
Depois de 12 anos publicando livros infantis e de auto-ajuda, a Editora Leitura decidiu se tornar "A casa do autor brasileiro". Não se trata de retórica publicitária Nissin Yehezkel, o homem por trás da empreitada (e da empresa), está mesmo reunindo um elenco de medalhões. O carro-chefe da editora é o gaúcho radicado no Rio de Janeiro Fausto Wolff, com duas obras reeditadas (O Lobo atrás do Espelho e À Mão Esquerda) e o romance inédito Olympia recém-lançado.
Entre agosto e outubro deste ano, a casa mineira sediada em Belo Horizonte terá um catálogo de 13 autores e 21 livros. Sem mencionar as contratações que estão por vir.
O editor André Seffrin, responsável pela seleção dos títulos e de escritores, conta que a Leitura quer "mapear o Brasil", publicando nomes de várias partes do país. Uma das metas é provar que a máxima segundo a qual "investir em literatura brasileira não dá retorno" está errada.
Para o escritor e colunista da Gazeta do Povo Miguel Sanches Neto, sondado por Yehezkel para tocar o projeto mais tarde assumido por Seffrin , um dos méritos da Leitura é mover um pouco da cena literária para fora do eixo Rio São Paulo. "Um pouco", enfatiza, lembrando da influência exercida pela Itatiaia, talvez a mais conhecida de Minas Gerais. "A Leitura devolve ao estado essa inquietação editorial que existiu décadas atrás."
Organizador do livro Ficção, uma antologia de contos publicados pela revista homônima há mais de três décadas, Sanches Neto vê a possibilidade de existir um mercado que não está sendo explorado como deveria. Nesse contexto, existem bons autores nacionais que talvez não recebam a atenção que merecem. Um exemplo é Wolff ser um dos best sellers da Leitura (que prefere não divulgar números). Com À Mão Esquerda, o clássico de sua bibliografia, ele bateu até títulos de auto-ajuda.
"Bem ou mal, é um bom investimento", comenta Seffrin. "Mesmo quando um escritor não vende muito, (sua publicação) ainda é importante para a memória do país", afirma.
As novidades
O paranaense Domingos Pellegrini acaba de lançar pela Leitura uma edição revista de O Homem Vermelho, além de ter acertado a publicação de trabalhos que estão fora de catálogo há algum tempo: As Sete Pragas (a sair em outubro), Meninos Crescem e Paixões (sem datas definidas).
Ficção, a coletânea organizada por Sanches Neto, conta com nomes importantes como Valêncio Xavier, Rubem Fonseca, Luiz Vilela, João Gilberto Noll e Sérgio SantAnna. O livro surgiu a partir de uma sugestão do escritor Salim Miguel, um dos editores da revista concebida e morta nos anos 70.
O gaúcho Walmir Ayala (1933 1991) é considerado por Lêdo Ivo um "tesouro escondido" da literatura brasileira. À Beira do Corpo, relançado há pouco, é o romance pelo qual deve ser lembrado. A Leitura acaba de publicar, também, um de seus vários trabalhos inéditos, o policial As Ostras Estão Morrendo, abordando a corrupção do poder e a crueldade do sistema penitenciário. No ano que vem, sai Partilha de Sombra e A Nova Terra.
O baiano Antônio Torres, terceiro lugar na categoria romance no Prêmio Jabuti deste ano com Pelo Fundo da Agulha, reuniu suas crônicas e perfis em Sobre Pessoas. O escritor fala sobre figuras importantes do cotidiano do Brasil e do mundo, passando por Glauber Rocha, Garrincha, Monteiro Lobato, Dalton Trevisan, Miles Davis e William Faulkner.
Outra figura de peso do elenco de Yehezkel é o antropólogo mineiro Darcy Ribeiro (1922 1997). Famoso principalmente por sua obra etnográfica, teve dois de seus romances reeditados pela Leitura. O primeiro foi em junho: Utopia Selvagem Saudades da Inocência Perdida (Uma Fábula). Comparado à Macunaíma, de Mario de Andrade, narra como um tenente do Exército, em combate na Guerra de Guiana, é engolido por uma cortina branca e vira prisioneiro de mulheres guerreiras que lutam contra o domínio dos homens (as amazonas).
Na semana passada, saiu O Mulo, definido como a confissão-testamento de um homem condenado à morte por um enfisema pulmonar. É nele que Ribeiro apresenta o capitão Philogônio Castro Maya, o Mulo do título, um dos tipos marcantes da literatura brasileira. Para 2008, estão programados Kadiwéu e Migo.
Também entre as estréias prometidas pela Leitura, está A Mulher Que Fugiu de Sodoma e Território Humano, ambos de José Geraldo Vieira (1897 1977), português que, segundo a lenda, nasceu em um navio a caminho do Brasil.



