O casarão azulado com esculturas cerâmicas em formato de leão expostas no jardim frente a sua fachada, localizado no bairro Alto da Glória, em Curitiba, tem sido atualmente muito compartilhado nas redes pelo seu potencial fotográfico ou “instagramável”, já que conta com uma linda arquitetura que mistura os estilos neoclássico e barroco. Mais especificamente, esse tipo de arquitetura passou a ser denominada “arquitetura residencial dos ervateiros”, por carregar essa característica junto de outras casas e edifícios que vieram do grande impulso econômico causado pela erva-mate na cidade de Curitiba, na virada do século 20.
O século 19 ficou conhecido como o período de ouro da erva-mate que trouxe consigo conquistas importantes, como a Emancipação da Província do Paraná, que consequentemente impulsionou a cultura, educação, arquitetura e urbanização da região.
Essa majestosa construção, hoje conhecida como Espaço Cultural BRDE – Palacete dos Leões, conta no seu exterior com detalhes ornamentais como capitéis coríntios, balaústres, conchas, medalhões e esculturas de leões. E, nos seus interiores, mantém papéis de parede e tetos em estuque decorados com relevos de flores, frutas e anjos, além de lustres de cristal e cortinas originais da época da construção.
O Palacete dos Leões reflete o esplendor do ciclo do mate ao incorporar não apenas algumas tecnologias inovadoras para a época, mas também alguns primorosos trabalhos artesanais únicos, pelas mãos de artistas locais e estrangeiros.
Um exemplo desses trabalhos manuais e estrangeiros são os famosos leões do jardim, que são peças de ornamentação provenientes da Fábrica Santo Antônio do Vale da Piedade, uma das mais antigas indústrias cerâmicas da cidade de Vila Nova de Gaia, em Portugal. Atualmente, são réplicas que se encontram no jardim para a preservação das peças originais, que foram restauradas ao longo dos anos, mas, para evitar futuros desgastes, em 2018, o BRDE (Banco Regional do Extremo Sul), junto à equipe de restauradores, optou pela preservação e armazenamento interno das esculturas para àqueles que desejam ver os leões originais.

Patrimônio cultural do Paraná sob os cuidados do BRDE
Para além das visitas que levam a fachada do casarão como plano de fundo de lindas fotos, o Palacete dos Leões foi construído em 1902, se tornou uma Unidade de Interesse de Preservação Municipal em 1979 e, em 1987, sob a administração do IBM Brasil, um centro cultural. Já em 2003 foi tombado como patrimônio histórico e cultural do Paraná e, em 2004, o Palacete passou a ficar sob os cuidados do BRDE, que o adquiriu, assumindo sua manutenção e uso cultural.
A inauguração do Espaço Cultural BRDE – Palacete dos Leões aconteceu em 2005, porém, desde o início de sua aquisição, o BRDE tem feito grandes investimentos para manter esse patrimônio cultural, como foi o caso das reformas prévias à sua inauguração que contaram, por exemplo, com a instalação de elevadores, sistemas de climatização e adaptações para atender às normas de segurança e acessibilidade, além da restauração das características originais do período residencial e elementos arquitetônicos originais.
Entre 2017 e 2018, além da reconstituição das esculturas cerâmicas portuguesas dos leões, o BRDE promoveu um novo restauro do palacete, com destaque especial à recuperação dos pisos internos em parquet.
Investimento do BRDE na restauração
Em 2022, o BRDE iniciou um processo de restauração da parte externa e da cobertura do palacete orçado em quase R$ 400 mil e com previsão de conclusão em seis meses. As obras incluíram reforço estrutural, recuperação de revestimentos e esquadrias, impermeabilização de pisos e cobertura e pintura externa, por exemplo.
O Palacete representa não apenas a importância histórica da residência da família Leão Júnior, mas também a de diversas outras construções contemporâneas a ela, erguidas nas regiões do Alto da Glória e do Batel, que foram demolidas na segunda metade do século XX. A sua preservação traz um ar de nostalgia e testemunha esse período ligado ao ciclo da erva-mate e que foi tão marcante economicamente para a cidade.

A história da construção símbolo de uma época
Inicialmente, o palacete foi construído para ser a residência da família de Agostinho Ermelino de Leão Jr e Maria Clara Abreu de Leão, fundadores da conhecida marca de chá Matte Leão. A família estava entre as principais famílias ervateiras da época.
De acordo com relatos de conhecidos e descendentes da família, o Sr. Leão Jr. teria deixado o engenho de erva-mate que possuía na atual Avenida João Gualberto por volta de 1890 e se mudado para Ponta Grossa onde enriqueceu. Quando retornou à Curitiba, no final do século 19, deu início à construção do palacete que foi concluída em 1902, ano em que ele e sua família se mudam para lá aproximadamente pois a penúltima filha do casal, Maria Clara Leão de Macedo, nasce na casa em 1903.
