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Como em tantas peças gregas, na Antígona de Sófocles a política se faz presente. Num discurso, Creonte alerta sobre a impossibilidade de “conhecer o espírito, pensamento e determinação de qualquer homem, antes de ele se ter exercitado no poder e nas leis”. Creonte entendia que “todo aquele que, sendo supremo senhor de um Estado, não se mantiver firme nas melhores decisões, mas por medo entravar a sua língua, é e foi sempre um grande celerado”.

Quase todos os candidatos à Presidência já exerceram cargos políticos, alguns em poderes distintos, e, portanto, mesmo jamais tendo sido senhor supremo de um Estado como era possível na realidade política da Grécia de Sófocles, teve em suas mãos algum poder estatal. O que cada um deles fez com esse poder é parte da resposta sobre quem são e como agem sob determinadas circunstâncias. A vida política pregressa é um bom indicativo – mas não o único – de como as respectivas personalidades e caráter se manifestam quando têm algum poder e são desafiados pelo ponderável e pelo imponderável.

Quando digo que essas informações são parte da resposta é porque, dado o curso temporal de uma carreira na política, o político pode piorar ou melhorar; pode continuar se cercando do que existe de mais baixo na política ou de gente íntegra; pode assimilar ideias piores que as que já tinha ou mudar para outras virtuosas. No caso de acréscimo de ideologias inferiores, é muito plausível que isso aconteça num ambiente intelectual, político e jornalístico viciado e ideologicamente enviesado no qual preponderam projetos políticos ideológicos que já foram testados e fracassaram.

Não é de se estranhar, portanto, que a maioria dos políticos seja uma nulidade intelectual e nem pareça capaz de se cercar dos melhores quadros para compensar as suas próprias limitações. Não importa se bem ou mal sucedidos em suas carreiras, essa casta política fez (e faz) tão mal ao país com o poder que tinha (e tem) porque jamais teve “as melhores decisões” para nelas se firmar e muito menos conseguiu, individualmente, superar os seus dramas existenciais e espirituais.

É fato que somente a existência de ideias, princípios, virtudes e decisões acertadas não garantem a vitória numa eleição, nem a realização de um bom governo. Por essa razão vemos regularmente a ascensão dos piores ao poder político. Quero dizer com isso que há um dado fundamental da política que geralmente escapa aos comentaristas, é desconhecido pelos jornalistas e que, por isso, não chega ao conhecimento da população: os incentivos internos perversos dos três poderes que fazem a máquina estatal funcionar do jeito como funciona.

Um livro valioso para entender uma parte fundamental desse mecanismo, para conhecer a origem e as consequências dos incentivos perversos criados pelo Estado no comportamento das pessoas e no funcionamento das instituições, e para elaborar antídotos contra o sistema em vigor é A Ciência da Política – Uma Introdução, do cientista político e professor Adriano Gianturco. O manual é uma análise descritiva de vários fenômenos que nos ajudam a compreender a lógica da política sem vulgarizá-la ou enaltecê-la. Pelo didatismo, estrutura e organização dos capítulos por tópicos, é livro para ler e reler.

Os incentivos perversos não podem ser combatidos diretamente com princípios, valores, virtudes, mas com a mudança ou eliminação daquelas regras, normas, legislações que prejudicam a sociedade e beneficiam o Estado, os políticos, os servidores e aliados do poder de turno.

A mudança de incentivos – de negativos para positivos – é a única solução. Mas – e é bom que isso fique bem claro – só há como fazer uma reforma necessária e adequada para alterar ou eliminar os incentivos perversos se quem a propuser estiver imbuído dos melhores princípios, valores e virtudes de forma que as mudanças sejam o seu reflexo. Sem essa dimensão ética e moral, qualquer reforma poderá piorar o que já era ruim. Se é impossível, como alertou Sófocles, “conhecer o espírito, pensamento e determinação de qualquer homem, antes de ele se ter exercitado no poder e nas leis”, é possível, pelo menos, questionar um político acerca do que ele pensa e deseja fazer em relação ao poder e às leis.

É uma lição que nós devemos aprender para as eleições de 2018: faz-se necessário e urgente hoje que os candidatos à Presidência, Senado, Câmara dos Deputados, governos e assembleias legislativas não só apresentem um conjunto de virtudes, mas que tenham como um dos fundamentos de sua agenda política extinguir ou reformar os incontáveis incentivos perversos que existem na legislação.

Sem esse trabalho de limpar os trilhos ancorado nas virtudes, aquelas que Cícero identificava com a excelência, continuaremos sendo um país semelhante a uma locomotiva, que, grande e pesada, se depara com todo tipo de entulho ao longo da linha férrea e não consegue avançar como deveria. O trem até anda, mas lentamente, e sendo ainda obrigado a parar constantemente para consertar os estragos provocados pelos inúmeros obstáculos que se multiplicam constantemente.

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