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Visuais

Inhotim: arte, natureza e interação

Museu mineiro é espaço privilegiado de exposição permanente de artistas internacionais e brasileiros como Oiticica, Cildo Meireles e Adriana Varejão

”Narcissus Garden” (2009) de Yayoi Kusama: perfeita integração à natureza | Pedro Motta
”Narcissus Garden” (2009) de Yayoi Kusama: perfeita integração à natureza (Foto: Pedro Motta)

No meio de uma paisagem castigada pela mineração, entre montanhas, num município com me­­nos de 35 mil habitantes, o Instituto Cultural Inhotim é uma reserva de arte contemporânea e paisagismo como não se vê em nenhum outro rincão do Brasil. Instalado em Brumadinho, a 60 quilômetros de Belo Horizonte, esse museu a céu aberto ocupa uma área de 100 hectares de jardim botânico, mais o triplo de mata nativa, e só recebe obras que façam sentido nesse contexto de contato com a natureza.

O tempo em Inhotim é outro. O visitante sai da galeria on­­de vê uma instalação performática do pernambucano Tunga e percorre a beira do lago artificial até se deparar com um trio de es­­culturas de Edgar Souza. Pega carona em um carrinho, como aqueles usados no golfe, e chega ao "iglu" feito por Olafur Eliasson, dentro do qual a iluminação interrupta congela instantâneos de um jorro de água, como se fossem esculturas mutantes. Depois sobe até o "Sonic Pavilion", projetado por Doug Aitken, que escavou 200 metros em direção ao centro do planeta e implantou um sistema de som com amplificação e equalização capaz de re­­produzir ao nível auditivo do vi­­sitante os microrruídos do estômago da Terra.

Muitas das galerias são permanentes. E as que não são, recebem mostrar temporárias com duração média de dois anos. O efê­­mero, lá, segue um relógio mais lento.

Na Galeria Mata, a maior parte das obras foi trocada em 2009. Entre elas, a "Seção Diagonal", de Marcius Galan. Ele cria, com a pintura da parede e do chão, uma ilusão de vidro que confunde a percepção do espectador. Também é recente, nos termos de Inhotim, o espaço dedicado ao fotógrafo Miguel Rio Branco, que expõe as expressivas séries "Blue Tango" e "Máscara da Dor", cujas chagas, feridas e in­­filtrações na vida de uma população contrastam de modo impactante com a paz ao redor.

Experiências

A localização traz suas peculiaridades. Como não se trata de um museu urbano, em que se percorre os corredores linearmente, o espectador vivencia experiências muito particulares.

Duas tendências são notáveis no acervo. De um lado, há estímulos interativos para o público, convidado a se relacionar com obras num ambiente destituído da austeridade dos museus tradicionais. É o caso das cinco salas da galeria Cosmococa, de Hélio Oiticica e Neville d’Almeida, cujo procedimento comum é a projeção de slides adulterados com pó de cocaína, criando desenhos transgressivos sobre os rostos de Marilyn Monroe e Jimi Hendrix, em ambientes que convidam a deitar-se na rede ao som do guitarrista, nadar na piscina ou lixar as unhas sobre colchonetes.

Por outro lado, sente-se o contraste da natureza com a intervenção humana. "O contato com a natureza, com a água, muda nossa percepção e sensibilidade, e nos faz enxergar de uma maneira diferente o que está dentro da galeria", comenta a curadora assistente Julia Rebouças.

Inhotim costuma convidar artistas a desenvolver projetos de longa duração. Primeiro, eles conhecem Brumadinho e a paisagem do entorno, para então pensar num trabalho que se relacione. Como fez Chris Burden em "Beam Drop", ao arremes­­sar vigas de metal sobre o cimento fres­­co espalhado no cume de um morro, de onde não se vê nada do museu, apenas montanhas a delinearem o horizonte ao longe. "São trabalhos que esses artistas consagrados nunca mostraram em lugar nenhum ou nunca nessas proporções", diz Julia.

A curadoria se norteia por uma questão essencial: "O que podemos montar em Inhotim e que não poderia ser montado em nenhum outro lugar a não ser lá?", diz ela. "Faz pouco sentido obras que seriam vistas também no Moma ou no Masp".

São quatro os curadores, de origens, gerações e ideias distintas. O diretor-artístico é o alemão Jochen Volz, radicado em Belo Horizonte. Ele curou a Bienal de Ve­­neza anterior e tem vasta experiência in­­ternacional. O norte-americano Allan Schwart­zman, curador-chefe, vive em Nova York, onde acompanha o circuito de artes. Rodrigo Moura, mineiro, é ex-curador do Museu de Arte da Pampulha. E a sergipana Julia, a mais nova entre eles, com 27 anos.

"Uma coisa importante que Inhotim traz para o cenário nacional é um museu que mostra obras permanentes. Se as pessoas querem ver um Da Vinci, vão ao Louvre. No Brasil, não temos esse hábito. Nossas instituições não investem muito em acervo. Mas, a qualquer mo­­mento que se queira ver a obra do Cildo Meirelres, sabe-se que se vai encontrá-la em Inhotim".

Alguns artistas têm representação maior no acervo, concentrado em obras produzidas a partir dos anos 1960. Entre os brasileiros, Cildo Meireles e Adriana Varejão possuem galerias próprias e, assim como Tunga e Hélio Oiticica (1937-1980), tornam-se pontos de cruzamento que direcionam as discussões artísticas em torno do museu.

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