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O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: mercado espera que BC corte a Selic em agosto; ministro queria queda já em março.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad: mercado espera que BC corte a Selic em agosto; ministro queria queda já em março.| Foto: Lula Marques/Agência Brasil

A julgar pelas expectativas do mercado financeiro, não será desta vez que a taxa básica de juros vai cair. O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central conclui sua reunião nesta quarta-feira (21) e, conforme projeções coletadas pelo próprio BC, bancos e consultorias acreditam que a Selic será mantida no patamar de 13,75% ao ano.

Segundo os mesmos economistas, o início do corte dos juros será na reunião de agosto, com uma baixa de 0,25 ponto porcentual. O cenário, hoje, é mais favorável que o das reuniões anteriores. Porém, ainda persistem alguns riscos no horizonte.

O principal fator para a queda dos juros é que as expectativas de inflação estão em queda, puxadas principalmente por alimentos e bens industriais. Outros fatores que podem colaborar para um corte nos juros são:

  • a possibilidade de desaceleração da economia nos próximos meses;
  • a redução de ruídos na área econômica; e
  • o ambiente externo mais benigno, que se reflete em uma taxa de câmbio mais barata.

Mas também há sinais que mostram que o Copom pode continuar com uma postura mais cautelosa e jogar a redução da taxa Selic mais para a frente. Entre eles, estão:

  • a possibilidade de a atividade econômica permanecer aquecida, como já ocorreu para além das expectativas nos últimos meses;
  • uma deterioração das contas públicas, motivada por uma política mais expansionista do governo;
  • eventuais impactos da reforma tributária; e
  • redução do diferencial de juros entre Brasil e outros países, o que poderia atenuar a valorização do real frente ao dólar.

Um ponto de atenção é a reunião do próximo dia 29 do Conselho Monetário Nacional (CMN), formado pelos ministros da Fazenda e Planejamento e pelo presidente do BC, que vai definir a meta de inflação para 2024 em diante.

O Itaú aponta que o cenário mais provável é a manutenção da meta em 3% e da banda de tolerância em 1,5 ponto percentual. Outras modificações podem ser contempladas, aponta o banco, como a transformação do regime meta apurada a cada fim de ano para uma "meta contínua".

“Uma mudança no horizonte para o cumprimento da meta e/ou ampliação da banda de tolerância em torno dela seriam negativas. A decisão do CMN deve impactar a formação das expectativas de inflação e, em última instância, a condução da política monetária”, cita relatório do banco.

Nesta segunda (19), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a cobrar a redução da taxa Selic e criticar o presidente do BC, Roberto Campos Neto. “Apenas o juro precisa baixar, porque não tem explicação. O presidente do Banco Central precisa explicar, não a mim, porque eu já sei por que ele não baixa, mas ao povo brasileiro e ao Senado.”

No mesmo dia, questionado por jornalistas sobre a previsão de corte nos juros a partir de agosto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que a queda deveria ter começado antes. "Pra mim, deveria ter sido em março. Vamos ver, vamos aguardar", disse.

Os fatores que contribuem para a redução na taxa de juros

Veja, a seguir, quatro fatores que podem contribuir para uma redução na taxa de juro:

1. Menor pressão inflacionária

O ponto médio das expectativas para o IPCA de 2023 vem caindo há cinco semanas, período em que recuou de 6,03% para 5,12%. As apostas para 2024 – período ao qual o BC está mais atento no momento – recuaram de 4,13% para 4%. E as de 2025 e 2026, de 4% para 3,8%.

Os preços da comida estão mais comportados devido à supersafra, estimada em 315,8 milhões de toneladas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), e à queda nos preços das commodities agrícolas.

Os preços internacionais caíram, em maio, 2,6% em relação a abril e 22,1% em comparação a março de 2022, quando foi registrado o pico, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês).

Também se espera inflação menor dos bens industriais. A projeção da XP para esse grupo cedeu de 2,9% para 2,6%, motivada pela valorização do real frente ao dólar. A cotação da moeda norte-americana caiu 8% desde o início do ano.

Também contribuem para a queda das expectativas de inflação as reduções nos preços dos combustíveis, a menor inércia inflacionária menor para o próximo ano e a percepção do mercado de que diminuíram as chances de mudança na meta de inflação.

2. Possibilidade de desaceleração do PIB

O PIB surpreendeu ao crescer 1,9% no primeiro trimestre, e o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) cresceu 0,56% em abril. Apesar disso, as expectativas são de uma desaceleração no ritmo de crescimento nos próximos meses, o que reduziria as pressões de demanda sobre a inflação.

Segundo o IBGE, o PIB cresceu 3,3% em 12 meses até março. Para o ano de 2023, a mediana das projeções do boletim Focus, do BC, aponta para uma alta de 2,14%.

O setor de serviços deverá ser um dos responsáveis pelo menor impulso da atividade econômica. Analistas do banco MUFG Brasil apontam que a atividade deverá ter dificuldades para se expandir em função da política monetária ainda restritiva, do endividamento das famílias e do crescimento da inadimplência, que afetam as condições de crédito.

A indústria é outro freio. O PIB do setor encolheu pelo terceiro trimestre seguido e a produção recuou mais que o esperado em abril – a queda acumulada no ano é de 1% em relação a igual período de 2022.

3. Menos ruídos em relação à política econômica

Os ruídos em relação à política econômica diminuíram nos últimos meses, contribuindo para a redução do risco-país. O principal indicador – o credit default swap (CDS) de cinco anos – caiu de 223 pontos, em maio, para 185 pontos, no último dia 16. O instrumento é uma espécie de seguro contra calotes e é a primeira vez deste setembro de 2021 que cai abaixo dos 200 pontos.

