
Não é novidade que Hollywood infantilizou-se ao longo das últimas décadas. Como boa parte do público que frequenta os cinemas nos Estados Unidos é jovem, e busca entretenimento de consumo rápido, temáticas adultas, tramas complexas, que reflitam o estado de coisas no mundo contemporâneo, são artigos raros nas dezenas de milhares de multiplexes do país. Filmes adultos acabam ficando restritas ao limitado circuito de salas de exibição voltadas à produção autoral, presente em grandes centros urbanos e cidades universitárias.
Em busca desse público mais maduro, e acima de tudo exigente, que procura no audiovisual um espaço para a discussão de assuntos sérios, mais densos, a televisão norte-americana vem ao longo dos últimos anos oferecendo séries, minisséries e telefilmes que dificilmente seriam realizados pelos grandes estúdios. E, mesmo que fossem feitos, encontrariam espaço de exibição e público limitado, salvo raras exceções.
Não faltam exemplos de produções televisivas que levam aos lares não apenas de norte-americanos, mas de todo o mundo, histórias sofisticadas, cheias de nuances psicológicas e discussões tanto de cunho social como político, que conseguem ao mesmo tempo provocar e por que não entreter.
Grande vencedora do prêmio Emmy deste ano, Homeland, que já havia levado o Globo de Ouro, é exibida nos Estados Unidos pelo canal Showtime e está conseguindo fazer o público norte-americano parar para pensar de uma forma bem menos maniqueísta sobre as transformações ocorridas no país depois dos ataques terroristas do 11 de Setembro de 2001.
Criada pelos mesmos autores do sucesso 24 Horas, Homeland conta a história da agente da CIA Carrie Mathison (Claire Danes, vencedora do Emmy e do Globo de Ouro), que tem absoluta certeza de que o fuzileiro naval Nicholas Brody (Damien Lewis, Emmy de melhor ator), que passou oito anos como prisioneiro da Al Qaeda, converteu-se em terrorista, ainda que o soldado seja recebido como herói e lançado como candidato ao Congresso, como deputado federal. Detalhe: ao mesmo tempo em que Carrie parece ser a única a desconfiar de Brody, ela também se apaixona por ele, que enfrenta problemas conjugais com a mulher, Jessica, vivia pela brasileira Morena Baccarin.
Defendendo a tese de que o terrorismo contra os Estados Unidos é, sim, consequência da muitas vezes equivocada política externa norte-americana, Homeland deixa claro que o inimigo não é necessariamente o "outro" muçulmano e oriundo do Oriente Médio ou do Afeganistão e do Paquistão. O perigo pode morar ao lado, fomentado, inclusive, pela forma como os EUA conduzem seus interesses internacionais.
Ao vencer o Emmy, Homeland quebrou a hegemonia de outra grande série: Mad Men, que havia vencido o prêmio de melhor produção dramática por quatro anos consecutivos. Criada por Matthew Wiener, que foi roteirista da premiada A Família Soprano, já teve cinco temporadas e retrata o mundo da publicidade na Nova York dos anos 1960, uma década de profundas transformações, como a revolução sexual, os movimentos feminista e gay, a luta pelo direitos civis e a contracultura.
O caráter de certa forma subversivo da série tem na figura do protagonista, o publicitário Donald Draper (John Hemm) a sua síntese. Sobrevivente da Guerra da Coreia, ele troca de identidade com um colega de batalhão, morto em combate, e, assim, deixa para trás um passado triste de abusos sofridos desde a infância.
Como o ambicioso Don Draper, ele vive o sonho norte-americano: casa-se com uma jovem linda e loira, Betty (January Jones), moldada na beleza clássica e distante de Grace Kelly, constitui família e, aos poucos, alcançar grande sucesso profissional. Mas seu passado aos poucos o alcança e, tendo as mudanças quo o país vivencia como pano de fundo, Don sofre as consequências de seu segredo, mas não exatamente sendo punido, ou redimido, como aconteceria em uma produção hollywoodiana convencional.
Como se vê, a televisão tem se apropriado de temas bastante complexo, como a luta contra o câncer (The Big C, com Laura Linney), o submundo do tráfico de drogas (Breaking Bad, com Bryan Cranston e Alan Paul) e os bastidores da notícia (The Newsroom, estrelado por Jeff Daniel e Emily Mortimer), sempre com excelente dramaturgia e elenco de primeira, muitas vezes de atores consagrados no cinema.








