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OPINIÃO

Curitiba quer criar Rua da Cerveja, mas por que não uma Rua da Literatura?

Nada contra estimular o comércio de cervejas artesanais da cidade, mas não se vê iniciativa semelhante em nenhum campo da cultura

Após uma reunião com representante de cervejaria, Greca decidiu criar uma Rua da Cerveja em Curitiba. | Pedro Ribas/SMCS
Após uma reunião com representante de cervejaria, Greca decidiu criar uma Rua da Cerveja em Curitiba. (Foto: Pedro Ribas/SMCS)

No fim de fevereiro, a prefeitura de Curitiba divulgou uma notícia informando que o prefeito Rafael Greca quer criar na cidade uma “Rua da Cerveja”. O polo cervejeiro deverá se instalar na Rua Carlos de Laet, no Hauer, mesma rua em que está instalada a fábrica da cervejaria curitibana Bodebrown. Não à toa, a notícia veio a público após uma visita do diretor comercial da Bodebrown, André Amarante, a Greca.

A inspiração para a criação da Rua da Cerveja são os eventos promovidos pela própria Bodebrown aos finais de semana, em que se fazem visitas à fábrica e degustação de cervejas. A partir da iniciativa, a prefeitura deverá realizar dois eventos-teste para avaliar o impacto para a população do entorno e tomar providências relativas ao trânsito, estacionamento e poluição sonora.

Ainda que a iniciativa da criação da Rua da Cerveja agrade especialmente os interesses de uma empresa específica, há benefícios indiretos para outras cervejarias e para o comércio do bairro – a ideia é que, além de cerveja, também se venda comida, transformando a rua num novo ponto turístico da cidade. Ao criar uma Rua da Cerveja, Curitiba está estimulando a economia do município e ajudando a consolidar uma cultura de consumo de cervejas artesanais. Em um levantamento recente, a Gazeta do Povo contabilizou pelo menos 25 microcervejarias instaladas em Curitiba e região.

É de se lamentar, somente, que não se veja esforço semelhante para o estímulo à cultura da capital. Um exemplo: em Belo Horizonte (MG), escritores e produtores culturais estão se organizando pela criação da Rua Literária, projeto que transforma o trecho de uma rua na Savassi, bairro boêmio e cultural da capital mineira, em um espaço dedicado à literatura. A ideia não é nova: livreiros instalados na região querem fechar duas quadras da rua, aos sábados pela manhã, para que as pessoas circulem livremente entre três livrarias instaladas na região. A diferença é que, agora, o projeto foi encampado por um vereador da cidade, que promete levar adiante a ideia e obter o apoio necessário da prefeitura.

Curitiba não tem potencial para ter uma rua literária? Hoje é difícil encontrar um local da cidade que reúna três livrarias próximas. Fora dos shoppings, é claro. Livrarias de rua são cada vez mais raras em Curitiba. O que também é ruim do ponto de vista da ocupação do espaço público. Mas já tivemos alguma tradição nesse negócio. A Livrarias Curitiba mantém uma loja no calçadão da Rua XV. A Livraria do Chain também ocupa espaço importante na General Carneiro, em frente à Reitoria da UFPR. Mas perdemos locais importantes na última década: a Livraria do Eleotério, na Amintas de Barros; a Guerreiro, na XV de Novembro; e a saudosa Ghignone da Comendador Araújo são algumas que vêm à memória.

Aliás, se pudéssemos sugerir, por que não uma Rua da Literatura de Curitiba na Comendador Araújo, no trecho entre a Brigadeiro Franco e a Presidente Taunay? O espaço já é quase um bulevar no Batel. Seria uma homenagem a José Ghignone, que poderia ser capitaneada pelo grupo Livrarias Curitiba, maior empresa do ramo no estado, com presença da Arte & Letra (livraria de rua da região) e, por que não, das grandes livrarias dos shoppings, como a Saraiva, a Cultura e a Livraria da Vila.

Fechar o trecho de uma rua num sábado pela manhã não exige esforços hercúleos. Há eventos isolados na cidade que já fazem isso, com apoio da vizinhança, e têm o seu êxito. Se Curitiba perdeu a tradição das livrarias de rua, não perde a tradição literária. Temos a honrar a memória de Emiliano Perneta, Emílio de Menezes, Helena Kolody, Paulo Leminski, Manoel Carlos Karam, Jamil Snege e a vida de todos os escritores curitibanos na ativa, viventes aos olhos do mais célebre vampiro de Curitiba, Dalton Trevisan.

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