O Sr. e a Sra. Leão tiveram 8 filhos, respectivamente Agostinho (1891-1892), Agostinho Ermelino de Leão (1892-1953), Dolores Leão de Macedo (1894-1918), Agílio Leão (1896-1917), Ivo Abreu Leão (1898-1963), Ruy Leão (1900-1929), Maria Clara Leão de Macedo (1903-1980) e Luiz Abreu Leão (1906-1947).
Com o falecimento de seu marido, em 1907, Maria Clara, sua esposa, ficou à frente da casa e dos negócios da família por quase 3 décadas, tornando-se uma das primeiras mulheres no comando de uma empresa de tamanha relevância para a economia local como a Matte Leão.
Maria Clara Abreu de Leão é uma figura de destaque, pois ocupou uma posição de liderança nos negócios em uma época em que raras vezes se via mulheres nessa posição, tornando-se assim um símbolo de representatividade feminina. Neta do Visconde de Nácar e irmã de Cândido de Abreu – engenheiro, ex-prefeito de Curitiba e responsável pelo projeto do Palacete Leão Júnior –, ela esteve à frente da imponente residência localizada no coração da cidade, que inclusive recebeu o presidente Afonso Pena durante sua visita ao Paraná.
Posteriormente, a residência da família passa a ser administrada pela filha do casal, Maria Clara Leão de Macedo - mais tarde conhecida pelos familiares como "Tia Caia" -. Caia manteve a casa sempre movimentada, recebendo constantemente os sobrinhos e demais familiares e promovendo eventos culturais informais até seu falecimento em 1979.
O último morador foi Agílio Leão e, em 1984, a propriedade foi adquirida pela IBM Brasil, que dedicou a construção principal para atividades e eventos culturais e construiu a sede da empresa em outra parte do terreno, respeitando a harmonia inicial do projeto do local e a disposição dos elementos construídos na área, e mantendo o valorizado pomar cultivado desde os primeiros anos em que a família Leão Jr habitou o recinto. Atualmente, o BRDE ocupa o edifício construído no terreno na década de 80, sendo sua sede regional no Paraná.

Um palco histórico para o cinema nacional
Cenário que respira o passado, o Palacete dos Leões foi muito mais que o símbolo da época de ouro da erva-mate no Paraná. A construção história foi um dos palcos principais do premiado filme O Preço da Paz, lançado em 2003.
Dirigido por Paulo Morelli e com roteiro de Walter Negrão, baseado no livro de Túlio Vargas, "O Preço da Paz" é uma viagem no tempo para um dos capítulos mais turbulentos da brasileira: a Revolução Federalista em terras paranaenses.
O filme, que contou com um elenco estelar incluindo Herson Capri, Giulia Gam, Danton Mello, Camila Pitanga, José de Abreu, Alexandre Nero e Lima Duarte, foi rodado em diversos locais icônicos do Paraná, como Lapa, Castro, Ponta Grossa e Paranaguá. Mas foi no Palacete dos Leões, em Curitiba, que boa parte da angústia e das negociações do Barão do Serro Azul ganham maior importância.
A produção cinematográfica nos transporta para o auge do drama, quando as tropas dos idealistas revolucionários Maragatos, comandadas por Gumercindo Saraiva, chegam a Curitiba. A trama se adensa com as tensões entre os revoltosos e o Barão do Serro Azul, que, representando a Junta Governativa de Curitiba, busca desesperadamente evitar o saque da cidade. É nesse contexto de negociações intensas e dias finais de um homem à frente de seu tempo que o Palacete dos Leões emerge como um personagem silencioso, mas fundamental. Suas paredes, sua arquitetura, cada detalhe contribuem para a autenticidade dramática, transportando o espectador para o coração da crise.
Em 2003, "O Preço da Paz" conquistou os prêmios de melhor montagem, melhor direção de arte e o Prêmio do Júri Popular no prestigiado Festival de Gramado. No ano seguinte, no Festival de Tiradentes, ganhou o Troféu Barroco na categoria de melhor longa-metragem no Prêmio do Júri Popular.
Assim, o Palacete dos Leões transcende sua beleza arquitetônica para se firmar como uma estrela discreta, porém inegável, no panorama do cinema nacional.
Espaço cultural gratuito e ponte entre o BRDE e a sociedade
Atualmente, o Espaço Cultural BRDE - Palacete dos Leões, funciona como uma ponte concreta entre o BRDE e a sociedade. Sua missão é fomentar a sensibilização e participação de artistas e da comunidade na vida cultural da cidade, garantindo acesso gratuito à arte e à cultura. Com uma programação gratuita, ao longo do ano, o espaço realiza exposições temporárias de artistas que refletem a diversidade e a riqueza da produção artística e práticas contemporâneas. Também é palco de eventos e atividades relacionadas à arquitetura, história, arte contemporânea e patrimônio cultural que reforçam a valorização da memória cultural, sempre com o objetivo de fortalecer os laços entre instituição financeira e sociedade.
