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Música

O afrossamba tem a força

Apoiados no gênero norte-americano, Philippe Baden Powell e Mario Adnet lançam álbum que relê sambas da década de 1960 e traz faixas inéditas de Baden Powell

Philippe Baden Powell (esquerda) e Mario Adnet: parceria entre pianista e violonista começou há nove anos | Nelson Faria/Divulgação
Philippe Baden Powell (esquerda) e Mario Adnet: parceria entre pianista e violonista começou há nove anos (Foto: Nelson Faria/Divulgação)

Em 1963, o samba repicou e voltou no tempo. Com Baden Powell (1937-2000) e Vinícius de Moraes (1913-1980), se reaproximou do lundu, o primeiro ritmo afro-brasileiro. Essa reviravolta chamada afrossamba – que durou até o início dos anos 1980 – acontecia ao mesmo tempo em que a bossa nova se vangloriava como ritmo brasileiro oficial e demonstrava sua importância em composições de Tom Jobim, João Gilberto e do próprio poetinha. Para o jornalista e crítico musical Ruy Castro, "Baden Powell, com os afrossambas, veio trazer para a música brasileira o que ela mais precisava na época: músculo".

Mais de duas décadas depois, o compositor e violonista Mario Adnet e o pianista e arranjador Philippe Baden Powell, filho mais velho e herdeiro musical de Baden, comprovam a riqueza daquela música mista e a exploram ainda mais. Com o disco Afrosambajazz (Biscoito Fino e Natura Musical), o Brasil negro e musculoso encontra seu terreiro musical novamente, enquanto o gênero tipicamente norte-americano confere a ele frescor e elegância.

A história começa com uma parceria, tal como fizeram Vinícius e Baden. "Conheci Philippe no início dos anos 2000. Fizemos o disco Ouro Negro em homenagem a Moacir Santos (1924-2006) e ficamos amigos. Ele era meu vizinho aqui na gávea e me contou de sua vontade de fazer algo de Baden", diz o violonista carioca.

O tempo passou e outros trabalhos em conjunto vieram quando, de Paris, Adnet recebe um telefonema. "Mario, já tenho o nome do disco: Afrosambajazz". Era Philippe, entusiasmado.

"Na verdade é um pouco isso. As coisas são cíclicas. Isso fica no éter, no espaço, de alguma maneira. Quando você entra muito em determinado assunto, estabelece uma conexão muito forte que é capaz até de desvendar alguns enigmas", explica Adnet.

Os mistérios que a dupla enfrentou surgiu quando da escolha do repertório. São 14 faixas. Alguns afrossambas já conhecidos ganharam ótimas releituras, com ênfase no trombone, clarinete, e saxofones. É o caso de "Berimbau" e "Canto de Ossanha" – ambas de Baden Powell e Vinícius de Moraes. Outras, como "Alodê", são músicas raras e foram executadas poucas vezes. Mas o segredo vem mesmo com as inéditas "Caxangá de Oxalá", "Lamento de Preto Velho" e "Nhem Nhem Nhem".

"O Philippe achou essas partituras em suas coisas lá na França. Elas tinham uma indicação melódica e harmônica, mas foi um verdadeiro trabalho de arqueologia que fizemos ao tocá-las e gravá-las", conta Adnet, que conviveu com Baden Powell por apenas um ano. "Ele morreu em 26 de setembro, dia do meu aniversário", relembra.

Mas Powell já havia se arriscado em outros gêneros. O discípulo de Moacir Santos começou com o violão, mas na década de 1950 já empunhava uma guitarra semi-acústica. "Tem foto dele segurando uma guitarra em 1959. Ele conhecia o jazz e chegou a gravar muitos standards", conta o violonista.

O trabalho – não haveria outra maneira – é dedicado a Moacir Santos. Não só pela admiração dos músicos pelo compositor pernambucano, mas pela história semelhante que os envolve.

"Baden foi o primeiro cara que ouviu e gravou músicas do Moacir. Powell falava que ele fazia uma música superior", diz Adnet.

Conta-se que Santos, quando chegou ao Rio de Janeiro, estudava com cinco professores diferentes. Era um a cada dia da semana – incluindo aí o mestre Cláudio Santoro (1919 – 1989). "Ele queria ver o ponto de vista de cada um sobre a mesma matéria", explica o músico.

Anos depois, Moacir Santos tornou-se maestro da Rádio Nacional, no Rio de Janeiro. Seu aluno Baden frequentava a casa de Vinícius. E tinha aí o início de toda a história, viva e novamente atual em Afrosambajazz. GGGG

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