A agência de classificação de risco S&P, no dia 20, mudou de estável para positiva a perspectiva do risco soberano brasileiro. A empresa afirmou que o arcabouço fiscal pode resultar em endividamento menor que o esperado até então.

Mesmo criticada por economistas que acompanham as contas públicas, a proposta de marco fiscal ajudou a reduzir parte da incerteza vinculada à política fiscal, afastando cenários extremos de crescimento da dívida pública – atualmente em 73,2% do PIB, segundo o BC. Também existe a percepção de avanços na reforma tributária.

O Copom destacou na ata da última reunião que a tramitação e implementação do arcabouço fiscal será monitorada.

4. Ambiente externo mais favorável

O ambiente externo também está menos complicado, embora a União Europeia (UE) tenha aumentado os juros pela oitava vez seguida e precise, segundo o FMI, de juros ainda mais altos e uma política fiscal mais rígida.

Nos EUA, por outro lado, o Federal Reserve (Fed, o BC local) interrompeu ao menos temporariamente o aumento dos juros. Jerome Powell, presidente da instituição, disse que não hesitará em aumentar as taxas se necessário.

A avaliação do economista Francisco Nobre, da XP Investimentos, é de que o ciclo de aperto monetário das economias desenvolvidas está chegando ao fim e os preços das commodities permanecem relativamente elevados, em que pese a correção baixista em produtos agrícolas.

“Acreditamos que o dólar enfraquecerá nos próximos meses, ainda que moderadamente, beneficiando assim as moedas de outros países desenvolvidos e de economias emergentes”, diz.

Ele destaca que esse ambiente positivo deve persistir, apesar da necessidade de monitorar de perto os riscos geopolíticos.

Os fatores que atrapalham a redução no juro

Veja, a seguir, quatro possibilidades que podem dificultar uma redução da taxa de juros:

1. Economia ainda aquecida

A chance de um aumento maior do PIB é um dos fatores jogam contra a queda dos juros, por manter a demanda aquecida.

A projeção atual do BC é de um crescimento de 1,2% neste ano, quase um ponto porcentual abaixo da expectativa mediana do mercado financeiro. O avanço mais forte, segundo o Itaú, "pode levar também a uma pressão altista na trajetória de inflação esperada".

Embora alguns indicadores tenham perdido fôlego em abril, o banco destaca que o mercado de trabalho ainda resiste: "O Caged de abril apontou para a criação de 180 mil empregos formais, A taxa de desemprego sem ajuste sazonal recuou de 8,8% em março para 8,5% em abril, mostrando um mercado de trabalho ainda forte”, diz relatório.

O Bradesco, enquanto isso, afirma que “os dados reforçam uma dinâmica ainda positiva vinda do consumo das famílias, o que deve levar a algum crescimento do PIB em relação aos três primeiros meses do ano”.

2. Deterioração das contas públicas

Outro foco de preocupação dos economistas e do Copom é com a adoção de uma política fiscal mais expansionista por parte do governo, o que pressionaria a inflação e pioraria expectativas para as contas públicas.

As despesas de consumo da administração pública cresceram 0,3% no primeiro trimestre frente ao anterior, segundo o IBGE. É o terceiro movimento consecutivo de alta.

Há também uma tendência de redução do superávit primário (que não inclui gastos com juros) desde o início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O resultado acumulado dos 12 meses encerrados em abril foi de R$ 56,2 bilhões, ou 0,6% do PIB. É um declínio de 0,9 ponto porcentual em relação a um ano antes.

Segundo a XP Investimentos, a trajetória deve continuar negativa: “Acreditamos que o recuo no preço das commodities e a perda de tração da atividade econômica afetem a arrecadação tributária nos próximos meses”.

Pelo lado das despesas, a corretora lembra que a elevação do salário mínimo e o reajuste salarial aos servidores devem pesar sobre as contas públicas a partir de maio.

3. Diferencial de juros

Um fator que o Copom deve acompanhar com atenção é o diferencial de juros entre o Brasil e o resto do mundo. Juros aumentando lá fora e caindo aqui podem significar a entrada de menos recursos no Brasil, o que pode elevar a taxa de câmbio.

“Com o processo de afrouxamento monetário tendo início na segunda metade do ano, a política monetária brasileira se tornaria uma completa outlier [ponto fora da curva] no cenário global, que ainda se encontra em um processo sincronizado de aperto monetário, principalmente nos EUA e na Europa. Numa situação dessa sem precedentes, o efeito sobre o real brasileiro de estar na contramão da política monetária global poderia ser ainda mais exacerbado”, destaca a Genial Investimentos.

O ponto médio das expectativas para o câmbio ao fim do ano é de R$ 5, segundo o Focus, o que representaria um aumento de 4,3.% em relação à cotação desta terça.

4. Impactos da reforma tributária

Uma ameaça à inflação nos próximos anos pode vir da reforma tributária, aponta a Genial Investimentos. Isto ocorreria devido ao aumento da alíquota média cobrada sobre os serviços sob a vigência do novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

“Para manter a arrecadação tributária constante, os bens, que atualmente são excessivamente tributados, sofreriam uma redução da carga, enquanto os serviços, que atualmente são pouco tributados, sofreriam um aumento de carga”, destaca a corretora.

O rebalanceamento de alíquotas geraria um efeito altista sobre os preços, uma vez que a maior parte da cesta de consumo das famílias é composta por serviços.

“Um desafio adicional para o sucesso da nova estrutura tributária, perante uma carga já elevada e um sistema pouco transparente, seria uma comunicação eficaz por parte do governo e um processo de transição bem feito, sob pena de haver um descontentamento com a reforma”, ressalta a equipe de análise da corretora.

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