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Veja a íntegra da entrevista exclusiva que Ian Anderson, líder e vocalista do Jethro Tull deu à jornalista Juliana Girardi, da Gazeta do Povo, feita por telefone nesta terça-feira.

O Jethro Tull já esteve no Brasil diversas vezes, mas agora a banda traz na bagagem um show batizado de Acoustic/Electric Tull Concerts. Poderia dar mais detalhes sobre este espetáculo e dizer no que ele difere dos demais já apresentados aqui?Digo que esta é uma turnê acústica e elétrica porque a banda vem se revezando entre duas turnês, uma totalmente acústica e uma elétrica e acústica. É esta última que estamos levando ao Brasil e que, na verdade, é o que fazemos desde 1969, ou seja, mesclar canções acústicas e elétricas. Não gosto de rotular nosso show como acústico e nem como um show de rock, porque o Jethro Tull não é uma banda de rock, como são Iron Maiden ou Motörhead. Nós usamos instrumentos acústicos e eu sempre fui um músico acústico. Batizamos a turnê desta maneira, porque é a melhor definição que encontramos, afinal de contas, tocamos canções acústicas, algumas totalmente totalmente elétricas e outras que misturam ambas as coisas.

E quanto ao repertório do show? O que a banda está planejando?O repertório será especialmente formado por canções clássicas como "Aqualang", "Locomotive Breath", "Thick as a Brick" e "Budapest"; outras mais obscuras que também fazem parte da nossa extensa discografia; possivelmente duas canções inéditas; além de composições de outros artistas. Como sempre, tentamos montar um repertório que não fique preso apenas aos nossos grandes hits, pois isso seria muito chato para nós, então também tentamos mostrar um lado mais obscuro do nosso trabalho. Até porque muita gente já assitiu a um show do Jethro Tull e não queremos que elas vejam sempre a mesma coisa. É possível dizer que este show é no mínimo 67% diferente do que o show passado que apresentamos no Brasil.

E quanto ao público da banda, que todos sabem ser bastante fiel, seria possível afirmar que pelo menos 90% das pessoas que vão aos shows do Jethro Tull no Brasil nesta turnê são as mesmas que estiveram presentes em outras ocasiões em que grupo passou pelo país?Acho que 90% é muita coisa. Talvez uns 70%, porque há muitas pessoas na platéia que estão assistindo ao primeiro show do Jethro Tull de suas vidas. Para estas, tocamos nossas músicas mais famosas. Para as que já tiveram a oportunidade de conferir o show desta turnê em outras ocasiões, fazemos algo diferente. Tentamos sempre manter em mente que há pessoas diferentes na platéia todos os dias, então tentamos apresentar um show interessante para todas elas. Meu compromisso é fazer com que todos sintam-se levemente desconfortáveis (risos).

O que você quer dizer com isso exatamente? Desconfortáveis em que sentido?Acho que o Jethro Tull seria muito mais conhecido se fôssemos uma banda de rock pesado. Se ainda hoje tocássemos como na época das turnês de Aqualung (1971) e Thick as a Brick (1972) seria como uma "quick fix" (dose mínima para atingir o efeito de uma certa droga), como uma picada de heroína ou uma carreira de cocaína, seria como uma forte dose de uma droga poderosa. Mas eu não me interesso por drogas de nenhum tipo. O que quero dizer, é que minha música é desafiadora em certos termos. Quando digo que meu objetivo é deixar as pessoas levemente desconfortáveis, é a mais pura verdade. Eu gosto da tensão que consigo criar no público com algo estranho ou pouco familiar. Acho necessária a existência dos elementos de confusão e dúvida que surgem nas pessoas diante de algo que elas não têm certeza se gostam ou não. E nós temos apenas alguns minutos para tentar convecê-las de que sim, elas poderão gostar daquilo, se ao menos experimentarem. Não gostaria de ser parte daquele tipo de banda que simplesmente entrega a mercadoria na porta do freguês sabendo que ele mesmo poderia ter comprado tudo se tivesse ido ao supermercado. Eu não quero ser como um entregador de mercearia, que vai até a sua casa entregar exatamente o que você deseja comer todos os dias. Quero poder entregar algo que a pessoa nunca tenha comido antes, e que talvez até tenha uma sabor esquisito, mas de que ela talvez goste. É importante experimentar novos ingredientes quando você se senta numa mesa para jantar, assim como quando você se senta num auditório para assistir a um concerto musical.

