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 | Arquivo da família/
| Foto: Arquivo da família/

Uma infância bucólica em companhia de galinhas de estimação, cachorros, árvores de todos os tipos e de uma vizinhança onde todos se conheciam por nome e sobrenome. Assim cresceu Olga Kolody Muñoz Ferrada, que morreu em dezembro do ano passado, aos 102 anos.

Esse início de desenvolvimento como pessoa na cidade natal, Três Barras (SC), marcou seu jeito de ser durante seu mais de um século de vida. Manteve amizades daquela época e, com exímia memória, lembrava detalhes que ficaram há quilômetros de distância. A irmã mais velha, Helena Kolody, usou essas lembranças para criar pequenos relicários de memórias, seus poemas e haicais. Já Olga utilizou-as de modo a manter laços duradouros com quem compartilhou um pedaço de vida com ela.

O pai trabalhava com contabilidade em uma indústria da região, uma colônia de imigrantes da Ucrânia, país de onde veio ainda muito jovem. A mãe, que chegou ao Brasil um pouco mais velha, depois de ter estudado no local de origem, casou-se com ele e gerou quatro filhos, que tinham como principal responsabilidade estudar bastante.

A fim de prosseguir com os estudos, a família se mudou para Curitiba. As três filhas se tornaram professoras na cidade e criaram um círculo compartilhado de amizades na área. Olga lecionava artes e tinha habilidade em produções manuais, gostava especialmente de bordar, mas quando a vista começou a ficar prejudicada, nos anos 80, passou a se dedicar mais ao crochê. Presenteava a família com tapetes e bolsas feitos por suas mãos.

Foi em um trem internacional de passagem pelo estado nos anos 40 que Olga conheceu seu futuro marido, o astrônomo chileno Carlos Muñoz Ferrada, conhecido por anunciar terremotos de grande impacto na América Latina. O casamento de cerca de quatro anos foi preenchido com frequentes viagens internacionais por causa do trabalho com astronomia. Dois passaportes recheados de carimbos documentam visitas (ou moradias) à Nicarágua, Colômbia, México, El Salvador e outros países das Américas.

As visitas a sítios arqueológicos permitiram que Olga exercitasse sua sede de conhecimento e que continuasse consumindo livros sobre os temas que a interessavam, como arqueologia, culturas latinas antigas e esoterismo. A biblioteca das irmãs – independente de breves saídas, a mãe e as filhas sempre moraram juntas – tinha uma divisão sutil entre os livros de interesse específico de Olga, mesclados com prosas densas, como Thomas Mann e James Joyce, e a poesia que Helena consumia, sua adorada Cecília Meireles e outros clássicos brasileiros.

A confiança criada entre as duas era sem igual. Primeira leitora do que Helena escrevia, a opinião forte e sincera de Olga era valorizada pela poeta. Talvez por perceber na irmã tamanha concretude de personalidade, Helena tornou Olga uma espécie de guardiã de sua obra nos 13 anos que separaram a morte das duas. Ela recebia estudiosos de literatura, jornalistas e falava com carinho da poesia que muitas vezes tinha como essência vivências que as irmãs tiveram juntas.

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