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As bandeiras da Turquia, União Europeia e Estados Unidos no distrito financeiro e de negócios  de Maslak, em Istambul. (Foto> Ozan Kose/AFP)
As bandeiras da Turquia, União Europeia e Estados Unidos no distrito financeiro e de negócios de Maslak, em Istambul. (Foto> Ozan Kose/AFP)| Foto:

Praticamente qualquer pessoa com ascendência árabe que vive no Brasil já passou por isso. Sua família pode ter vindo do Líbano, da Síria ou até da própria Arábia Saudita, mas, por aqui, você será chamado de um só jeito: turco.

A colunista que lhes escreve já viveu essa situação na pele inúmeras vezes, diante da origem sírio-libanesa estampada no rosto.

Dizem que essa associação equivocada tem origem na chegada dos primeiros árabes ao Brasil, que traziam documentos com nacionalidade turca, devido ao então domínio turco-otomano, que já se aproximava de seu fim.

Rusgas e incômodos à parte, especialmente dos mais velhos, eu sempre vi com bons olhos qualquer tentativa de compreensão das minhas origens familiares, que, como boa parte da nossa população, é uma salada mista de diversas nacionalidades.

Ao carregar a associação com os turcos, contudo, também já sofri alguns tipos de acusações bastante injustas.

Não tinha nem 10 anos de idade quando escutei de um colega de classe que minha família, a tal turca, era responsável pela morte da dele, de origem armênia. Nem preciso dizer que jamais esqueci desse episódio, mas reconheço que muito mudou de lá para cá.

Há maior reconhecimento das distinções do povo turco e dos de origem árabe, ainda que, felizmente, guardemos diversas semelhanças, em grande parte concentradas no repertório culinário.

Ouso dizer, contudo, que, em pleno 2018, há, mais do que nunca, uma necessidade latente de se desvincular dos turcos. E, dessa vez, esse desejo não parte de imigrantes árabes, mas, sim, do próprio governo brasileiro.

Nunca antes na história desse país?

A turbulência pela qual a Turquia vem passando, que não é de hoje, já tem gerado consequências para nossos vizinhos e para o nosso mercado.

Pode criar o pano de fundo que desejar.

Um presidente com viés autoritário, intervencionista e nepotista – nomeou seu próprio genro para conduzir as Finanças do país –, inflação galopante, déficit em conta corrente e elevado nível de endividamento em moeda estrangeira.

Questões diplomáticas também compõem o cenário, diante da detenção de um pastor evangélico americano e uma consequente briga com um dos homens mais poderosos do mundo, que resolveu dobrar as tarifas sobre aço e alumínio importados da Turquia.

Do ponto de vista político, é importante lembrar que o passado recente conta com a polêmica mudança constitucional, com ampliação dos poderes do presidente turco Recep Tayyip Erdogan e alteração do sistema político de parlamentarista para presidencialista, sem falar na tentativa de golpe de 2016.

Todos esses elementos decorrem ou se acentuam em um contexto global de iniciativas para enxugar a liquidez, com a alta de juros nos Estados Unidos e a Europa se preparando para acabar com medidas de estímulo econômico em 2019. Até a crise estourar.

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A combinação explosiva dos fatores mencionados levou a economia turca a experimentar um violento nervosismo do investidor nas últimas semanas. Como resultado de um provável ataque especulativo, a lira turca já se desvaloriza 22,6% em relação ao dólar em agosto e acumula uma queda de 40,8% neste ano. Para efeito de comparação, no Brasil, o real também cai em 2018, mas “apenas” 14,4%.

Há quem diga que, dessa vez, o presidente americano não é o culpado. Há uma relutância de Erdogan em promover mudanças de maior impacto na economia, como o desejado aumento da taxa de juros, a adoção de uma política de austeridade fiscal e o pedido de socorro ao FMI. Por enquanto, o governo só está enxugando gelo com as medidas anunciadas.

“A reação de política monetária da Turquia, até agora, pouco se assemelhou àquela que normalmente funciona como um interruptor ou disjuntor (“circuit breaker”) em relação ao risco de contágio para outros mercados”, escreveu Mohamed El-Erian, em artigo no Financial Times republicado hoje pelo Valor Econômico.

O que acontece na Turquia fica na Turquia?

You wish.

Nessa hora, pode sobrar para qualquer emergente. De repente, o Brasil passa a andar de mãos dados com Turquia, já entrelaçada com África do Sul, Argentina e tantos outros. Em meio às turbulências externas e internas, nossos vizinhos Hermanos inclusive tiveram que subir a taxa de juros de 40% para 45% ao ano, depois de o peso despencar.

Ainda que, em um primeiro momento, o Brasil sofra os efeitos do “bloco emergente”, nossos fundamentos macroeconômicos poderão nos diferenciar e nos distanciar da fragilidade tida como generalizada à primeira vista.

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Mas não é só isso. O investidor estrangeiro precisa ter confiança nas perspectivas e, pelo menos até outubro, essa será uma missão praticamente impossível.

A crise turca adicionou mais um elemento de tensão ao ambiente macroeconômico e seus efeitos deverão ser monitorados de perto pela equipe de Ilan Goldfajn no Banco Central.

Na incerteza constante em que vivemos, você, investidor, precisa se lembrar de ter sempre uma parte do dinheiro em ativos mais seguros. Não é tarefa nada fácil gerir seu patrimônio em momentos de tamanha imprevisibilidade. Então, na dúvida, peque pela parcimônia. Confira o quanto dos seus investimentos estão em risco e avalie se está confortável com essa exposição.

E busque seguros para proteger sua carteira. Quem tem uma parte do dinheiro exposta ao dólar deve estar dormindo bem mais tranquilo nesse momento…

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