
Jorge de Lima (1893-1953) vai ressurgir, em breve, de seu último desaparecimento. A editora paulista Cosac Naify acaba de ganhar, junto aos herdeiros, os direitos de publicar a obra do poeta e romancista, que estava sob os cuidados da carioca Record. A papelada está nos trâmites finais. Agora a Cosac Naify corre para lançar uma edição comemorativa de Invenção de Orfeu, principal livro de Jorge de Lima, até o fim do ano, quando se completam (em 15 de novembro) 60 anos da sua morte.
"Depois dessa edição especial, vamos lançar, no começo do próximo ano, uma edição mais barata, que possa ser adotada nas escolas. Acho que apresentar Jorge de Lima para as novas gerações é uma intervenção cultural importante. Além disso, ele tem tudo a ver com o nosso catálogo", diz Florencia Ferrari, diretora editorial da Cosac.
Não é a primeira vez que o escritor some e reaparece. As explicações podem ser várias. Uma delas é ele ser um poeta difícil de ser lido e complicado de ser classificado. No começo da vida, Lima era parnasiano e, mais tarde, abraçou o modernismo. Escrevia romances e poemas regionalistas, mas tinha influência do surrealismo europeu. Essa última corrente inspirou suas fotomontagens.
E, em meio a tudo isso, ainda estavam suas habilidades como médico. Nos fundos da sua casa, havia um laboratório onde ele fabricava remédios da época: Orthoraxol, para tosse; Thaumat, para o estômago; e Cytosan, contra a sífilis.
Nos anos 1960, a editora Nova Aguilar já relançava a obra de Jorge de Lima com a intenção de tirá-lo do ostracismo das letras. Nos anos 1990, foi a vez da Record. Depois, ele sumiu de novo. Embora seja da segunda geração do modernismo a mesma de Carlos Drummond de Andrade e Cecília Meireles , o escritor alagoano nunca teve a mesma fama dos seus pares. Não está nem no currículo das escolas.
Mas Jorge de Lima continuou conhecido no meio literário. Virou, por assim dizer, um poeta de poetas. Numa de suas raras entrevistas à imprensa, Raduan Nassar já apontou Invenção de Orfeu como uma das principais influências poéticas do seu romance Lavoura Arcaica. Fora isso, o autor alagoano já influenciou obras mais pop. O musical O Grande Circo Místico, de Chico Buarque e Edu Lobo, é inspirado no poema homônimo de Jorge de Lima, de 1938. Até na Marquês de Sapucaí sua obra já desfilou, quando foi enredo da Mangueira, em 1975. A escola ficou em segundo lugar.
Nova edição
A Cosac Naify convidou Luís Bueno, professor de literatura brasileira da Universidade Federal do Paraná (UFPR), para trabalhar na edição da prosa do autor.
"Os romances de Jorge de Lima são muito interessantes. E, infelizmente, a crítica literária não tem se dedicado a eles", afirma Bueno.
Já para cuidar da poesia, faceta mais conhecida da obra do alagoano, a Cosac Naify chamou o professor de teoria literária da USP Fábio de Souza Andrade. "Ele não é conhecido do grande público, mas é um dos grandes poetas brasileiros do século 20. Ele surge no momento em que a literatura nacional está em ótima forma", diz Andrade.
A Cosac Naify espera que os dois pesquisadores tragam para as novas edições um olhar mais atual sobre Jorge de Lima.
A Cosac Naify quer lançar Invenção de Orfeu, um épico de 12 mil versos, como um livro de arte. Para isso, prepara uma pesquisa em arquivos e bibliotecas atrás de material inédito do autor. O próximo passo é ver o que os herdeiros guardam no acervo de família. A ideia também é reunir as pinturas e as fotomontagens surrealistas do autor, que flertava com as artes plásticas e foi premiado na 1.ª Bienal de Arte de São Paulo.




