No Brasil, as políticas públicas de saúde ainda enfrentam grandes desafios para garantir às mulheres o acesso adequado ao diagnóstico e ao tratamento do câncer. A médica oncologista clínica Maria Cristina Figueroa Magalhães, vice-presidente do Instituto de Inovação e Ensino em Saúde (INTES), destaca a urgência de ampliar o acesso a exames preventivos, fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS) e reduzir as desigualdades regionais.
Segundo a oncologista, a demora para consultas e exames diagnósticos é um dos principais obstáculos, especialmente na rede pública. No caso do câncer de mama, a mamografia regular pode reduzir a mortalidade em até 30%. Já o exame de Papanicolau é capaz de detectar lesões precursoras do câncer de colo do útero com anos de antecedência — o que evidencia a importância da detecção precoce para aumentar as chances de cura.
Outro ponto crítico é a desigualdade regional. Mulheres que vivem em áreas rurais, periferias urbanas ou nas regiões Norte e Nordeste enfrentam maiores dificuldades para acessar serviços especializados de saúde. A falta de integração entre os níveis de atenção — da atenção básica ao atendimento hospitalar — também contribui para um descompasso entre o diagnóstico e o início do tratamento.
Além disso, a infraestrutura dos hospitais oncológicos é insuficiente para a demanda existente, gerando longas filas de espera. Ainda falta investimento em atenção primária e prevenção — justamente as portas de entrada mais eficazes para identificar sinais precoces da doença.
“O resultado é um cenário em que muitas mulheres ainda chegam aos centros de tratamento com doença avançada, quando o impacto físico, emocional e financeiro é muito maior”, explica a oncologista.
O papel das políticas públicas de saúde
Para mudar esse cenário, as políticas públicas de saúde precisam ser mais do que diretrizes no papel. Maria Cristina destaca a importância de uma atuação integrada e humanizada, que comece pela atenção primária, passe pela ampliação da Rede de Atenção Oncológica e chegue até o apoio psicossocial das pacientes.
Entre as medidas prioritárias, a médica cita:
- Capacitação de profissionais para identificar sinais de alerta e realizar encaminhamentos com agilidade;
- Redução do tempo de espera para exames como mamografias e biópsias;
- Mais recursos para hospitais oncológicos, com equipes multidisciplinares e fluxo de atendimento organizado;
- Criação de centros regionais de referência, aproximando as pacientes dos serviços especializados;
- Implementação de programas de navegação de pacientes e suporte emocional contínuo.
“Uma política pública efetiva enxerga a paciente como um todo, e não apenas como um número ou um caso clínico”, reforça.
Iniciativas que merecem destaque
Apesar das dificuldades, algumas ações recentes dos governos federal e estaduais mostram avanços. Um exemplo é a Lei dos 60 Dias (Lei nº 12.732/2012), que garante o início do tratamento do câncer no SUS em até 60 dias após o diagnóstico. Embora sua aplicação ainda enfrente desafios, a norma representa um marco legal importante para os direitos das pacientes.
Outras iniciativas que merecem reconhecimento incluem: campanhas itinerantes de rastreamento, como as carretas da mamografia em estados como Minas Gerais, São Paulo e Paraná; expansão de hospitais do câncer em regiões descentralizadas; e incorporação de medicamentos oncológicos no SUS, ainda que de forma lenta.
O entrave, segundo Maria Cristina, está em transformar ações pontuais em políticas públicas permanentes, com financiamento estável e avaliação de impacto constante.
O fortalecimento das políticas públicas de saúde, o acesso digno ao tratamento oncológico, a valorização do SUS e a garantia dos direitos das pacientes são pilares para mudar a realidade da saúde da mulher no Brasil. Como lembra a especialista, “investir em saúde da mulher é investir em toda a sociedade”.

