
Tim Burton nunca foi um apaixonado pela obra de Lewis Carroll. Talvez porque os livros e todas as adaptações feitas para o cinema limitariam-se, segundo ele, a mostrar Alice como uma menina desnorteada a vagar por um mundo instável, tropeçando em personagens loucos. "Nunca senti qualquer conexão emocional com as histórias." A esperança do cineasta norte-americano em Alice no País das Maravilhas, sua versão em 3D dos romances do autor britânico, que estreia dia 23 de abril no Brasil, é ter feito um filme ao mesmo tempo envolvente e capaz de tocar o espectador.
Para a construção do roteiro, o diretor norte-americano buscou inspiração no poema nonsense "Jabberwockyw", que integra o livro As Aventuras de Alice através do Espelho, cujo enredo é a base do filme de Burton, muito mais do que o volume anterior, que dá título à produção. Traduzida no Brasil pelo concretista Augusto de Campos, sob o título de "O Jaguadarte", a poesia mistura, num redemoinho sonoro, palavras de verdade e inventadas, dando ao leitor uma sensação de vertigem. É esse sentimento que o cineasta pretende causar no espectador que for assistir a seu longa-metragem.
A trama apresenta Alice Kingsleigh, agora aos 19 anos, em estado emocional de luto. Acaba de perder o pai vale lembrar aqui que a ausência paterna é tema recorrente na obra de Burton. Sem saber, a personagem se vê no centro de sua própria festa de noivado, organizada pela mãe e pela irmã à sua revelia. No momento em que o arrogante lorde Hamish Ascot (Leo Bill) lhe pede a mão, diante de centenas de convidados da alta sociedade inglesa, algo desvia a atenção da futura noiva: um coelho branco vestindo uma casaca, de cujo bolso ele retira um relógio. É a deixa para que, acuada por uma escolha que não é sua, Alice mais uma vez escape. Ela mergulha atrás do roedor no País das Maravilhas, onde esteve dez anos antes.
Nesse mundo, onde sonho e pesadelo se confundem, Alice reencontra velhos conhecidos, entre eles o Chapeleiro Louco (Johnny Depp), que lhe delega duas missões de vida ou morte. A primeira é derrubar a autoritária e malévola Rainha de Copas (Helena Bonham Carter), que usurpou o trono de sua irmã, a Rainha Branca (Anne Hathaway). A outra é destruir o dragão Jabberwocky. A criatura vem aterrorizando os habitantes do País das Maravilhas, a mando da Rainha de Copas.
Como uma fuga da realidade, que se mostra mais cruel que o mundo onírico onde se meteu, Alice embarca em suas missões, que se revelam uma jornada de autoconhecimento e um ritual de passagem para a idade adulta.
Escolha difícil
A escolha de uma atriz que conseguisse personificar a complexidade de Alice não foi tarefa fácil. embora inúmeras atrizes conhecidas tivessem expressado o desejo de interpretar a personagem, Burton preferiu apostar em uma jovem relativamente desconhecida, a australiana Mia Wasikowska, vista recentemente no seriado In Treatment. "Queríamos alguém que tivesse é difícil explicar exatamente o quê em palavras uma certa gravidade, uma vida interior complexa e evidente. Mia tem um tipo de força simples da qual realmente gostamos. Ela não é flamboyant, nem muito exibida, mas alguém que parece guardar muito em seu interior. Por isso, a escolhi."
Embora a produção de Alice no País das Maravilhas seja dos Estúdios Disney, onde Burton trabalhou nos anos 1980 e produziu O Estranho Mundo de Jack (1993), coube à Sony Pictures Imageworks responder pelos efeitos visuais do filme. A escolha da tecnologia 3D não foi meramente uma estratégia para atrair mais público aos cinemas, seguindo os passos de Avatar, de James Cameron.
Burton sentiu que o mundo fantástico retratado pelas histórias de Carroll poderia se beneficiar dessa possibilidade estética. Mas o longa foi rodado com câmeras convencionais e mais tarde, durante a fase de pós-produção, convertido para a tridimensionalidade. Filmar direto em 3D, como Cameron fez, teria inviabilizado o projeto pelos altos custos do equipamento.




