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Visuais

Profundamente humano

O artista plástico Jair Mendes abre mostra retrospectiva de 50 anos de carreira no Museu Guido Viaro

Figuras bíblicas ou profanas mas, sobretudo, pessoas são temas das pinturas e desenhos do artista Jair Mendes – mesmo nos trabalhos recentes, em que realiza uma quase abstração | Daniel Derevecki/Gazeta do Povo
Figuras bíblicas ou profanas mas, sobretudo, pessoas são temas das pinturas e desenhos do artista Jair Mendes – mesmo nos trabalhos recentes, em que realiza uma quase abstração (Foto: Daniel Derevecki/Gazeta do Povo)

Não poderia haver lugar mais significativo para Jair Mendes realizar sua mostra retrospectiva de 50 anos de trajetória artística do que o Museu Guido Viaro (1897-1971). Afinal, como muitos outros artistas de sua geração, ele foi aluno do artista ítalo-brasileiro e, em 1975, tornaria-se diretor por 15 anos do antigo espaço dedicado a seu acervo, no Largo da Ordem.

Quem vai à Pequena Retrospectiva pode, por curiosidade, visitar primeiro o acervo de Viaro, no primeiro andar, e então verificar se as 36 telas e os 200 desenhos selecionados por Mendes para compor a mostra, juntamente com a curadora Rosemeire Odahara Graça, refletem a herança do mestre e amigo. "Ele sempre nos dizia: renegue seu mestre! Mas é inegável, sempre fica uma coisinha e outra", diz o artista.

Enxuta, a retrospectiva permite ao visitante lançar um olhar atento sobre os principais momentos da longa caminhada artística de Mendes. "Na verdade, 51", ressalta o artista de 72 anos que, em 1959, realizou sua primeira exposição individual na Biblioteca Pública do Paraná. Com direito à texto de apresentação do professor Viaro, que, entre outras frases espirituosas, escreveu: "Conheço o Jair da escola; turbulento e persuasivo, diligente e gazeador, mas sempre entre os primeiros, dinamicamente rápido. Resumido e nem sempre correto no desenho...".

É daquele ano a pintura mais antiga desta retrospectiva, "Fá­­brica de Fita", uma paisagem que Mendes pintou de sua janela, na Rua Ubaldino do Amaral, em que retrata o prédio que hoje é o Instituto Goethe. Curitiba é, aliás, onipresente nas obras deste paulista de São José do Rio Pardo, que chegou aqui com a família, em 1950. "É aqui que amo, que vivo, que respiro, que criei minha família. Meu interesse é universal, mas meu mundo mais íntimo está em Curitiba", diz.

Mas as figuras humanas são, desde os anos 60, o elemento central de sua obra. "Até aquele mo­­mento, não tínhamos comunicação com o mundo e, quando passaram a chegar informações sobre o que se produzia lá fora, começamos a sentir uma coceira", referindo-se aos jovens artistas curitibanos que formariam a chamada Geração 60.

Com a ditadura, as telas de Mendes ganharam tom contestatório, que lhe trouxe problemas (a ideia era justamente essa). Em 1972, exibiu uma via sacra em que Pôncio Pilatos era retratado como um coronel e Jesus como um camponês assassinado por um pelotão de fuzilamento. "No dia seguinte à abertura, todas as minhas obras tinham sumido", conta.

De uns anos para cá, o artista vive o que chama de momento de liberação. "Tirei um pouco os pés do chão e passei a pintar de um modo mais emocional, espiritual", diz, referindo-se às telas em que o desenho, que sempre foi a base de sua pintura, dá lugar a uma quase abstração. "Minha abstração não eliminou totalmente a figura. Minhas figuras estão ali, querendo sair. Digo que são meus fantasmas", conta.

Em todas as fases, no entanto, seus quadros – feitos com tinta a óleo, com o tubo manuseado diretamente sobre a tela em uma pintura "que vai acontecendo" – são muito coloridos. "Sempre fui um pintor da cor. Não tenho medo de usá-la, acredito que todas as cores podem conviver em harmonia, depende de saber colocá-las", diz Mendes.

Ao lado das telas mais recentes, estão mais de 200 desenhos em quatro álbuns que podem ser folheados pelo público. Um deles, nomeado pela curadora de "Zoo­­mitologia", abriga aqueles de temática erótica e mitológica, entre eles, alguns em que mulheres nuas aparecem ao lado de animais – uma destas personagens foi tema da exposição Carmela e o Lobisomem, de 1985, que Mendes realizou em Portugal e Espanha.

Serviço

Pequena Retrospectiva – pinturas e desenhos de Jair Mendes. Museu Guido Viaro (R. XV de Novembro, 1.348), (41) 3018-6194. Terça a sábado das 14h às 18h. Entrada franca. Até 4 de julho.

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