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Seminário

A esquerda enfrenta a crise financeira

Especialistas presentes a evento organizado pelo governo estadual na semana passada não têm dúvida: é hora da nova virada de mesa no pensamento econômico mundial

Ao organizar o seminário "Crise: Rumos e Verdades" – que reuniu mais de 30 especialistas em sete mesas de discussão durante a última semana em Curitiba –, o governador Roberto Requião demonstrou que vê a turbulência dos últimos meses como uma janela aberta para mudanças no sistema econômico. Faz sentido. Foi uma crise profunda no coração do capitalismo, no fim da década de 70, que levou à última virada de mesa intelectual com impacto global. Naquela época, o mundo rico via suas economias paralisadas por uma inflação persistente, alimentada por ganhos salariais obtidos por sindicatos poderosos e por dois choques nos preços do petróleo. A virada veio com uma retomada liberal que pregou a desregulamentação das finanças, inventou o termo privatização e acelerou a integração de mercados.

O seminário de Curitiba tentou fazer uma síntese do pensamento de esquerda, crítico da retomada liberal e que transformou o termo "neoliberalismo" em saco de pancadas preferido. Para a maioria dos palestrantes, vivemos hoje os últimos dias do modelo neoliberal, que levou à desregulação dos mercados e permitiu o surgimento de instrumentos exóticos (e "tóxicos") de financiamento nos EUA. Não escaparam das críticas os bancos centrais, que não fiscalizaram os agentes de mercado, e as agências de risco que, bem, não avaliaram os riscos de forma correta.

Esse diagnóstico não é muito diferente do que até economistas mais à direita têm escrito. A diferença é que as idéias apresentadas em Curitiba levam a crer que este é o momento de os governos intervirem – não só para salvar o mundo da recessão, mas também dos mercados. É um ponto de vista que prega a regulação dura dos agentes financeiros e, em variações mais intervencionistas, o retorno do Estado como o planejador dos rumos econômicos. "É preciso ressuscitar o papel do setor público. Não só de investimentos em infra-estrutura, criação de empregos e no social, o que é importante. Mas o setor público precisa pensar numa nova arquitetura financeira internacional", disse Alex Izurieta, secretário sênior de Relações Econômicas da Organização das Nações Unidas (ONU).

Brasil

O seminário também discutiu os efeitos da crise sobre o Brasil. A percepção dos debatedores é a de que o crescimento do país vai desacelerar. "A expansão será menor e terá efeitos sociais. Com crescimento abaixo de 4,5%, não vamos criar empregos para todos os que entram no mercado de trabalho", observou o economista Márcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea).

Em geral, os economistas brasileiros presentes ao evento, da corrente chamada de desenvolvimentista, defendem a combinação de controles de capitais e juros baixos. Além disso, pedem maior investimento do governo em obras de infra-estrutura e em estatais. "Um projeto nacional tem de combinar uma frente de expansão conjunta entre investimento público e privado", defendeu o economista Carlos Lessa, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Síntese

Depois de 30 anos no lado da crítica, essa corrente sintetizada no seminário tem a missão agora de se adaptar à condição de fonte de idéias para um mundo que viu benefícios na liberalização: afinal, a crise foi precedida por um período de enorme crescimento econômico global. As economias estão muito mais interligadas do que antes e a pregação de saídas nacionalistas, como a restrição ao fluxo de capitais, pode causar mais mal do que bem. Mas a chance de uma nova virada de mesa, sem dúvida, existe.

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