953), em 5 de março de 1953. Graciliano morreria 15 dias depois. O humor ácido do escritor também rende ótimas histórias. O jornalista Armênio Guedes certa vez perguntou o que ele achava de Jorge Amado. A resposta foi direta: "O Jorge escreveu algumas das melhores páginas da literatura brasileira, mas também muita porcaria".
Cinema
Filme mostra um Graciliano Ramos sedutor
O documentário reconstitui a vida do escritor de forma não cronológica, agrupando depoimentos, por exemplo, da única filha de Graciliano ainda viva