Acha então que o experimentalismo presente na sonoridade do Jethro Tull pode ser um dos fatores que atraem novas gerações a mergulhar no universo da banda?Acho que as pessoas mais jovens vêm aos nossos shows principalmente porque é o tipo de música que seus pais passaram a vida ouvindo. Se você vai a um show dos Rolling Stones, com certeza não é porque está interessado nas canções do álbum mais recente deles. Você quer mesmo é conferir ao vivo os clássicos dos anos 60, talvez alguns dos anos 70, mas algo além disso, esqueça. Ninguém é a fim de ouvir o que eles fizeram a partir dos anos 80 e acho que esse é o maior problema deles. Mas desde o começo, em 1969, eu sempre busquei me aventurar cada vez mais musicalmente e, talvez por isso, nossos fãs estejam mais acostumados com o fato de o Jethro Tull fazer algo de mais mérito. Os mais novos querem ver qual é o encanto que a nossa música produz, desejam tentar descobrir e entender o porquê de seus pais gostarem mais das nossas canções do que de "Stairway to Heaven" (risos).

A banda está trabalhando em um novo álbum certo? Em que estágio está sua realização e quando pretendem lançá-lo?Temos cerca de oito canções prontas, mas só vamos voltar ao estúdio em setembro, quando pararmos de viajar. Então, acredito que o novo álbum deve ficar pronto apenas no final do ano, com lançamento previsto para o início de 2008. Acham que conseguem esperar tanto tempo? (risos)

Seu interesse em instrumentos variados e músicas de diferentes culturas são beneficiados pelo fato de estar constantemente viajando pelo mundo? Aproveita as turnês da banda para conhecer novos artistas de países diferentes, que possam agregar algo a mais à sonoridade do Jethro Tull?Sempre que viajamos recebo CDs de pessoas que vão aos nossos shows, escuto algo que está tocando nos elevadores ou vazando pela janela de algum carro. Dia desses recebi um CD de um músico brasileiro e fiquei bastante interessado em ouvir, pois ele era um flautista. Mas acabei ficando bastante decepcionado, pois além de não ser nada diferente do que eu já havia ouvido, percebi que ele tentava emular a minha maneira de tocar. Mas este não é um problema exclusivamente brasileiro. Por todos os lugares que passo recebo álbuns de bandas novas que não passam de imitações. A garotada de hoje assiste a muita MTV e acha que não há nada de errado em simplesmente copiar o que anda sendo feito em outros países. Não vejo nada de errado em aproveitar elementos musicais de outras culturas, mas desde que seja algo que sirva para intensificar a música que já se faz, e não para simplesmente reproduzi-la com a pretensão de soar original.

Nesse sentido, podemos dizer que há algo de brasileiro em sua formação musical?Sim, é perfeitamente correto fazer esta afirmação, mas não em relação ao rock contemporâneo que é produzido aí, e sim ao jazz e à música clássica brasileira. Pode parecer estranho, mas mesmo quando adolescente eu nunca gostei de ouvir rock. Sempre gostei mais de jazz, música clássica e principalmente folk. Todos os dias ouço rock, de bateria estridente e guitarras altas, durante duas horas, que é o tempo em que estou no palco. Fora dele, procuro fugir de instrumentos em volumes intensos e ouço coisas completamente diferentes do que acabei de tocar para acalmar os ânimos após os shows.

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