
César Almeida transformou um crime passional verídico que envolvia duas pessoas com quem convivia no espetáculo Ardor (2001). Edson Bueno queria fazer cinema por contaminação da mãe, obcecada pelas produções norte-americanas das décadas de 1930 a 1950. Morar longe o impedia de se sentar diante da telona, mas o menino ouvia pela voz dela, entre os pontos de uma máquina de costura, os mínimos detalhes das histórias cinematográficas.
Lala Schneider mantinha um sonho, que era também uma vaidade admitida: encontrar uma estátua sua na Praça Santos Andrade. Mário Bortolotto foi expulso do seminário por ter a chave da cantina e roubar guloseimas lá de dentro. Silvanah Santos pisou em um teatro pela primeira vez para ver uma peça baseada na obra de Agatha Christie. Não entendeu nada. Seus pés nem alcançavam o chão, de tão pequena que era, mas achou aquilo o máximo.
Essas breves memórias se desvelam e se desdobram em muitas outras no livro Cinco Biografias do Teatro Paranaense, escrito por Ivam Cabral e sua sobrinha Marianne Cabral Baggio, com apoio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura. Em menos de 150 páginas, preenchidas não por perfis biográficos, como o título sugere, mas por entrevistas pessoais, os dois autores acrescentam importantes trechos à desfalcada história do teatro no Paraná.
"Conheço os cinco bem. Sou amigo deles. Não queria que essa relação pesasse. Por isso, o olhar da Marianne foi muito importante para mim", diz Ivam, fundador do grupo Os Satyros, ao lado de Silvanah. Quando o trabalho começou, em 2004, a sobrinha ainda cursava Jornalismo. Mesmo assim, ficou responsável pelas primeiras entrevistas com todos os biografados menos Bortolotto.
Diante de César Almeida, a moça ousou mais do que o tio confessa que ousaria em seu lugar. "César fala da homossexualidade, um aspecto que eu talvez velaria, mas ela não. Ela abordou de uma forma natural."
Foram gravadas perto de dez horas de entrevista com cada um, em contatos que se mantiveram até quatro meses atrás. As conversas com Lala, infelizmente, foram interrompidas pela morte da atriz em fevereiro de 2006. "Queria conversar ainda muitas coisas com ela", diz o autor. O texto final foi submetido aos entrevistados, que ajudaram a escolher o que merecia ocupar as páginas.
Sem passado
O interesse de Ivam pela memória do teatro no estado apareceu há dez anos, quando fez o livro Cartazes do Teatro Paranaense. Sua idéia era emular uma publicação paulista semelhante, repleta de imagens. "Descobri que o Paraná não tinha registro histórico praticamente. Até aquele momento, não havia nenhum livro inteiro sobre o teatro do Paraná. Só alguma coisa da Marta de Moares para o mestrado. Fiquei abismado."
Estavam vivos ainda Odelair Rodrigues, Edson e Delcy DAvila. "A sede dos Satyros era na Rua Comendador Macedo, nós chamávamos as pessoas e registrávamos em VHS. Virou uma obsessão minha. Quando a Odelair Rodrigues morreu, os únicos a ter material de arquivo de imagem dela éramos nós. A gente não reconhece nossos ídolos no Paraná."
De lá para cá, Ivam acredita que esse panorama "mudou bastante, mas não significativamente". Ele faz sua parte. Está criando a Satyros Literatura, uma pequena editora que produzirá, a partir de março, títulos de dramaturgia, crônica e ensaios, em parceria com a Imprensa Oficial de São Paulo. Por esse novo projeto, Ivam planeja editar um segundo volume de biografias, no qual as histórias de Odelair, Delcy e Edson DÁvila finalmente devem ser contadas.







