
Hoje em dia, quando uma peça de teatro clássica ganha os palcos, é em releituras das mais diversas, e Hamlet é um dos textos que mais têm novas roupagens para citar uma, a Sutil Cia., de Felipe Hirsch, apresentou em 1997 Estou Te Escrevendo de um País Distante, em que Guilherme Weber vivia Gertrudes e Nena Inoue, Hamlet.
A abordagem mais recente estreia hoje no Teatro Experimental Universitário, o Teuni, na sede histórica da UFPR. Só deve comparecer para assistir a Hamlet(Ego)Trash, da companhia Rainha de 2 Cabeças, quem suporta e aprova ver clássicos dilacerados.
No caso, a trama do príncipe dinamarquês que vê o espírito do pai, morto recentemente, e ouve sobre o que na verdade fora um assassinato, perpretado pelo tio (qualquer semelhança com O Rei Leão não será coincidência). Antes da revelação, a esposa do rei já se casara com o ex-cunhado. Seguem-se dias de angústia em que Hamlet se cobra vingar a morte do pai, mas é impedido por questionamentos humanistas (nos célebres solilóquios, incluindo aquele em que diz "ser ou não ser...eis a questão").
"A história é um ponto de partida, um motivo para falarmos de questões contemporâneas", alerta o diretor Cesar Almeida, que conversou com a reportagem. Esse é um aviso que ele dá em cena, nas primeiras falas da peça (leia ao lado). "Depois da primeira cena, se o público quiser ir embora, pode. Contamos a história logo no início, para quem não tem paciência de ficar."
Há algo de podre no teatro brasileiro, na opinião de Almeida. A origem do mal seria o desejo de exposição, a autoidolatria e cabotinismo de alguns artistas. Outra questão que, segundo ele, está no subtexto de Hamlet é a corrupção do homem pela sede de poder.
Carnavalesco
Almeida e a atriz Maite Schneider comandam o show, interpretando uma dezena de personagens, numa sátira da superficialidade que eles acusam na vida artística local. Nisso, são acompanhados por dois DJs.
"As pessoas adorariam ser artistas para ser adoradas, mas não levam em consideração o conteúdo da obra", brinca o diretor. E Hamlet é uma dessas obras preferenciais que os artistas escolheriam para se "super super expor" daí a escolha por ela.
Com linguagem despudorada e irreverência diante do clássico de Shakespeare, o grupo inclui elementos visuais carnavalescos no figurino e no cenário.
A alusão ao erotismo é outra constante na peça, partindo do par romântico-trágico formado entre Hamlet e Ofélia. Há momentos de nudez, motivo pelo qual a peça é recomendada a maiores de 18 anos.
Hamlet(Ego)Trash aborda diversos outros aspectos da peça inglesa. É citada, por exemplo, a "peça dentro da peça", momento em que o castelo recebe a visita de uma trupe teatral usado habilmente por Shakespeare para questionar o fazer dramatúrgico de sua época. Aqui, é aproveitado por Almeida em sua cruzada contra a "transferência do ego para a vida pública".
Aniversário
A companhia Rainha de 2 Cabeças existe há impressionantes 30 anos há poucos grupos tão antigos na cidade e comemora o aniversário com este espetáculo. O grupo encenou outra versão de Hamlet há 16 anos.



