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Poesia

Poesia repleta de morte vida

Editora Versus lança Ariel em edição originalmente organizada por Sylvia Plath

Aparelhos de GPS estão com o preço em queda e se popularizando | Reprodução/Globo Online
Aparelhos de GPS estão com o preço em queda e se popularizando (Foto: Reprodução/Globo Online)

Quando cometeu suicídio, aos 30 anos, em uma manhã gelada do mês de fevereiro de 1963, em Londres, a poeta norte-americana Sylvia Plath não deixou apenas os dois filhos pequenos, Frieda e Nicholas (na época com dois e um ano, respectivamente) protegidos do gás que, aos poucos, se espalhou pelo pequeno sobrado onde morava. Em cima da escrivaninha sobre a qual trabalhava, dentro de uma pasta preta, estavam, devidamente organizados e prontos para publicação, os 40 poemas que viriam compor a obra mais importante de sua breve vida, Ariel.

Recém-separada do poeta britânico Ted Hughes (1930 – 1998), que na época mantinha um caso com uma conhecida do casal, Assia Wevill (1927 – 1969), Sylvia viveu momentos difíceis em seu último ano de vida. Lutando contra a depressão, doença da qual sofria desde adolescente, a escritora conseguiu canalizar a dor causada pela traição do marido e por suas inconstantes emoções em poemas fortes e furiosos, que escreveu em ritmo febril (só em outubro de 1962, foram 25) enquanto os filhos dormiam, entre 4 e 8 horas da manhã.

Consciente de que após um esforço árduo ela finalmente havia atingido a plenitude de sua voz poética, que já havia aparecido timidamente em poemas escritos entre o final de 1961 e o início de 1962, Sylvia tinha certeza de que o manuscrito deixado na escrivaninha continha "os melhores poemas" de sua vida; aqueles que iriam fazer seu nome, como ela teria dito certa vez.

Organizados numa cuidadosa seqüência, que denotava sinais de um recomeço após o exorcismo das agonias sofridas com o término do casamento de Sylvia, Ariel foi encontrado no dia de sua morte por Ted Hughes, que ainda não conhecia o teor da mais recente produção da ex-mulher.

Em meio ao estardalhaço causado pela mídia diante do suicídio, das rápidas decisões que teriam de ser tomadas em relação aos destinos de Frieda e Nicholas e da gravidez da amante, Ted Hughes tinha ainda em mãos a responsabilidade de administrar e tornar público o legado de Sylvia, publicando Ariel da melhor maneira possível.

Ao ler o manuscrito e perceber a "natureza extrema" de seu conteúdo, Hughes julgou que a publicação da coletânea de poemas na íntegra, como Sylvia os havia deixado, poderia causar a rejeição de leitores e editoras e optou por modificar sua organização original, excluindo 13 poemas que considerou "pessoalmente agressivos" e incluindo outros 13, parte deles escrito nas semanas anteriores ao suicídio, quando Ariel já havia sido finalizado.

Publicado pela primeira vez em 1965, a primeira edição de Ariel vendeu 15 mil cópias em apenas um ano e de fato colocou o nome Sylvia Plath em definitivo na galeria de ícones da poesia mundial. Porém, a seqüência de poemas escolhida por Hughes dava ao livro um fio narrativo que enfatizava a tendência suicida da poeta, o que não acontece com a edição original, publicada nos EUA e na Europa em 2004, a partir de uma iniciativa de Frieda Hughes, filha de Sylvia e Ted, também poeta.

Tal edição, restaurada e com a presença de fac-símile dos manuscritos originais datilografados, acaba de chegar às prateleiras nacionais, por iniciativa da editora Versus, em edição bilíngüe, com transcrição para o português feita por Rodrigo Garcia Lopes e Maria Cristina Lenz de Macedo.

Com a presença dos 13 poemas eliminados por Ted Hughes, a nova edição traz ainda um comovente prefácio de Frieda, que revela como cresceu ao lado do atormentado pai e editor da obra de Sylvia Plath, alvo das mais terríveis críticas, motivadas pela "mutilação" da obra da poeta; e por ter "provocado" a morte de Sylvia e Assia – sete anos após o suicídio da ex-mulher de Hughes, a amante Assia Wevill se matou da mesma maneira, inalando gás de cozinha, com uma diferença: levou consigo a filha, Shura, de apenas 4 anos.

"Meu pai tinha profundo respeito pela obra de minha mãe, apesar de ter sido um dos alvos da fúria dela. A obra era tudo para ele, que via o cuidado com ela como uma forma de homenagem e uma responsabilidade. Mas o nível de angústia atingido por minha mãe quando se matou foi assumido por estranhos, possuído e reformulado por eles. A coleção de poemas de Ariel tornou-se, para mim, símbolo dessa posse de minha mãe e da mais vasta calúnia sobre meu pai", desabafa.

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