Nascida principalmente do processo de industrialização do país até a década de 70, a classe média brasileira sofreu drástico empobrecimento e perda de seu antigo padrão de vida nos últimos anos, por conta do pífio crescimento da economia e do ajuste do mercado de trabalho. Entre 1980 e 2000, cerca de 7 milhões de pessoas perderam seus empregos e, sem alternativa para regressar ao mercado formal de trabalho ou abrir um negócio próprio, deixaram de compor a classe média no país.
A estimativa é do economista Marcio Pochmann, da Unicamp, que escreveu o livro "Classe Média - Desenvolvimento e Crise". O trabalho, que demorou 16 meses para ficar pronto, contou ainda com o trabalho de outros três economistas: Alexandre Guerra, Ricardo Amorim e Ronnie Silva. Pelos dados publicados no livro, em 1980 a classe média chamada não-proprietária ou assalariada respondia por 31,7% da população economicamente ativa ocupada nas grandes cidades. Vinte anos depois, essa participação caiu para 27,1%.
A diferença entre os dois pontos (1980 e 2000) corresponde, em números absolutos, à demissão de 10,1 milhões de trabalhadores. Destes, 7 milhões caíram no estrato social do país, enquanto o restante passou a trabalhar por conta própria ou abriu uma empresa _ e, neste caso, ou se mantiveram na classe média ou até tiveram ascensão social.
- O ajuste do mercado de trabalho se deu, principalmente, nos cargos historicamente ocupados pela classe média, como gerentes de empresas, professores, administradores e cargos da burocracia pública e privada - disse Pochmann.
Efeitos
Essa mudança provocou dois efeitos importantes. O primeiro deles é que aumentou a desigualdade dentro da própria classe média. A participação da chamada classe média-baixa (professores, lojistas, vendedores, entre outros) passou de 44,5% do total do estrato, em 1980, para 54,1% em 2000. A da classe média-média (ocupações técnico-científicas, postos-chaves da burocracia pública e privada) caiu de 32,2% para 23,1%, enquanto a da classe média-alta (executivos, gerentes, administradores) apresentou certa estabilidade (de 23,2% para 22,8%).
Além disso, as novas gerações enfrentam sérias dificuldades para alcançar ou manter os padrões semelhantes de emprego e renda dos pais, o que coloca em xeque seu antigo status social baseado no consumo diferenciado. Assim, as despesas com itens como habitação e transporte tiveram um salto entre 1987 e 2003, período em que os gastos com recreação e cultura e aumento do ativo (através de aplicações financeiras ou aquisições de bens como imóveis e veículos) perderam espaço no orçamento familiar. Em 1987, habitação respondia por 17,6% do consumo da classe média. Em 2003, subiu para 29,5%. Transportes foi de 8,7% para 16,9%.
- O consumo, pedra angular de diferenciação da classe média, passa a sofrer reveses que parecem levar a uma popularização do seu padrão de gastos - escrevem os economistas no livro.
57,8 milhões de pessoas
Com base em dados do censo do IBGE, os pesquisadores afirmam que o Brasil tem pouco mais de 15,4 milhões de famílias de classe média, o equivalente a 57,8 milhões de pessoas. A valores de novembro de 2005, a renda familiar per capita desse segmento social oscila entre R$ 263 (1,7 salário mínimo per capita) a R$ 2.928 (19,4 salários-mínimos). Há uma concentração nos grandes centros urbanos, reflexo da concentração da industrialização do país. Das famílias de classe média, 57,2% estão na região Sudeste e 18,3%, na região Sul.
A cidade de São Paulo lidera o ranking, com 1.728.955 de famílias de classe média, o correspondente a 11,2% do total no país e a 33,2% do total no Estado. Em segundo lugar, o município do Rio tem 971.187 famílias de classe média. Isso equivale a 6,3% do total no país e a 53,1% no Estado. O brasileiro de classe média se destaca ainda pela maior escolaridade. Desse estrato, 2,7% nunca freqüentaram uma escola, contra 12,3% do total da população do país e 18,5% deles têm curso superior ou pós-graduação concluída, acima dos 9,5% da média geral do país.



