
Se alguém ainda tinha dúvidas sobre o dinamismo da economia asiática, a crise atual veio provar que ela caminha para liderar o crescimento econômico global. Os países que os especialistas classificam como "Ásia emergente" que engloba China, Índia, Coreia do Sul, Indonésia, Cingapura e outras nações com economias emergentes parecem ter saído da tormenta econômica global ainda no segundo trimestre deste ano, quando sua expansão anualizada chegou perto de 10%. Na semana passada, a China anunciou que sua produção industrial subiu 12,3% em agosto, na comparação com o mesmo mês do ano passado.
O crescimento acelerado é resultado de uma combinação de políticas de estímulo fiscal com uma inesperada resistência do consumo. O maior pacote de gastos públicos veio da China, com mais de US$ 500 bilhões, mas outros países da região usaram fórmula semelhante. A Coreia, por exemplo, colocou US$ 20 bilhões em projetos para superar a crise. A Indonésia está gastando US$ 6 bilhões. O resultado tem sido tão forte que as consultorias já estão revisando suas projeções para a região. Há quem aponte que a China terá crescimento acima de 9% e que a expansão na Índia passe de 6%. Na média, a Ásia emergente deve crescer mais de 5,5%. Para uma crise só comparável com a depressão da década de 30, são números animadores.
Por trás da reação rápida na Ásia está uma discussão entre economistas que só será resolvida com o tempo. Há quem considere o crescimento asiático como um boom passageiro, gerado por estímulos fiscais insustentáveis e a recomposição de estoques que ficaram baixos demais após os cortes de produção do fim de 2008. Em algumas análises, porém, volta a aparecer o termo "descolamento", ou um comportamento independente entre economias emergentes e desenvolvidas. A certeza só deve aparecer em 2010, quando a demanda nos países ricos ainda estará fraca e os pacotes de estímulo estarão no fim.
Brasil
A retomada asiática, embora não substitua completamente a demanda dos países desenvolvidos, é positiva para a economia brasileira. "Países sob a influência da economia chinesa têm perspectiva mais positiva. É o caso do Brasil", diz a economista Monica de Bolle, da consultoria Galanto. Neste ano, a China se tornou o maior importador de produtos brasileiros. Foram US$ 12,4 bilhões no período de janeiro a julho, uma alta de 25% em relação ao mesmo período de 2008. O país ultrapassou os Estados Unidos, cujas compras caíram de US$ 15,8 bilhões para US$ 8,4 bilhões, e a Argentina, que neste ano importou US$ 5,9 bilhões, 42% a menos do que no ano passado.
O único problema da ascensão asiática é que o Brasil tende a exportar produtos com menor valor agregado para países como China e Índia do que para parceiros tradicionais, como Estados Unidos e Argentina. "Essa é uma mudança à qual o Brasil precisa se adaptar. Nossa indústria terá de ser mais competitiva, fazer coisas por preços menores e qualidade maior para evitar ser um fornecedor apenas de matérias-primas", diz Evaldo Alves, professor da Escola de Administração da FGV.
Ciclo longo
A emergência da Ásia é um fenômeno que ganhou visibilidade no fim da década de 70, quando a China entrou na rota da abertura econômica e outras economias davam sinais de que tinham alto potencial de crescimento. A tendência é que a região se firme como centro do capitalismo. "Mesmo antes da crise já se percebia uma mudança do eixo do crescimento global do Atlântico Norte para a Ásia", afirma Luís Antônio Paulino, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) especialista em economia internacional.
Mudanças assim são raras. A emergência asiática é comparável a quatro fatos históricos. O primeiro foi a consolidação de Veneza como o centro do capitalismo incipiente, antes do século 15. Com o tempo, o núcleo econômico migrou para a Holanda, onde apareceu um sistema financeiro forte e que impulsionou a era dos descobrimentos. Em seguida, a Inglaterra assumiu o posto hegemônico, ancorada no desenvolvimento de uma indústria forte. A última passagem de bastão ocorreu no século passado, com a emergência dos Estados Unidos como força econômica dominante. "A crise debilitou a posição dos EUA e parece ter acelerado a ascensão da China", diz Paulini. "Mas é um processo lento, ainda longe do fim."



