
Quando adolescente, Mariana Aydar ia aos shows de seu pai, que tocava violoncelo na banda Premeditando o Breque (Premê). Encantava-se. Dos bastidores aos palcos foi um estalo. Nas primeiras vezes, tremia de ansiedade: sabia que seria chamada para dar uma "canja" no fim dos shows. O nervosismo passou, a carreira teve início e Peixes Pássaros Pessoas (Universal Music), seu segundo disco, chega às lojas recheado de estilo e voz autoral e dá ainda mais originalidade à chamada nova MPB.
Filha do músico Mário Manga e da produtora Bia Aydar (Lulu Santos e Luiz Gonzaga), a paulistana que está prestes a chegar aos 30 anos não fugiu de seu destino. Deixou as participações especiais com o pai para dar vez a sua voz. Estudou violoncelo "não é para mim", diz e seis anos na Berklee School of Music, em Boston. Foi mais longe: morou em Paris de 2004 a 2005. Fez parceria com Seu Jorge em terras francesas. Cantou e não parou mais. Dois anos depois lançava Kavita 1, o disco de estreia, fruto de suas diversas expedições musicais.
"Meu pai colocava de tudo para eu ouvir. De Beatles a Bach. Ouvi muto Bobby McFerrin também. E Elis, que descobri tarde e por minha conta. Também ouvia Gal, Dominguinhos, Luiz Gonzaga..."
As reticências continuam, como seu aprendizado. "Acho que música não se aprende na faculdade. Eu aprendi na vida. Na verdade, estou aprendendo ainda", confessa a cantora.
Se o disco de estreia era um rebento afirmativo,Peixes Pássaros e Pessoas confirma o talento da paulistana ao mesmo tempo em que o modela. A receita foi quase a mesma. Músicas principalmente de Duani parceiro antigo e Kavita, além de contribuições de Carlos Rennó, Pedro Luis, Roberta Sá e Rodrigo Campos, nas composições; e de Zeca Pagodinho e da cantora cabo-verdeana Mayra Andrade; nos vocais.
"O disco novo é um amadurecimento. Aprendi responsabilidades que eu não tinha. Cantei para um público diferente. Esse é o aprendizado que a música me dá", diz Mariana.
O disco passou por sete meses de gestação. Por muitas vezes, a cantora e sua banda entravam no estúdio às 15 horas e saiam às 9 horas do dia seguinte. Nada que abalasse os ânimos. "Era gostoso, tinha um clima caseiro e divertido. Isso foi importante para o disco", resume.
Ao ser questionada sobre o gênero predominante no novo trabalho, a resposta chega antes do término da pergunta.
"Não, não é de samba. Não queria gravar disco de samba porque senão fico rotulada como uma cantora desse estilo, o que eu não sou.", explica. Isso não quer dizer que o estilo não faça parte de suas influências e que não haja batuques e repiques em Peixes Pássaros Pessoas. Pelo contrário. "Samba é coisa que eu amo. É coisa do coração e não da cabeça, e, para mim, o coração sempre prevalece", diz, em saudável contradição.
Com letras simples, diretas e mundanas, o novo trabalho pode ser pensado como um reflexo da velocidade na vida nas metrópoles uma das características da nova MPB , mas é definido pela cantora como uma expressão particular de algo que a incomoda. "Algo com que me preocupo muito e que está direto na minha cabeça é a questão do ser humano vivendo enclausurado pelo próprio ser humano, pela moral, pela igreja e pela política. Eu queria falar isso de uma forma mais simples do que essa que acabei de utilizar com você", define Mariana, que impôs de forma natural suas ideias musicais. "Estive muito perto de todos os músicos, consegui falar o que e como queria", explica.
Calor
Se Kavita 1 apresentou uma Mariana talentosa, embora tímida, Peixes Pássaros Pessoas atingiu as metas da cantora. "Queria um disco quente. Que tivesse graves, que tivesse um punch gostoso, que trouxesse um som mais macio. O Kassim [produtor, também de Los Hermanos e Adriana Calcanhoto] foi mestre e conseguiu."
Parte dessa quentura é o toque de samba escancarado na voz de Zeca Pagodinho na autoexplicativa "O Samba Me Persegue". Mariana é fã do carioca, "como qualquer brasileiro", e convidou o ídolo, que aceitou sem pestanejar.
A outra voz, que faz dueto com Mariana em "Beleza", é de Mayra Andrade. "A participação dela é especialíssima. Considero uma das melhores cantoras que já vi na vida", confessa. As duas se conheceram na estada de Mariana em Paris. Trocaram e-mails, viraram amigas.
"Queria coroar isso", diz.
Mariana Aydar sai em turnê pela Europa no mês que vem. Toca na França, Inglaterra e Portugal. Retorna para shows no Brasil em junho. Agora sem receio de ser chamada aos palcos, seja onde for.



