
Foi em Curitiba que um "show secreto" marcou, em 2010, a volta oficial da terceira menor big band do mundo à ativa Os Mulheres Negras. A alcunha se aplica, na verdade, a um duo, o que já dá a entender o espírito irônico e bem-humorado do projeto criado por André Abujamra e Mauricio Pereira em 1985, que acabou em 1991 e há dois anos voltou a apresentar shows performáticos como promete ser o deste domingo, às 19 horas, no Teatro do Sesi-Cietep.
A dupla paulista sobe ao palco na formação tradicional, com saxofone, sampler, guitarra, percussões e indumentária original os chapéus-coco de palha e sobretudos que já eram o uniforme da banda nos anos 1980. No repertório, músicas como "Sub", "Eu Vi", "Martim", "John" e "Purquá Mecê", algumas das mais conhecidas dos dois cultuados álbuns da banda, que misturou música eletrônica a funk, lambada, música africana, baião, punk e bossa nova, em um experimento pop que a destacou na cena alternativa da época.
Por isso, há quem inadvertidamente associe o grupo à vanguarda mais especificamente à Vanguarda Paulista. Mas Mauricio Pereira esclarece: Os Mulheres Negras tem mais a ver com Lady Gaga do que com Luiz Tatit e Itamar Assumpção. "É de um outro planeta, mas não é exatamente vanguarda. Não está à frente nem atrás de nada. Está sozinha", diz Pereira, em entrevista por telefone para a Gazeta do Povo. "Embora a gente quebre a canção, não há uma proposição intelectual, é o ímpeto da gente."
As invenções dOs Mulheres Negras, portanto, estão na expansão dos limites do espetáculo. Pereira e Abujamra, além da teatralidade, do talento para composições ligadas à cena, da aptidão para o humor e o improviso e da inteligência no uso da tecnologia barata, desenvolveram ideias marqueteiras como o jornalzinho A 20.908, número da caixa postal que usavam para criar uma rede de correspondência com o público (hoje, é a conta @20908 no Twitter). "Fomos os primeiros a trabalhar com roteiro, iluminação de teatro, trucagens, cuspidor de fogo. Cheguei a tocar saxofone pendurado em um cabo de aço", conta Pereira. "Hoje, continua tendo a teatralidade, mas é mais natural, a gente consegue fazer isso com menos esforço intelectual."
O duo trabalha em músicas novas, mas, de acordo com Pereira, o momento é de entrar em contato com o repertório antigo, que acaba soando como novidade depois de tanto tempo embora o uso dos recursos tecnológicos, hoje, tenha um significado completamente diferente. "Nos anos 1980 a gente tinha de fazer um monte de gambiarra pra soar. Hoje, o que a gente tem de driblar são as facilidades", diz.
As experiências individuais estão somando ao novo Os Mulheres Negras, que está soando mais "sujo", de acordo com Pereira. Mas a "big band" tem vida própria. "A gente se reencontrou com a gente mesmo 20 anos depois", diz Pereira. "Quem nos conhece das antigas vai curtir. Tem um espírito que está mantido, e que tem de ser mantido. Espírito é espirito, não tem época."



