A primavera chega e muda não apenas a paisagem de Santa Catarina, mas também o que vai à mesa de moradores e visitantes. Cardápios ficam mais leves, chefs apostam em receitas frescas, produtores celebram a safra de ingredientes típicos e a gastronomia se torna, mais do que nunca, um convite aos sabores.
O Estado, conhecido por sua diversidade natural que combina mar, montanha e planalto, também se firma como referência nacional quando o assunto é culinária de identidade regional. Ingredientes sazonais — como ostras, tainha e camarão — ganham protagonismo, assim como pratos herdados de tradições açorianas, italianas, alemãs e austríacas. Tudo isso em sintonia com um movimento crescente: o de valorizar produtos com origem, qualidade certificada e ligação direta com a cultura local.
Ingredientes que anunciam a estação
No inverno predominam pratos com sabores marcantes, a primavera abre espaço para receitas mais leves e harmonizadas. com destaque para pescados, frutos do mar, hortaliças e frutas. Em Florianópolis, por exemplo, as ostras atingem seu melhor ponto, frescas e cultivadas nas águas calmas do Ribeirão da Ilha. A tainha, que marca o inverno, ainda aparece em pratos de transição, como a tradicional tainha na taquara, assada de forma rústica em fogueiras à beira-mar.
Na Serra Catarinense, os vinhos de altitude ocupam lugar de destaque: São Joaquim, Urubici e Bom Retiro oferecem rótulos premiados, visitas a vinícolas e experiências de enoturismo. E no sul com as uvas goethe. Já em Fraiburgo, conhecida como a “terra da maçã”, os pomares em flor enchem a primavera de cores, atraindo turistas para passeios fotográficos e degustações de tortas, strudels, geleias, compotas e até vinhos e sidras de maçã.
Turismo e sazonalidade

O calendário gastronômico de Santa Catarina é diretamente ligado à sazonalidade dos produtos e às festas que celebram colheitas e tradições. Em Blumenau, a Oktoberfest, que acontece em outubro, mistura cerveja artesanal, pratos típicos alemães e shows culturais, atraindo visitantes de todo o Brasil. Assim como a Fenarreco, festa que acontece em Brusque, e que possui como um de seus pratos principais o marreco recheado.
Esse alinhamento entre produto, cultura e turismo é o que tem feito o Estado ser considerado um dos polos mais fortes de turismo gastronômico do país.
Sabores do mar: a herança açoriana e os frutos frescos

Em Florianópolis, considerada a “capital da gastronomia criativa” reconhecida pela UNESCO, o cultivo de ostras se consolidou como marca registrada da Ilha. Pequenos produtores, organizados em associações, fazem do Ribeirão da Ilha e da Barra da Lagoa destinos obrigatórios para quem busca a experiência de saborear ostras recém-colhidas.
Além da ostra, o litoral catarinense mantém viva a tradição da sequência de camarão, prato coletivo que oferece diversas versões do crustáceo: frito, ao bafo, ao alho e óleo, empanado, entre outros.
A tainha na taquara, preparada por comunidades pesqueiras, resgata saberes açorianos de mais de dois séculos. O peixe, atravessado por uma vara e assado lentamente na brasa, ainda é servido em festas comunitárias e restaurantes típicos.
Festa e identidade
A gastronomia costeira catarinense está fortemente ligada às festas populares. Seja em São Francisco do Sul, no litoral norte, ou em Laguna, no sul, a mesa é extensão da cultura pesqueira. Pratos típicos são servidos em festas de padroeiro, romarias e celebrações locais, sempre acompanhados por música e dança tradicional.
Sabores da serra: tradição e vinhos de altitude

Na Serra Catarinense, a cultura tropeira segue viva em pratos que exaltam receitas simples e saborosas, muitas delas servidas em pousadas e restaurantes familiares que recebem turistas. Outro destaque serrano são os vinhos produzidos em municípios como São Joaquim, Urubici e Bom Retiro. Conhecidos como “vinhos de altitude”, eles se beneficiam do terroir peculiar da região, que combina baixa temperatura, alta insolação e noites frias.
Vinícolas como Villa Francioni e Pericó conquistaram reconhecimento nacional e internacional, colocando Santa Catarina no mapa do enoturismo. Degustações, visitas guiadas e festas de colheita atraem turistas de várias partes do país.
“Os vinhos de altitude têm identidade própria e são hoje comparáveis a rótulos consagrados do Chile e da Argentina”, afirma um enólogo da Associação Catarinense de Produtores de Vinhos Finos de Altitude.
Para quem gosta de uma experiência com um clima mais agradável, a primavera é uma boa opção para visitar a Serra para apreciar pratos robustos, mas com combinações mais leves, harmonizados com vinhos brancos, rosés e espumantes.
Sabores da imigração: herança europeia à mesa

