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Editor Bob Silvers, sentado, tem fama de não se deixar intimidar por nada nem ninguém | Divulgação
Editor Bob Silvers, sentado, tem fama de não se deixar intimidar por nada nem ninguém| Foto: Divulgação

Editor defende que certos temas são irresistíveis

No passado, jornalistas gostavam de dizer que existem duas coisas que as pessoas jamais consumiriam se soubessem como são feitas: salsicha e jornal. Mas não há nada de escabroso nos bastidores da Review (o documentário deve ter deixado uns podres de fora), mas é difícil não terminar a sessão simpatizando com o senhor de 84 anos – o editor Robert Silvers – que diz ser "impossível resistir aos impulsos" que tem de encomendar textos sobre determinados assuntos.

O começo da NYRB está ligada a uma greve dos gráficos dos principais jornais de Nova York em 1963, que durou quase quatro meses. No período, o editor Jason Epstein pensou em criar um espaço para resenhas como uma forma de aplacar a ansiedade das editoras que não pararam de lançar livros — e não tinham onde anunciar as novidades — e ganhar um dinheiro com o mercado editorial.

A ideia veio durante um jantar em que ele e a mulher, Barbara, receberam os vizinhos poetas Robert Lowell e Elizabeth Hardwick. Ela havia acabado de escrever um texto para a revista Vogue, a pedido de Bob Silvers, analisando a pobreza dos cadernos literários, cheios de resenhas medíocres.

A crítica de Hardwick, mais a disposição de Epstein, levou à criação da Review. Os editores seriam dois: Silvers e Barbara. Ela morreu em 2007 e, desde então, Silvers edita sozinho.

Na internet

A versão impressa da Review sai quinzenalmente e não é fácil encontrá-la, mas a página dela na internet, toda em inglês, tem vários textos com acesso liberado mesmo para quem não é assinante: www.nybooks.com.

Na Gazeta

A partir do mês que vem, a Gazeta do Povo passa a publicar textos da Review nas páginas do Caderno G Ideias, que sai aos sábados, dividindo espaço com reportagens de fôlego produzidas pela redação do jornal.

Uma sequência de acasos felizes deu origem à revista The New York Review of Books em 1963, ou "The Review", como diz Bob Silvers, editor da coisa toda. No ano passado, a revista que resenha livros e fala sobre temas atuais tão díspares quanto espionagem e Primavera Árabe (às vezes usando livros como desculpa) completou 50 anos e uma festa foi preparada para marcar a data, com um documentário coproduzido pela HBO para registrar o evento.

Não bastasse a marca do canal a cabo para chamar atenção para o filme, ele tem direção de Martin Scorsese, o senhor de 72 anos que fez O Lobo de Wall Street (2013). The 50 Year Argument foi ao ar no mês passado na HBO americana e também na BBC, do Reino Unido, mas ainda não tem data prevista para estrear na tevê a cabo brasileira.

A produção passou neste ano pelo Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro e ganhou sessões em São Paulo e no Rio para o lançamento da edição número 18 da revista serrote, publicada pelo Instituto Moreira Salles (a revista quadrimestral, com o nome grafado sempre em caixa baixa, dedica-se a ensaios e costuma trazer textos da NYRB em português). No mês que vem, a Gazeta do Povo passa a publicar textos da Review, nas páginas do Caderno G Ideias.

Um dos achados de The 50 Year Argument é ver o editor Robert Silvers sentado à mesa forrada de livros, com a tevê ligada no noticiário, tarde da noite, lendo e revisando textos. Quando explica qual é a lógica que usa para escolher os assuntos que serão tema do NYRB, ele é absolutamente singelo e sincero: responde que nunca procurou adivinhar o que o público gostaria de ler. Corajoso e coerente, ele se preocupou em escrever sobre o que o interessava, confiando no filtro que os colaboradores forneciam — figuras interessantes e interessadas no que quer que seja.

Sem se preocupar em entrar na cabeça do leitor, ele guardou espaço no papel e energia na equipe para falar sobre temas que faziam a cabeça de quem escrevia para a revista. Aí está a coragem. A coerência aparece no fato de tratar daquilo que considera importante, tendo muito mais condições de argumentar sobre as escolhas que fez e faz (e não apenas dar espaço para algo por achar que "é isso que o leitor quer ler").

Em termos políticos, é difícil posicionar a Review. O impulso inicial é o de colocá-la à esquerda por não se deixar intimidar por governos e por publicar textos de gente como o historiador Tony Judt, a escritora Susan Sontag e o linguista Noam Chomsky.

Depois do 11 de Setembro, quando George W. Bush abraçou a retórica do "quem não está comigo está contra mim", por exemplo, chamando de antipatriótico qualquer tentativa de discutir alguns absurdos que Washington perpetrava, Silvers conseguiu manter a perspectiva e não apoiou a invasão do Iraque (e ficou isolado em meio à grande imprensa dos EUA). Mais recentemente, a Review foi um dos poucos veículos do mundo a relativizar a ação dos militares egípcios contra os manifestantes da Primavera Árabe, mostrando que havia pessoas armadas e violentas também no meio dos protestos (algo que ficou claro tempo depois).

Episódios

Algumas histórias e personagens que marcaram o passado da Review.

Discussão

Numa festa dada para marcar o aniversário da revista, o dono dela, Rea Hederman, conta a história de um jantar em que a poetisa Elizabeth Hardwick argumentava de modo entusiasmado sobre um tema qualquer. Quando ela terminou de falar, o editor Robert Silvers disse: "Eu discordo inteiramente de você". Foi então que Hederman entendeu que a NYRB era uma discussão que já dura 50 anos. Daí o documentário se chamar The 50 Year Argument.

Crucial

O escritor irlndês Colm Tóibin dá um depoimento no documentário falando sobre como cultuava a revista. "Pode parecer estranho, mas a New York Review of Books, na Irlanda, era importante [nos anos 1960]", diz Tóibin. "Um grupo de pessoas – hesito em usar a palavra ‘intelectuais’ –, mas um grupo de pessoas que se importavam com ideias e com livros se reuniam para conversar a respeito da revista como uma parte crucial de nossas vidas."

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