
Ao ritmo de uma página por dia ("sou um trabalhador lento"), Paulo César de Souza assumiu a responsabilidade de traduzir as obras completas de Sigmund Freud (1856-1939), homem que concatenou a psicanálise.
Serão 20 volumes, incluindo um de índices e bibliografia, a serem publicados pela Companhia das Letras até 2020. Além de Souza, outros dois tradutores devem participar do processo. Um deles será André Medina Carone e o outro ainda não foi definido. Eles serão responsáveis pelos textos pré-psicanalíticos, compilados nos dois primeiros volumes da coleção. Os trabalhos no campo da neurologia não fazem parte do projeto o próprio Freud os deixou de fora ao elaborar a primeira edição alemã de toda a sua obra.
A Companhia optou por começar a publicação pelos textos que Freud escreveu entre 1911 e 1920, presentes nos volumes 10, 12 e 14 (veja quadro). Se adotasse a ordem numérica da série, editando antes os primeiros volumes, demoraria a chegar nos textos mais importantes. No próximo semestre, saem os volumes 16 e 18, com trabalhos publicados entre 1923 e 1936.
A base para a nova tradução foi Gesammelte Werke (1940-1952), as obras completas em alemão. As duas edições anteriores de Freud no Brasil, da Delta e da Imago, haviam usado os textos em inglês, espanhol e francês. Para se entender por que uma tradução direta é importante, pense numa história contada por uma fonte indireta. Você vai ouvir a informação de alguém que ouviu de alguém que, por sua vez, teve acesso à fonte. A tradução direta encurta o percurso é uma ponte (e não duas) até o original.
"Acredito que o leitor terá uma visão mais nuançada do pensador e do prosador Freud", diz Souza em entrevista por e-mail. O germanista compara a nova tradução a uma fotografia "mais nítida (em vez de uma borrada)".
A obra de Freud caiu em domínio público neste ano e agora é possível publicar seus textos sem pagar direitos autorais. Em meio à atenção que sua obra deve receber daqui para frente, o trabalho dos tradutores vai fazer a diferença.
Duas vezes vencedor do Prêmio Jabuti, Souza responde pelas versões nacionais de vários livros do filósofo Friedrich Nietzsche e do dramaturgo Bertolt Brecht. Em sua tese de doutorado, fez uma análise minuciosa das traduções de Freud em inglês e francês o resultado do estudo, As Palavras de Freud, ganha nova edição agora, também pela Companhia das Letras, acompanhando os primeiros volumes das obras completas.
Na tese, Souza fala também sobre o talento literário de Freud, que chegou a receber o prêmio Goethe, dado a escritores, e comenta um traço marcante do prosador, que consegue estabelecer uma relação de "camaradagem" com o leitor. Ele argumenta que a consideração de Freud pelo leitor era evidente, lidando como poucos com os três níveis do texto, casando as informações que todo mundo sabe com o que ele deve supor que os leitores sabem (para não insultá-los) e o que de fato é desconhecido.
O tradutor brasileiro chegou a fazer sete anos de psicanálise em duas etapas "Não me curou, mas pode ter me ajudado a me tornar escritor-tradutor" , finaliza a tradução do volume 16 e já mandou o 18 para a editora. Além de Freud, começa a destrinchar Zaratustra, de Nietzsche, a sair em 2012 ou 2013.
Serviço:
As Palavras de Freud O Vocabulário Freudiano e Suas Versões, de Paulo César de Souza. Companhia das Letras, 304 págs., R$ 49,50.





