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Cinema

O comovente Up faz Cannes flutuar em 3D

Animação em 3D produzida pela Disney/Pixar abre o festival com leveza, humor e lirismo

O desenho animado Up discute velhice, solidão e o desejo de realizar sonhos antes de morrer | Divulgação
O desenho animado Up discute velhice, solidão e o desejo de realizar sonhos antes de morrer (Foto: Divulgação)

Cannes - Começou leve como balões de gás o Festival de Cannes, ontem, na Riviera Francesa. A apresentação, fora de competição, de Up, produzido pela Disney/Pixar, foi um início agradável para a 62ª edição, bem diferente do ano passado, quando o evento foi inaugurado com o difícil Ensaio sobre a Cegueira, de Fernando Meirelles. O fato de ser uma animação em 3D, a aposta da indústria para continuar levando milhares aos cinemas apesar dos DVDs e dos downloads, mostra como o festival consegue equilibrar os títulos esperados pelos amantes do cinema autoral com produções que apontam para o futuro do cinema, inclusive tecnicamente.

Foi a primeira vez em sua história que Cannes abriu com um filme em 3D. Num momento divertido, o diretor artístico Thierry Fremaux subiu ao palco e pediu para todos os jornalistas colocarem seus óculos para os fotógrafos. Ele mesmo sacou sua pequena digital do bolso para fazer imagens. A coletiva de imprensa que se seguiu à apresentação para os jornalistas contou com a presença do diretor criativo da Disney/Pixar, John Lasseter, do diretor Pete Docter, do codiretor Bob Peterson e do produtor Jonas Rivera. Lasseter disse que estava muito feliz de abrir o mais importante festival de cinema do mundo. "É um dos melhores momentos de nossas carreiras. Mas o mais legal mesmo vai ser ver todas aquelas pessoas de vestidos longos e smokings, com seus óculos 3D", afirmou, referindo-se à sessão de gala que aconteceria na noite de ontem.

Na trama de Up, Carl Fredricksen, um senhor de 78 anos, resolve partir para a aventura com que sonhou desde menino: ir à América do Sul e visitar a Cachoeira do Paraíso, imensa queda d’água no meio da floresta. Foi para lá que seu ídolo de infância, Charles Muntz, viajou desacreditado, décadas atrás, prometendo voltar apenas com a prova da existência de um raro e colorido pássaro. Esse fascínio pelo explorador também motivou o encontro do pequeno Carl com a espevitada Ellie. Mais tarde, eles se casaram, viveram felizes juntos, mas adiaram por vários motivos a tão sonhada viagem – tudo mostrado numa sequência daquelas que a Disney/Pixar sabe fazer tão bem, emocionando com a dor e as delícias de uma vida comum, sem usar diálogos, só com imagens.

Quando a esposa morre e o agora rabugento Carl se vê em sua casa cheia de passado, cercada de edifícios, ele decide finalmente partir para sua aventura, mas de um jeito incomum: prendendo a própria casa a milhares de balões de gás coloridos. Sem querer, acaba levando junto o pequeno escoteiro Russell, um otimista incorrigível.

"O importante para nós é que a trama tenha coração", afirmou Lasseter. "E é uma das coisas mais difíceis. Como Walt Disney dizia, para cada risada deve haver uma lágrima. Eu sei que conseguimos ser engraçados e fazer filmes bonitos. Mas é o coração que conta. Este filme tem isso", disse ele, admitindo também que todo filme da Pixar tem grande influência do realizador japonês Hayao Miyazaki.

Realmente, a Pixar – agora definitivamente atrelada à Disney e grande responsável pelo renascimento da animação – prova que sabe aliar excelência técnica com emoção para agradar a crianças e adultos. E isso sem evitar temas difíceis. Para compor o rosto do protagonista, fechado em seu mundinho, pensaram em formas simples, quadradas, o que, na verdade, acabou representando um grande desafio, segundo declararam. Inspiraram-se em atores como Spencer Tracy, Walter Matthau e James Whitmore. Foram à América do Sul, Brasil inclusive, para pesquisar as paisagens que aparecem no filme. Mas, além de todos os cuidados técnicos, não falta, é claro, o humor, principalmente nas sequências com os muitos cachorros falantes que ameaçam um novo amigo de Carl e Russell.

Apesar do sucesso evidente das produções da companhia, Lasseter disse que durante o processo o longa-metragem muda muito. "Em algum momento do desenvolvimento, todo filme da produtora foi o pior filme jamais feito. Mas nós sempre acreditamos na ideia, acreditamos em nós mesmos, acreditamos no processo. E eu nunca darei luz verde a um projeto a não ser que a história e os storyboards forem fantásticos. Pararemos a produção se for preciso para conseguir fazer certo", afirmou.

O diretor Pete Docter disse que, como toda nova tecnologia, o 3D foi visto como um brinquedo novo no começo. "Mas a gente se divertiu com ele e enfim começou a entender como usá-lo para as emoções dos personagens", afirmou. Lasseter deixou bem claro que a companhia não está interessada apenas naqueles truques em terceira dimensão. "Queríamos que a tecnologia ajudasse a contar a história, que colocasse o público dentro da história", declarou. Ele se disse animado com as possibilidades do 3D:

"Nós fizemos um filme em terceira dimensão lá atrás, Knick Knack, mas não havia cinema para exibi-lo. Pete (Docter) mesmo sempre disse que fazíamos filmes em 3D, porque é assim que os vemos no computador, o problema é que eles eram exibidos em 2D. Agora finalmente todos vão ver como eles foram pensados e são vistos por nós no computador". Apesar disso, Lasseter acredita numa volta da animação tradicional. "As pessoas disseram que a animação tradicional tinha morrido, mas na verdade as pessoas não queriam era assistir a filmes ruins." No final do ano, a Disney lança The Princess and the Frog. "É um musical, em certo sentido um desenho clássico da Disney, mas apresentado de um jeito novo. Não vemos algo assim em muito tempo", disse. E terminou defendendo apaixonadamente a animação. "Meu sócio na Pixar, Steve Jobs, disse para mim: os computadores que faço na Apple têm vida útil de três a cinco anos. A animação, se você fizer bem feita, pode durar para sempre."

Júri

Na coletiva do júri, a presidente Isabelle Huppert disse que não vai estabelecer diretrizes. "Os filmes são um conjunto do que eles dizem sobre o ser humano e estética", afirmou ela. Não haverá espaço para diplomacia. "Não somos o Ministério das Relações Exteriores", disse.

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