Santa Catarina é um retrato da diversidade cultural europeia no Brasil. Cada região guarda receitas e tradições herdadas dos imigrantes que chegaram no século XIX e deixaram marcas profundas na culinária.
Culinária alemã
Em Blumenau, Joinville e Pomerode, pratos como joelho de porco (eisbein), cucas recheadas e marreco com repolho roxo continuam sendo preparados em restaurantes familiares e festas comunitárias.
A Oktoberfest, em Blumenau, vai muito além da cerveja: é uma vitrine de pratos típicos e sobremesas germânicas, consolidando a cidade como capital nacional da gastronomia alemã.
Culinária italiana
Nas regiões de Nova Trento, Videira, Tangará e Pinheiro Preto, a herança italiana se manifesta em polentas, massas, queijos artesanais e festas da uva. O vinho é presença forte, e a primavera marca um período de renovação dos vinhedos e de preparo para a colheita seguinte.
Culinária austríaca

Em Treze Tílias, o sabor é austríaco. Restaurantes típicos oferecem pratos como schnitzel (filé empanado), apfelstrudel (torta de maçã), salsichas artesanais e embutidos e especialidades como o tafelspitz (carne bovina cozida) e o käsespätzle (massa caseira com queijo).
Fraiburgo, a terra da maçã

Conhecida como “capital nacional da maçã”, Fraiburgo é responsável por cerca de 30% da produção estadual da fruta. A cidade transformou o cultivo em atração turística: visitantes podem acompanhar a florada dos pomares e provar tortas, strudels, geleias, compotas e até vinhos e sidras de maçã.
“A maçã está em tudo em Fraiburgo: na economia, na mesa das famílias e na identidade cultural da cidade”, afirma um representante da Associação Brasileira de Produtores de Maçã.
Culinária da fronteira catarinense
Na região da fronteira de Santa Catarina, como em Dionísio Cerqueira, o churrasco é uma herança cultural que transcende as receitas e se torna um ritual. As carnes suínas e bovinas de cortes nobres são preparadas lentamente na brasa, e o sabor é aprimorado pelo tempero simples de sal grosso. Essa tradição, trazida por povos que buscaram na pecuária a base da sua subsistência, é o ponto central dos encontros familiares e das festividades.
As rodas de chimarrão e as conversas sobre o cotidiano da lavoura e da criação de gado fazem parte desse cenário, onde a tradição gaúcha se entrelaça com a identidade local do extremo-oeste catarinense.
A força da cultura cervejeira

Se a Alemanha deixou marcas profundas na mesa catarinense, a cerveja é, talvez, a mais visível. Blumenau é considerada a “capital brasileira da cerveja” e concentra dezenas de cervejarias artesanais. A cidade também sedia o Festival Brasileiro da Cerveja, que reúne produtores de todo o país.
O movimento cervejeiro se espalhou para outras cidades, como Joinville e Florianópolis, criando polos que oferecem visitas a fábricas, degustações e harmonizações gastronômicas. Hoje, Santa Catarina conta com mais de 300 cervejarias registradas, o que coloca o Estado entre os líderes nacionais do setor.
Para o turista, a experiência vai além da bebida: a harmonização com pratos típicos é parte da proposta. Marreco recheado, linguiça Blumenau, frutos do mar e embutidos artesanais são servidos ao lado de cervejas que valorizam estilos clássicos e receitas experimentais.
Santa Catarina se põe à mesa para os visitantes
A primavera em Santa Catarina é mais do que uma estação de clima agradável: é um período em que a gastronomia se reafirma como expressão cultural, motor econômico e atrativo turístico. Do litoral às montanhas, passando pelas cidades colonizadas por imigrantes, os sabores se renovam e mostram a força de uma cozinha que combina tradição e inovação.
Para o visitante, a experiência vai muito além de degustar um prato típico: é mergulhar em histórias, festividades e saberes transmitidos entre gerações. Para os produtores e chefs, é a oportunidade de mostrar que a identidade de Santa Catarina está, também, naquilo que se serve à mesa.

