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Polêmica

“O Freelancer” investiga a autoria de foto da Guerra do Vietnã que chocou o mundo

"O Freelancer" questiona quem fez a clássica foto “Garota do Napalm”
"O Freelancer" questiona quem fez a clássica foto “Garota do Napalm” (Foto: Divulgação/Netflix)

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Disponibilizado pela Netflix neste mês, O Freelancer - O Homem Por Trás da Foto provoca forte repercussão desde o lançamento no festival de Sundance, no início do ano. Não por recontar batalhas, explosões ou estratégias militares da Guerra do Vietnã, mas por questionar a autoria de uma das imagens mais emblemáticas do século XX. A fotografia oficialmente conhecida como The Terror of War, ou “Garota do Napalm”. 

O documentário, dirigido pelo vietnamita-americano Bao Nguyen, sustenta que o responsável real pelo clique histórico, vencedor do Prêmio Pulitzer, não teria sido o fotógrafo até então creditado, Nick Ut. Mas sim um fotógrafo vietnamita chamado Nguyen Thanh Nghe, que trabalhava como freelancer para a Associated Press, a mesma agência de notícias de Ut. 

A imagem da “Garota do Napalm” entrou para a história por condensar horror, inocência, dor e injustiça em apenas uma foto. O registro foi feito em 8 de junho de 1972 e mostra a pequena Phan Thi Kim Phuc correndo despida, com o corpo queimado, enquanto fugia de um bombardeio de napalm no vilarejo de Trảng Bàng, no Vietnã do Sul. 

Assim que publicada, a foto mobilizou a consciência mundial, se tornando um símbolo da barbaridade da guerra. Muitos historiadores e críticos afirmam que nenhuma cobertura televisiva ou reportagem escrita exerceu sobre a opinião pública o impacto que aquela fotografia alcançou ao redor de todo mundo.

É o peso simbólico da foto que o documentário busca revisitar. Mas, acima de tudo, o que O Freelancer propõe é uma reflexão sobre quem conta a história. Bao Nguyen, que é filho de vietnamitas refugiados nos EUA após o conflito, assume com o filme que investigar a autoria de uma imagem icônica é também investigar o modo como o Ocidente consome narrativas de guerra.

A produção se desenrola como uma investigação documental. Jornalistas e fotojornalistas varrem arquivos, antigos negativos, mapas, depoimentos, lembranças guardadas por décadas, buscando reconstruir passo a passo quem realmente pressionou o disparador da câmera naquele 8 de junho de 1972. 

O protagonista dessa busca é outro veterano da fotografia de guerra, Gary Knight, figura de reputação internacional, cofundador da agência VII Photo Agency. Knight assume a condução do documentário como um esforço para dar voz aos esquecidos pela história, aos freelancers de guerra cujas contribuições, muitas vezes, foram apagadas ou apropriadas por agências ocidentais.

"O Freelancer" sustenta que o responsável real pelo clique histórico não teria sido o fotógrafo até então creditado"O Freelancer" sustenta que o responsável real pelo clique histórico não teria sido o fotógrafo até então creditado (Foto: Divulgação/Netflix)

O que surpreende no documentário não é apenas o questionamento da autoria e o risco de abalar um ícone do jornalismo. Mas a coragem de revisitar uma decisão que moldou parte da memória coletiva sobre o Vietnã. 

Segundo depoimentos presentes no filme, um ex-editor da agência Associated Press (AP), Carl Robinson, afirma que recebeu ordens, em Saigon, para creditar a foto a Nick Ut apesar de ela ter sido feita por um freelancer. Robinson diz que essa atribuição teria sido fruto de decisão interna, influenciada por políticas de prestígio profissional. 

Ao longo dos anos, a “Garota do Napalm” serviu como advertência contra a brutalidade de conflitos, alimentou o sentimento pacifista ocidental e ajudou a moldar a percepção global da guerra no Vietnã. A imagem também influenciou gerações de foto-jornalistas, estabelecendo parâmetros de empatia, urgência e verdade diante da câmera. 

O Freelancer não foi unânime em sua recepção. A Associated Press, por meio de investigação interna, negou haver provas suficientes para alterar o crédito da foto. A agência avaliou negativos originais e relatos contemporâneos e concluiu não haver motivos sólidos para revogar o reconhecimento dado a Nick Ut. 

Mas o valor do documentário não se limita a um nome no crédito de uma foto. O Freelancer é um convite à reflexão sobre o poder da imagem, a justiça histórica e o respeito pelas origens esquecidas. Não se trata de revisionismo ideológico, mas de busca pela integridade da memória.

  • O Freelancer - O Homem Por Trás da Foto
  • 2025
  • 100 minutos
  • Indicado para maiores de 16 anos
  • Disponível na Netflix

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