
Veneza, Itália - É especialmente significativo que o 68.º Festival de Veneza tenha deixado para a véspera do encerramento a homenagem especial Leão de Ouro pela carreira ao cineasta Marco Bellochio. O momento tem duplo significado. Um, intencional e oficial, por que o gesto representa reconhecimento. Afinal, é um nome emblemático da história do cinema italiano. O outro, involuntário (ou não), acentua o abismo que separa o ontem e o agora do cinema italiano. Pelo que se viu na competição, com exceção de esparsas qualidades no Terra Ferma, de Emmanuele Crialese, não há muito o que esperar da produção italiana na temporada.
Ao receber o prêmio das mãos de Bernardo Bertolucci, veterano que também marcou a mais fecunda estação do cinema político italiano, Bellocchio ganha o reconhecimento por uma trajetória marcada, acima de tudo, pela capacidade de se reciclar. Aos 72 anos, ele obviamente não é mais um jovem, mas ainda é um rebelde. Entenda-se por rebeldia a militância no cinema de pensamento: é só avaliar Em Nome do Pai, realizado há 40 anos e relançado na mostra veneziana em impecável cópia restaurada, e o recente e perturbador Vincere.
Bellocchio, provavelmente o autor do país que mais soube resistir à pressão da inércia criativa, fez a coisa certa. Sem descuidar dos motivos permanentes de sua cruzada temática a crítica à família, à religião e às instituições , ele refinou a linguagem. Diretor de forte pegada política, embora sem abdicar do lirismo, ele nunca foi ideológo no sentido de Godard ou mesmo de Bertolucci, mas um criador de realismo simbólico.
Projetos
Parece que o diretor reencontrou nos últimos anos uma segunda juventude, refletindo com estilo sofisticado àquela rebeldia já referida, e que tão bem desnudou as misérias da burguesia. Poucos Leões especiais foram tão merecidos como o entregue para Bellocchio, que não pensa em parar: entusiasmado com o novo projeto, começa a filmar neste ano um drama sobre a eutanásia, tendo como suporte a história de Eluana Englaro. A mulher, que sofreu um acidente de carro, entrou em coma e foi mantida viva por 17 anos até sua morte em 2009, após o desligamento dos aparelhos.