Um exemplo desses eventos diversos são as apresentações gratuitas da Oficina de Música de Curitiba e o projeto Sala de Música, em parceria com a Escola de Música e Belas Artes do Paraná (EMBAP/UNESPAR) que realiza em algumas épocas do ano recitais gratuitos às terças-feiras, com apresentações de estudantes e professores, incluindo violão, violoncelo, quarteto de violões e poesia musicada.
Por meio dessas ações culturais e educativas, o BRDE preserva esse patrimônio cultural e reafirma seu papel no fomento à cultura ao promover à população mais um espaço cultural de referência.
O Palacete é um museu vivo que mistura história com arte contemporânea em um terreno de 10 mil metros quadrados, que abriga também um bosque de árvores centenárias.

Edital abre espaço exposições
Para celebrar os 20 anos do Espaço Cultural BRDE – Palacete dos Leões, o BRDE lançou no fim de maio deste ano um edital de R$ 300 mil para selecionar duas exposições para o espaço.
O edital irá selecionar projetos que proponham duas exposições coletivas nas áreas de Artes Visuais, abrangendo pintura, desenho, gravura, fotografia, design, artes gráficas entre outras; e um programa educativo para integrar a programação do espaço em 2026.
O edital convida propostas que dialoguem com os três pilares conceituais do espaço, que são elas: Casa, com projetos que explorem simbolicamente os espaços e formas de habitar; Memória, com reflexões sobre temporalidades, ancestralidades e heranças no cotidiano; e Visões Reinventadas, com novas perspectivas que revelem subjetividades e releituras críticas dos temas de casa e memória.
O que já foi visto no Palacete recentemente
Para que o público tenha uma ideia da programação do espaço, algumas exposições e mostras mais recentes recebidas no Palacete foram:
“Deslocamentos Têxteis” (novembro a dezembro de 2024): Reuniu obras de 36 artistas e artesãos, explorando técnicas contemporâneas e tradicionais em arte têxtil. A mostra foi dividida em dois núcleos: “Na ponta dos dedos na palma da mão”, com trabalhos em pequenos formatos, e “Antes que se faça noite, guardo meus horizontes”, apresentando paisagens em grande formato da artista Verônica Filipak.
“Motivos” (janeiro de 2025): Exposição individual de Laura Ridolfi, apresentando pinturas que investigam memórias familiares e referências à azulejaria, explorando formas geométricas e elementos figurativos.
“Transfiguração da Forma” (abril a maio de 2025): Exposição da artista Mozileide Neri, composta por trinta obras que exploram a abstração geométrica, inspiradas na pesquisa sobre cinco artistas brasileiras: Judith Lauand, Maria Leontina, Lygia Clark, Beatriz Milhazes e Criola.
“Coisas de Alice” e “Ilex: o tempo das coisas” (abril a maio de 2025): Mostras do duo BordaDuras e do coletivo Bordas, respectivamente, que exploram memórias e objetos afetivos através de diferentes técnicas artísticas.
As inscrições para o edital ficam abertas até dia 23 de junho. Para mais informações do edital, você pode acessar: https://www.brde.com.br/palacete/editais/
Em 2025, agenda do Palacete tem várias atrações
Em 2025, o Espaço Cultural BRDE completa duas décadas de atividades, reforçando seu compromisso com as artes visuais, patrimônio e história.
Neste mês de junho, a fotógrafa Vilma Slomp abre a mostra "Amazônia: mergulho num caleidoscópio entre dragas e dragões", seguida pelas pinturas oníricas de Gabriela Stragliotto em "Pensamento Paisagem" no período de julho a agosto.
A coletiva "Misancene" formada por quatro artistas contemporâneos ocupará o espaço durante os meses de setembro e outubro, enquanto novembro recebe a instalação-surpresa "Arqueira", de autoria não revelada.
Outro destaque é o projeto Sala de Música, que promove recitais didáticos duas terças-feiras por mês, em parceria com a Escola de Música e Belas Artes do Paraná (EMBAP/UNESPAR). Os eventos são protagonizados por músicos, estudantes e professores da EMBAP, que transformam as salas históricas do palacete em palcos para performances musicais. As atividades têm caráter educativo, aproximando o público da produção musical acadêmica.
Serviço
Horário de visitação: Terça a sexta-feira, das 13h às 18h (última entrada às 17h30).
Entrada: Gratuita.
Endereço: Avenida João Gualberto, 570 – Alto da Glória, Curitiba – PR.
Contato: (41) 3219-8184 e (41) 3219-8008