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Macroeconomia

Capitalismo como antigamente

Novo ambiente da economia brasileira, com juros mais baixos, vai exigir uma reforma no modo de fazer negócios, com reflexos para grandes empresas e pessoas físicas

“Antigamente, as pessoas ficavam de joelhos para o FMI. Vocês viram que engraçado: esta semana eu emprestei US$ 10 bilhões para o FMI. O povo está com a auto-estima elevada, ninguém tem mais vergonha de dizer que é nordestino, que é negro ou que é brasileiro.” Luís Inácio Lula da Silva, presidente da República, sobre as mudanças na economia brasileira |
“Antigamente, as pessoas ficavam de joelhos para o FMI. Vocês viram que engraçado: esta semana eu emprestei US$ 10 bilhões para o FMI. O povo está com a auto-estima elevada, ninguém tem mais vergonha de dizer que é nordestino, que é negro ou que é brasileiro.” Luís Inácio Lula da Silva, presidente da República, sobre as mudanças na economia brasileira (Foto: )

Agora é oficial: estamos em território desconhecido. As notícias da semana passada comprovam isso – a taxa básica de juros está abaixo de 10% ao ano, o país emprestou US$ 10 bilhões ao Fundo Monetário Internacional e ainda descobriu que a economia encolheu menos do que se esperava. Nem mesmo o presidente Lula, que costuma repetir em seus discursos que "nunca antes na história deste país" as coisas foram tão bem, poderia imaginar cenário tão positivo. Esse bom momento, no entanto, traz um desafio: como proceder no novo ambiente que está surgindo?

Em décadas de crises econômicas emendadas uma à outra, cidadãos, empresas e o próprio governo se acostumaram com práticas que não funcionam mais no Brasil diferente com que se deparam agora. O grande divisor de águas é a queda nos juros. Este foi um processo com altos e baixos nos últimos tempos, dos 45% ao ano vigentes em períodos de 1997 e 1999 aos atuais 9,25%. Não há brasileiro que não tenha defendido sua redução – e isso inclui muitos que obtiveram grandes lucros com as taxas de juros.

Isso porque, a cada decisão de investimento que precisam tomar, os empresários têm de buscar a alternativa que lhes dê maior rentabilidade. Muitas vezes, essa bússola de investimentos apontava para o mercado financeiro – não havia perspectiva futura que pudesse ultrapassar o rendimento de uma aplicação. "Os juros altos barraram o crescimento econômico durante muito tempo porque era mais tranquilo aplicar o lucro de uma empresa na renda fixa do que reinvestir na própria atividade", diz o professor José Guilherme Silva Vieira, da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Assim, a capacidade de produção não crescia, mas os ganhos do controlador pingavam na conta corrente, do mesmo jeito.

Essa equação mudou. "Os juros baixos fazem com que o dilema produção versus aplicação financeira tenda para a produção real", observa Silva Vieira. "Eles vão fazer com que o país redescubra o capitalismo verdadeiro, que está baseado no empreendedorismo e na capacidade de correr riscos."

As apostas financeiras das empresas também deverão ser mais modestas. "Não dá mais para achar que dá para ganhar dinheiro com derivativos", diz o economista Fabio Tadeu Araújo, sócio da empresa de consultoria Brain Bureau de Inteligência Corporativa. Os diretores financeiros das companhias devem ter aprendido uma lição com casos como o da Sadia e da Aracruz, que no ano passado foram obrigadas a declarar bilhões de reais de prejuízo por tropeços na gestão de aplicações financeiras.

Outra estratégia que deve cair, vítima das mudanças, deverá ser a ênfase das empresas de varejo nas vendas financiadas. As grandes empresas do setor criaram na última década subsidiárias na área financeira, ou ainda associaram-se a companhias do segmento, com bons resultados. No ano passado, por exemplo, o banco Investcred, sociedade entre o grupo Ponto Frio e o Unibanco, obteve lucro de R$ 14 milhões. O número equivale a mais de um terço dos ganhos da rede de lojas, que registrou R$ 32 milhões de lucro.

Um sinal de que há mudanças por vir nessa área foi a venda do banco Ibi, que pertencia à rede de lojas C&A, ao Bradesco, por R$ 1,4 bilhão. "Essas financeiras não têm a expertise que os bancos têm. Se não venderem outros produtos financeiros, não terão rentabilidade", observa Araújo.

Muda tudo paraos investidores,mas surgem oportunidades

A ideia de um "choque de capitalismo" serve também para as pessoas físicas. Se, nos últimos tempos, qualquer valor investido em renda fixa poderia dobrar em cinco ou seis anos, agora a perspectiva é outra. "Ou os aplicadores se habituam a uma remuneração mais baixa ou aceitam correr riscos", diz o professor Carlos Ilton Cleto, do FAE Centro Universitário.

"Correr riscos", nesse caso, significa buscar outras formas de ganhar dinheiro. Pode ser investindo em ações (que acumulam ganho de 42,76% no ano, até agora), abrindo um negócio ou ainda apostando na valorização de outros ativos, como os imóveis. "Ganhar sem fazer nada é algo que não vai acontecer mais", resume Fábio Araújo, da Brain.

Felizmente, novas oportunidades surgem com essa transformação. Uma delas diz respeito ao investimento em imóveis. "É um dos melhores momentos para comprar um imóvel, seja para moradia ou para investimento", diz Araújo. Os financiamentos estão mais fáceis e, já que os juros estão em queda, mais baratos.

O rendimento dos aluguéis também se tornou mais atrativo, na comparação com o investimento financeiro. O aluguel costuma render ao proprietário cerca de 0,7% do valor total do imóvel, a cada mês. Antes, esse era um resultado fraco – um fundo de investimentos podia render 1% ou mais. Agora, eles estão empatados. Só que a tendência dos juros é de queda e a dos imóveis, de alta.

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