“A vida de alguém é limitada; a honra e o respeito duram para sempre”, escreveu o samurai Miyamoto Musashi no século XVI. Uma das principais referências no mundo das artes marciais e da estratégia no Japão, ele era membro do clã Tokugawa, responsável por instaurar o período de xogunato no país, uma espécie de governo militar da era feudal, entre 1603 e 1868. Isso só foi possível graças a dezenas de batalhas sangrentas entre os daimiô (senhores de terra) que antes viviam harmoniosamente sob um mesmo comando. Esse período rico da história do Oriente é o principal combustível criativo para Xógum: A Gloriosa Saga do Japão, minissérie de dez episódios do Disney+.
Baseado em Shōgun, romance histórico do escritor britânico James Clavell, o roteiro transforma o verdadeiro Tokugawa Ieyasu no personagem Yoshi Toranaga, um daimiô calculista e honrado que se prepara para instaurar seu xogunato. Quando o espectador o conhece, é em um momento tenso: o conselho de regentes do Japão, que teme a ascensão de Toranaga, quer que ele seja destituído de seu poder. O senhor de terras está praticamente em cativeiro – “praticamente” pois o respeito que seus oponentes têm por ele fazem com que não perca as regalias merecidas por um lorde de sua estatura. Toda a lida entre os poderosos é repleta de cerimônias tradicionais e conversas respeitosas, algo bastante admirável para quem assiste do Ocidente.
Em paralelo, também conhecemos o personagem John Blackthorne, um navegador inglês que, ao se tornar o primeiro de sua terra a chegar ao país oriental, acaba capturado e preso pelos japoneses. É nesse polo que o roteiro ganha mais ação e momentos divertidos, causados principalmente pela diferença nos costumes entre Blackthorne e os samurais, como o fato do europeu não gostar de tomar banho.
Toranaga e Blackthorne são os protagonistas que levam a história adiante. O inglês é reconhecido por sua experiência naval e se torna um importante aliado do daimiô, que passa a usar estratégias de Blackthorne para pegar de surpresa os inimigos tão acostumados com a forma japonesa de lidar com guerras.
Imersão na cultura samurai
Xógum: A Gloriosa Saga do Japão tem conquistado fãs pelo seu roteiro forte, que traz o mesmo tipo de intrigas e tramoias vistas em sucessos como Game of Thrones e Vikings. Outra característica que mantém as pessoas grudadas na tela é a atenção aos detalhes. Não só as roupas e os cenários são bastante convincentes, mas todo o contexto cultural daquela época.
Os samurais, por exemplo, seguem à risca o código de honra deles. Tanto que, logo no primeiro episódio, o espectador já fica abalado com a ocorrência de um seppuku, o suicídio ritualístico cometido pelos nobres guerreiros quando caem nas mãos de inimigos ou cometem uma grave ofensa a seus mestres. Após este último caso, um jovem do exército de Toranaga pede para se matar e, consequentemente, condena seu filho primogênito, ainda bebê, à morte. O momento é chocante e infeliz, mas um retrato muito fidedigno e cru daquela época.
Com Blackthorne, um adepto do protestantismo, aprendemos como padres jesuítas já haviam levado o catolicismo ao Japão e estabelecido importantes rotas de comércio. Neste núcleo da história de Xógum, também entendemos um pouco da disputa histórica entre as duas visões cristãs e o risco que a chegada do navegador protestante significava para a missão dos portugueses.
Essa imersão completa na história dá mais cores à paleta disponível para a criação do roteiro. Acima de tudo, faz com que o espectador possa conhecer fatos bastante curiosos enquanto assiste a um produto de altíssima qualidade.
Não por acaso, o produto levou 18 prêmios no Emmy de 2024, ocorrido no último domingo (15), tornando-se a minissérie mais laureada na história da premiação. Xógum: A Gloriosa Saga do Japão ganhou alguns dos principais reconhecimentos, como Melhor Série de Drama, Melhor Ator Principal em Série Dramática, Melhor Atriz Principal em Série Dramática e Melhor Direção em Série Dramática.
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