
Bons tempos precedem o regente e violinista Cláudio Cruz, novo diretor da fase erudita da Oficina de Música de Curitiba.
Depois de 27 anos na Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp) 22 deles como spalla , o músico comemora o que considera um período raro na vida profissional.
A Orquestra Sinfônica Jovem do Estado de São Paulo, que dirige, está "decolando": vem fazendo apresentações com críticas positivas em países como Alemanha, Holanda e França, e tem uma viagem marcada para os Estados Unidos em março, quando se apresentará no Kennedy Center.
Seu grupo de câmara, o Quarteto Carlos Gomes, que o diretor artístico traz à Oficina de 2015 como "quarteto residente" que se abrirá para a participação de alunos , é considerado um dos melhores do Brasil. "Parece que onde estou colocando as mãos a coisa floresce", diz Cruz, em entrevista para a Gazeta do Povo.
Além de um maior espaço para a prática de música de câmara, que ele considera essencial para a formação dos músicos e avalia como escassa no Brasil, o novo diretor diz ter escolhido para a Oficina músicos de destaque no ensino musical do país, como o violinista Paulo Bosísio que há anos estava afastado do festival curitibano, a também violinista Elisa Fukuda e o renomado violoncelista Antonio Meneses (que toca hoje com a Orquestra Sinfônica do Paraná confira no roteiro desta edição).
Os estrangeiros, escolheu a dedo, dando menor protagonismo às parcerias com instituições de ensino que incluíam a vinda de professores escolhidos por elas. "São instituições reconhecidas e eles são bons; mas é diferente trazer um Antonio Meneses, um Fernando Portari [tenor], um Hagai Shaham [violino], mesmo um Bosísio. Estou trazendo o que há de melhor em cada categoria", explica.
O músico diz ter sido bem recebido pela cena curitibana, à qual também reservou espaços no festival incluindo um núcleo de música contemporânea, que vinha ficando de fora apesar dos esforços de nomes como o jovem compositor Márcio Steuernagel para colocar a capital paranaense no mapa da música nova.
A ideia é expandir, ambiciona Cruz que falou sobre suas ideias para a direção artística.
Confira a seguir trechos da entrevista.
Que mudanças você quer provocar na Oficina?
Não é fácil fazer uma Oficina de Música. Ela já é um festival tradicional. Além disso, custa caro, e a gente sabe que muitas pessoas encaram nossa arte como supérflua. Mas mesmo assim tenho tido apoio grande de todos, da comunidade, da prefeitura, dos patrocinadores.
O que gostaria é de ampliar. Por exemplo, a gente precisa ter uma fase de duas semanas para a música erudita. Estou pensando em ampliação, em atender mais pessoas e em crescer.
Mesmo que demore alguns anos, temos que pensar em trazer mais artistas e influenciar mais a cultura local.
Quais são as principais ideias para fazer isso? Daqui pra frente é uma questão de ousar. Por exemplo, tentar trazer um quarteto que seja melhor que o meu. O Quarteto Carlos Gomes com certeza é um dos melhores que o Brasil já teve. Mas eu queria, quem sabe, trazer um quarteto de fora do Brasil não para apresentar um concerto ou tocar com professores, o que tem acontecido na Oficina, mas para ficar aqui pelo menos por uns cinco dias interagindo com alunos. Acho que o olhar da Oficina tem que ser pedagógico.
A vedete tem que ser o aluno. Eles precisam brilhar, tocar em concertos com os professores.
Você considera duração da Oficina insuficiente?
Na hora que você começa a programar, percebe que dez dias é pouco. Quem sabe agora não vai crescer? Mas isso é apenas um pensamento. Há de se entender: tudo isso é muito caro e julgado por muitos dos nossos políticos como algo supérfluo. Um político certa vez me perguntou "maestro, custa tão caro uma orquestra? Com esse dinheiro eu poderia comprar centenas de cestas básicas". Mas comparar uma orquestra com cesta básica é complexo. Porque o que nos diferencia dos animais é justamente nossa capacidade de realizar e construir coisas belas. Somos capazes de criar um quadro como Monet, um livro como Machado de Assis, música como Villa-Lobos e Mozart, uma obra como Niemeyer. Há pessoas passando fome e precisamos de cestas básicas. Mas a gente também precisa de cultura. Precisa haver um equilíbrio entre essas forças.
A música é importantíssima. É uma maneira de o ser humano mostrar sensibilidade. E sempre digo que é muito difícil uma pessoa passar algum tempo ouvindo um Beethoven, Mozart, Villa-Lobos ou uma música contemporânea árida, mas que traz uma grande reflexão , experimentar esse tipo de emoção, e em seguida sair para a rua e roubar, matar, transgredir a lei.



