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A comédia brasileira de apelo popular, marcada pela crítica de costumes e pelos números musicais, e capaz de fazer rir o homem e a mulher do povo, ao identificarem no palco a fala das ruas e os acontecimentos cotidianos que movem os personagens, é herança da pena do dramaturgo Arthur Azevedo (1855-1908).

Seu legado deu continuidade ao de Martins Pena (1815-1849) e alimentou produções originais dos autores brasileiros que o sucederiam ao longo de um século, transcorrido desde a sua morte. É visto ainda hoje nos palcos nacionais, que nunca mais abandonaram a inclinação para a comédia.

"A maior prova de que a obra de Arthur Azevedo não se prende apenas ao seu tempo histórico está numa série de montagens de seus textos que continuam sendo feitas com grande sucesso por vários grupos. Poderia citar a montagem pernambucana de As Viúvas de Arthur, ou mesmo a minha montagem da Comédia em 3x4", opina Duilio Pereira da Cunha, coordenador de Teatro da Universidade Regional do Cariri (URCA), na Paraíba.

A Capital Federal (1897), uma de suas peças mais aplaudidas, tratou com humor ingênuo e, ao mesmo tempo, irônico a dinâmica da antiga capital do país, o Rio de Janeiro, retratando os costumes nacionais, a corrupção generalizada e os problemas urbanos, em um texto leve e encabeçado por personagens populares. Entre eles, apareciam a mulata, o jogador, a prostituta e uma família de migrantes vinda de Minas Gerais, mostrada em seu estranhamento diante da cidade grande, que, provisoriamente, desencaminha alguns de seus integrantes, apanhados pelo "micróbio da pândega".

"Infelizmente, os problemas brasileiros não mudaram, só pioraram. Arthur Azevedo falava de fatos cotidianos em suas revistas, como doenças que assolavam a cidade, o descaso das autoridades com as enchentes etc.", observa o diretor João Fonseca, que esteve à frente da peça O Carioca, apresentada no Festival de Teatro de Curitiba em 2004, unindo no mesmo espetáculo A Capital Federal a O Tribofe (revista teatral fluminense de 1891), intercaladas por esquetes de fatos atuais. Mais recentemente, em agosto deste ano, A Capital Federal esteve em cartaz novamente em Curitiba, em outra montagem, com adaptação e direção de Wellington, no Teatro Lala Schneider.

A Pele do Lobo (1889) é o exemplo da atualidade do dramaturgo maranhense citado pelo professor doutor Diógenes André Viera Maciel, da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). "Afinal, como não considerar atual a maneira como as repartições públicas funcionam no Brasil, em que o interesse de quem atende parece ser mais importante do que aquele que solicita o serviço? Ou, ainda, como não perceber no subdelegado Cardoso aquela velha mania de querer subir na vida passando por cima de uma identidade de classe? Cardoso representa bem certa parcela de nossa população que, por usar água de colônia, já esqueceu o cheiro da rua", diz.

Ao ideário classicista ainda vigente no fim do século 19, valorizando os dramas em detrimento do humor, Arthur Azevedo opôs suas comédias curtas, de ato único; revistas de ano (nas quais fazia a revisão dos fatos do ano anterior); e operetas. Traduziu para o gosto nacional as influências recebidas da França, mantendo a qualidade literária em seus versos.

"Enquanto a crítica mais sisuda repudiava os níveis mais baixos do corpo e a desclassificação social da ação dramática, ele nos ensinava muita coisa boa sobre o Brasil, aos risos, como a gente gosta", sintetiza Maciel. Pode não ter agradado tais criticos, mas conquistou sucesso de público.

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