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Festival de Curitiba

Lições de bom comportamento no teatro

Muitas vezes, a comunhão artística na plateia de um espetáculo pode se tornar um pesadelo para alguns

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Vamos fazer um acordo: antes de começar a ler esta reportagem, tente lembrar o que aprendeu na escola e em casa. As broncas que levou quando era criança por não saber se comportar em determinados lugares, a vergonha ao se sentir deslocado ou a triste sensação de ter prejudicado alguém, mesmo sem querer. Isso mesmo: busque recordar exemplos recebidos no seu processo de formação do bom e velho bom senso. Com essas lembranças em mente, talvez fique mais fácil ler esta matéria, já que vamos falar justamente sobre a falta que ele faz.

O Festival de Curitiba se aproxima e o clima coletivo de disposição para encarar novas experiências está no ar. Este também é um período de estresse para quem têm sua experiência artística atrapalhada, quando não arruinada, por algum exemplo de mau comportamento. Mande o primeiro e-mail quem nunca sofreu com aquela conversa fiada na fila de trás. Ou com chutes em seu assento? Com pessoas chegando atrasadas? Maus exemplos não faltam.

Para tentar entender esse curioso caso de pessoas que não conseguem se comportar em plateias, especialistas falaram à Gazeta do Povo sobre o que não deve ser feito nessas situações. Foram ouvidos Liana Justus e Clarice Miranda, professoras do curso de formação de plateia do Solar do Rosário e escritoras de quatro livros sobre o tema; a consultora de imagem Cíntia Castaldi; o diretor do grupo de teatro Tanahora, Laercio Ruffa; e o psicólogo e professor Rubens Weber.

Vale lembrar que essas situações podem ser resolvidas com dois itens básicos. Segundo a professora Clarice Miranda, "educação e conhecimento devem estar presentes em qualquer tipo de apreciação artística coletiva".

Não se informar antes

"Muito mais importante do que se comportar, é a pessoa ter o mínimo de informação e conhecimento sobre o que ela está indo assistir", comenta a professora Clarice. Um exemplo simples: drama e tragédia não são para rir (pelo menos, não o tempo todo). Mesmo quando o espetáculo é interpretado por um ator conhecido por seu envolvimento com a comédia. Isso não implica, obrigatoriamente, boas risadas. Tente criar uma seleção baseada em vários itens, como elenco, sinopse e direção. Às vezes, você pode levar seus filhos para uma simples peça sobre o império romano e dar de cara com um cenário digno dos devaneios de Calígula.

Chegar atrasado ao local

"É uma questão bem complicada. Em outros países, o espectador que chega fora do horário é proibido de entrar na sala. Atrapalha quem está sentado e também quem está no palco", avalia Cíntia Castaldi. E a situação pode ficar bem pior quando a pessoa tenta sentar no assento marcado durante a compra do ingresso. "Caso aconteça o atraso, você tem que sentar no primeiro local que encontrar. As peças têm horário marcado, basta se programar e sair mais cedo", conclui a consultora de imagem. Acerte seu relógio!

Usar celular ou câmeras

Algumas pessoas ainda não atendem os sinais de "desligue o celular" ou "proibido fotografias". "Imagina se 10% das pessoas dentro de um teatro resolvem fazer isso?", questiona Cíntia. "Ninguém vai acompanhar a peça. Você comprou o ingresso e está participando dela. Usando o celular, você não consegue", finaliza. E não precisa bancar o paparazzi o tempo todo, é só usar o jeitinho brasileiro. Ela dá a dica: "Pode tirar uma foto com o ator depois. Espere a peça terminar, vá até o camarim e peça autorização. Não é tão complicado e não atrapalha ninguém".

Chapéu e penteados altos

As pessoas que sentam atrás não merecem isso, certo? Com a palavra, nossa consultora de imagem: "Chapéus, só em ambientes ao ar livre. Não se usa em local fechado. E as mulheres não precisam de penteados altos, com flores, coques e tudo mais... não precisa tanta formalidade", conclui Cíntia Castaldi. Também não vale ser tão informal. Clarice Miranda lembra que "o que também acontece com certa frequência são pessoas vestindo cores vibrantes nas primeiras fileiras. Elas atraem atenção e podem atrapalhar a concentração dos artistas".

Falar durante as peças

"Algumas pessoas não dão conta do seu barulho interno. Não são capazes de exercer o recolhimento e a assimilação dos sentimentos despertados pela peça. No lugar de lidar com eles em silêncio, precisam transformar em palavras. Elas deveriam escutar e falar só depois da peça, quando já houve um tempo para fazer a assimilação interna", explica o doutor Rubens Weber. Ele conclui: "Parece que a dificuldade em se relacionar com o silêncio, atualmente, está ligada à velocidade com que vivemos. É um aceleramento da sociedade e interno" .

Mexer com os artistas em cena

Sobre isso, o diretor teatral Laercio Ruffa comenta que "quando você expõe um trabalho, está sujeito às interferências do público". "No teatro, da mesma maneira com que o ator fala, o espectador ali ao lado também pode falar o que quiser. Mas aí é uma questão de educação... É preciso bom senso na forma de interagir". Não são todas as montagens que dão abertura para a interação com o público. Mesmo quando a peça acontece na rua. "Voltamos à questão da falta de educação e de informação", lembra Miranda.

Comer ou chutar a cadeira

Weber lembra: "É a mesma história – a não internalização do conteúdo deixa certas pessoas irrequietas..., mas isso aí é desrespeito, né? Um ritual foi quebrado e o respeito vai por água abaixo. A percepção interna tem de ser vista em palavras após o espetáculo, e não de forma física durante a peça". Isso também se aplica a alguns casos de quem gosta de comer no teatro. "Além de ser proibido em alguns lugares, faz barulho, pode deixar um cheiro no ar e ainda gera restos que ficam pelo chão das salas. Balinhas e chicletes não têm problema", lembra Cíntia Castaldi.

Não ir pelo "evento social"

Acontece. Público que não vai ao teatro pela manifestação artística em si, mas quer só "fazer o social". Sobre isso, Clarice Miranda conta que "não pode ser prioritário em nossa vida". "Você vai a um espetáculo para ouvir e conhecer coisas novas. A gratificação está aí, ela é inigualável, única e sua. Sem a vaidade de ser visto e achar que, assim, se torna uma pessoa culta. Esbarra novamente nas palavras ‘conhecimento’ e ‘cultura’." Quem tem ambos, sabe fazer a diferença e se comporta de forma correta. Mas essa é uma questão individual e ultrapassa o senso coletivo.

Aplaudir ou não aplaudir?

E agora? Você nem gostou tanto assim da peça, mas todos presentes se levantam a aplaudem de pé os atores. O que fazer? Calma, não existe uma regra certa para isso. Liana Justus lembra que "você tem que entender que por trás do que foi visto estão anos de estudo, educação, arte e técnica. É uma doação do artista". Portanto, é de bom tom aplaudir sempre. "Pessoalmente, eu nunca deixo de aplaudir em respeito ao artista. Mas não levanto. O importante não é aplaudir, é saber o que está aplaudindo", finaliza Clarice Miranda. Na mosca.

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