
O Festival de Teatro deste ano terá fortes marcas curitibanas em sua mostra oficial. A grade completa, divulgada ontem, inclui dois diretores locais entre as oito estreias nacionais, participações especiais de um ator e de bailarinos daqui e um espetáculo com a Ópera de Arame como cenário.
Serão 29 peças (apenas a inglesa 1984 ainda é incerta). O espetáculo de abertura repete a fórmula do ano passado e será apresentado no bebedouro do Largo da Ordem, dia 28 de março, com entrada franca. Integrantes do corpo de baile G2 do Guaíra serão escalados para participar da obra espanhola Los Pájaros Muertos, de Marcos Morau, que tem ainda 20 músicos em cena e faz uma homenagem ao pintor Pablo Picasso.
Além disso, o diretor carioca Gerald Thomas, que criou em Londres a companhia Dry Opera, traz Gargólios, com cinco atores ingleses e um a ser selecionado entre a classe local os detalhes dessa audição não foram divulgados.
Entre as estreias nacionais, o diretor e cineasta curitibano Murilo Hauser faz Ah, a Humanidade!, e Outras Exclamações; e Marcio Abreu dirige os atores Guilhereme Piva e Christiana Kalache em De Verdade, de Sandór Marai.
Como acontece todos os anos, é provável que as peças com nomes conhecidos tenham os ingressos esgotados mais cedo. Mas o público deve ficar atento à sinopse dos espetáculos. Palácio do Fim, com direção de José Wilker e Vera Holtz e Camila Morgado no elenco, é um drama sobre a guerra no Iraque o título alude ao nome da prisão onde Saddam Hussein ordenava torturas. Já O Libertino, com direção de Jô Soares e Luiza Lemmertz na atuação, promete ser uma comédia sobre a Enciclopédia de Diderot.
As outras montagens que estreiam no festival são A Peça do Casamento; Licht + Licht; Eclipse; Escravas do Amor; O Casamento e Caravana Memórias de um Picadeiro.
Essa última é o novo trabalho do Circo Roda, em que um velho palhaço conta a história de seu circo a uma menina. O relato passa por dez cidades brasileiras, e uma delas é Curitiba. Aí entra a Ópera de Arame (só num painel de fundo, já que a peça será apresentada no Teatro Positivo), além de uma alusão ao ônibus Ligeirinho e uma citação ao próprio festival.
"Aproveitamos para beber da cultura dessas cidades de que o texto fala", explica o diretor, Chico Pelúcio, que veio a Curitiba divulgar a peça. Integrante do Grupo Galpão, de Belo Horizonte, ele atuará em Eclipse, em que cinco pessoas conversam durante um eclipse interminável, e é ainda curador de uma das sete mostras que integram o evento paralelo Fringe (Grupos de BH: Teatro para Ver de Perto).
Além das mostras Novos Repertórios, Coletivo de Pequeno Conteúdo, Mostra de Teatro para Crianças de Todas as Idades, Mostra Seu Nariz e na companhia de..., haverá um Momento Itália-Brasil, com o grupo Koreja.
Uma mostra separada do Fringe será a erótica XXX, para maiores de 18 anos, em que se apresentam os grupos Delírio, de Curitiba, e Satyros, originalmente daqui, mas radicado em São Paulo, ambos com versões de Satyricon; e Ato de Comunhão, de Gilberto Gawronski, que narra a bizarra história verídica passada na Alemanha de um homem que praticou canibalismo com permissão da vítima.
Cifras
A 21.ª edição do festival dura 13 dias, de 28 de março a 7 de abril. Serão apresentados 410 espetáculos, incluindo 52 de rua.
O site do festival entra no ar na próxima segunda-feira, e os ingressos serão vendidos a partir do dia 17 de fevereiro a R$ 50 e R$ 25 (meia-entrada) para a mostra principal, com bilheterias nos shoppings Palladium, Mueller e ParkShopping Barigüi.
Homenagem ao "anjo pornográfico"
O festival deste ano não poderia deixar de homenagear Nelson Rodrigues, considerado o maior dramaturgo brasileiro e cujo centenário será comemorado no dia 23 de agosto. A companhia paulistana Fodidos Privilegiados traz à mostra oficial remontagens de O Casamento e Escravas do Amor, ambas criadas a partir de obras não dramatúrgicas do escritor.
O Casamento é um romance em que o ele "reuniu todas as suas obsessões e taras", como define o diretor do grupo, João Fonseca, que veio a Curitiba para divulgar a peça. A primeira versão da obra estreou em 1997, na Ópera de Arame, com direção de Antônio Abujamra. Na época, a reação foi "ame-o ou deixe-o". "Nelson mexe com lente de aumento em coisas profundas", diz o diretor. No elenco estava a curitibana Guta Stresser, que volta para participar da nova versão, ao lado de Dani Barros, que faz dobradinha no festival: ela também está no elenco de Estamira Beira do Mundo.
Escravas do Amor é uma novela, publicada por Nelson sob o pseudônimo de Susana Flag em O Jornal. O grupo trouxe a primeira montagem, bastante cômica, em 2006. "É como uma novela das seis, escrita por esse gênio, com suas características e brincadeiras, mas em tom cor de rosa." "Ninguém tinha montado esses dois trabalhos, e Escravas... ninguém sabia que existia", lembra a atriz Filomena Mancuzo. A ideia das duas remontagens partiu da companhia, que propôs participar do festival.
Se essas peças e ainda a mostra erótica XXX lotarem, seria o fim da fama de conservadora de Curitiba? "A cidade tem um lado conservador, mas outro ousado. E Nelson choca no Rio também", aponta Fonseca.





