Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Ennio, o Maestro

Por que as trilhas de Morricone viraram marca registrada dos filmes de faroeste

Ennio Morricone, que nos deixou em 2020
O maestro Ennio Morricone, que nos deixou em 2020 (Foto: Divulgação Prime Video)

Ouça este conteúdo

No último mês de julho, completou-se cinco anos da partida de Ennio Morricone. Já os preparativos para a celebração de seu centenário – ele nasceu em 10 de novembro de 1928 – não vão tardar a começar. Certamente, o mundo lembrará desse gênio da música contemporânea com toda a pompa e circunstância que ele merece. Até lá, a melhor pedida é ver ou rever Ennio, o Maestro, que está no catálogo do Prime Video.

O diretor italiano Giuseppe Tornatore, com quem Morricone colaborou em Cinema Paradiso (1988), não foi econômico na homenagem ao ícone. Seu documentário, lançado no ano seguinte à morte do maestro, estende-se por mais de duas horas e meia, com depoimentos do enfocado e de 25 parceiros ou fãs ilustres, num formato bem tradicional e cronológico, que serve como uma bela aula introdutória para quem só escutou suas trilhas sonoras sem se informar tanto sobre as mesmas.

A narrativa começa na infância, quando o pequeno Ennio só queria se formar em medicina, mas foi obrigado a estudar trompete pelo pai, que também tocava o instrumento. Geralmente, é o contrário: a criança sonha em ser músico ou embarcar numa atividade que dá pouco dinheiro, enquanto os pais puxam para uma profissão mais sólida. Mas o futuro maestro era obediente e logo se viu que tinha mesmo talento para a música.

Com 45 minutos de filme, o espectador já está se deliciando com os temas que Morricone fez para faroestes nos anos 1960. Ele, que já tinha uma boa bagagem na música de concerto, até sentia uma certa vergonha de escrever trilhas para filmes, algo que não tinha qualquer prestígio naquela época. Mas a verdade é que seu conhecimento de Bach, Stravinsky e demais fenômenos da música erudita, aliado ao seu interesse pelo experimentalismo, fez nascer um compositor singular, que surpreendia o diretor Sergio Leone com instrumentações fora do convencional e citações de clássicos que nem todo mundo sentado na cadeira do cinema pescava.

Assobios, gaitas e percussões

O próprio Clint Eastwood, que protagonizou a "trilogia dos dólares" de Leone, expressa sua surpresa ao ouvir as composições inusitadas de Morricone quando os filmes chegavam às telonas. Aqueles assobios, gaitas e percussões difíceis de classificar viraram símbolo não só do dito "western spaghetti", como de todo o cinema de bangue-bangue. Até hoje, quando alguém se arrisca a filmar um longa-metragem do gênero, a música sempre presta algum tipo de tributo ao que o italiano inventou nos idos de 60.

Nesse período, especialmente na virada para a década de 70, Morricone chegava a assinar vinte trilhas de filmes num só ano. A sua genialidade também compreendia essa capacidade de abraçar diversos trabalhos em sequência, sempre tendo sua amada esposa Maria como a primeira ouvinte, que determinava se a criação estava aprovada ou não. O autor passou a compor para todo tipo de filme e só não assinou a trilha de Laranja Mecânica (1971) porque Sergio Leone mentiu para Stanley Kubrick, dizendo que Morricone estava ocupado com um filme de sua lavra.

Ennio Morricone foi reconhecido com um Oscar pela totalidade de sua obraO maestro italiano foi reconhecido com um Oscar pela totalidade de sua obra (Foto: Divulgação Prime Video)

Nos anos 80, o maestro desacelerou o ritmo frenético de produção e pariu trilhas mais eruditas e emotivas, como as de Era uma vez na América (1984) e A Missão (1986). O reencontro com o faroeste se deu graças a Quentin Tarantino e o seu Os Oito Odiados (2015), pelo qual Morricone ganhou seu primeiro Oscar numa disputa – ele já tinha recebido um honorário pelo conjunto da obra, quase como um pedido de desculpa da Academia por ter negligenciado suas trilhas por tantas décadas.

Roqueiros como Bruce Springsteen, Mike Patton (Faith No More) e James Hetfield (Metallica) aparecem para mostrar que a influência de Morricone foi muito além das telas de cinema e para deixar o documentário mais acessível. Ennio, o Maestro é uma grande ode a um trabalhador incrivelmente talentoso, que devotou sua vida à música e deixou uma marca indelével na cultura pop que perdurará por anos a fio. O hiperbólico Tarantino chega a comparar o italiano com Mozart e Beethoven. Mas Morricone humildemente afirma que só depois de 200 anos é que a gente pode atestar se alguém está no mesmo patamar de tais gigantes. Esperemos, portanto, dois séculos para confirmar que Tarantino está certo.

  • Ennio, o Maestro
  • 2021
  • 156 minutos
  • Indicado para maiores de 14 anos
  • Disponível no Prime Video

VEJA TAMBÉM:

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.