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Literatura

Geoff Dyer escreve de sexo, drogas e Bienal

Jeff em Veneza, Morte em Varanasi trata de temas existenciais, mas com fartas doses de bellini, belos visuais e aventuras amorosas com um quê erótico

Geoff em Veneza: descrições capazes de transportar o leitor para as cidades onde ambienta a trama de seu romance | Jason Oddy/Divulgação
Geoff em Veneza: descrições capazes de transportar o leitor para as cidades onde ambienta a trama de seu romance (Foto: Jason Oddy/Divulgação)

Uma das maiores benesses que um livro pode nos fornecer, além do conhecimento, é o indescritível prazer de "viajar" em suas páginas. E é justamente esse um dos principais atrativos de Jeff em Veneza, Morte em Varanasi, do escritor britânico Geoff Dyer. A história começa em Londres, passa por Veneza (Itália) e é finalizada em Varanasi (Índia).

Finalizada é maneira de dizer porque, assim como muitos outros romances da nova escola inglesa, o enredo não tem propriamente um fim – característica que costuma incomodar e desiludir a maioria dos leitores não-experimentados.

A falta de um fim declarado, porém, não a torna em nada menos interessante. A riqueza e o comprometimento dos detalhes, pensamentos e sensações que envolvem e delimitam o personagem principal, Jeff Atman, provavelmente é um deles. O elemento literário mais instigante do livro é o modo como o autor vê e caracteriza o anti-herói.

Jeff é um jornalista de meia-idade, frustrado com o trabalho e desencantado com a vida. Sente que os anos lhe escapam mais rápido do que gostaria e é exatamente essa a sensação que o le­­va a lugares e situações às quais ele talvez não esperasse mais viver.

Como jornalista freelancer de uma revista de arte, Jeff é enviado à Veneza para cobrir a famosa Bienal. Entre a busca por credenciais, um caso tórrido com uma americana chamada Laura, as festas nababescas regadas a baldes de bellinis e a entrevista exigida por seu editor, Geoff descreve através dos olhos de Jeff a beleza e o romantismo incomparável de uma cidade histórica riscada por embarcações e prédios centenários. E é com certa felicidade que se constata que a descrição de Geoff faz emergir um lugar que já habita inconscientemente – através de filmes, livros ou pinturas – o imaginário de todos nós.

Isso fica muito claro logo às primeiras páginas do livro. Ao descrever o calor da cidade, o frenesi típico aos grandes eventos culturais, os canais imponentes e o vai-e-vem dos vaporettos repletos de turistas e jornalistas, Geoff transporta imediatamente o leitor para Veneza. O leitor só sairá de lá na segunda parte do livro, quando Jeff recebe um convite de última hora para uma viagem à Varanasi.

Metáfora

Varanasi é exatamente o oposto de Veneza. Na cidade indiana não há festas, bellinis, sexo ou drogas – temas recorrentes na passagem do personagem por Veneza. Na cidade indiana, Jeff encontra a morte – não a morte física, mas algo metafórico – e fica encantado com o intrigante ritual da queima de corpos no rio Ganges.

Ao contrário do hedonismo dos dias de Bienal em Veneza, em Varanasi Jeff encara a si próprio. Na Índia, influenciado pela espiritualidade e misticismo do lugar, Jeff tem um encontro consigo mesmo. É lá que Jeff se despe das vaidades e alcança uma espécie de nirvana nunca antes experimentado por ele.

Jeff em Veneza, Morte em Varanasi é um romance moderno, existencialista e repleto de reflexões culturais e morais que, vez ou outra, povoam a cabeça da maioria dos mortais. Ao fim da leitura, além do prazer de acompanhar o desenvolvimento de uma boa história, fica a vontade imperiosa de arrumar as malas e partir para Veneza.

Serviço:

Jeff em Veneza, Morte em Varanasi, de Geoff Dyer. Tradução de José Rubens Siqueira. Intrínseca, 320 págs., R$ 39,90.

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