Após quase 13 anos de tramitação no Congresso Nacional, o projeto que revoga o Código Florestal de 1965 e institui novas regras sobre o tema foi aprovado sob o calor dos embates apaixonados dos que lutam pela preservação das florestas, de um lado, e dos que buscam meios de ampliar a produção rural, de outro. O projeto aprovado (PL 1876/1999) segue agora para sanção presidencial.
É desanimador constatar que os discursos ainda sejam propagados sem o conhecimento técnico e legal sobre o próprio texto aprovado. A opinião pública vem sendo induzida unicamente por ideias difundidas de forma ampla e descuidada pelos meios de comunicação, seja utilizando o termo "desmatador" para referir-se a todo e qualquer produtor, seja enquadrando todos os que lutam por uma maior proteção ao meio ambiente no rol dos "ecochatos".
Toda essa discussão traz mais dúvidas que luz, de forma que não se consegue definir nem mesmo o verdadeiro objetivo de um código florestal. Seria buscar uma efetiva proteção aos recursos naturais, em detrimento do desenvolvimento econômico na área rural, ou seria uma forma de contribuir ao crescimento e aprimoramento da produção agrícola com regras mínimas de proteção ambiental? O objetivo é proteger o quê, de quem e para quem? Há que se definir se o bem a ser amparado pela lei é a natureza, por si mesma, ou o homem, que tem que se utilizar dos recursos ambientais para que possa viver dignamente.
Há uma maneira muito mais sensata de se analisar o tema do que simplesmente posicionar-se do lado dos "ambientalistas" ou dos "ruralistas". Se o meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, nos termos do artigo 225 da Constituição Federal, há de se atentar que, por outro lado, são direitos sociais a alimentação, o trabalho e a garantia do livre exercício das atividades econômicas, dentre elas a produção de alimentos que possa suprir as necessidades de toda a população.
É de se destacar que o texto aprovado tem o claro intuito de oportunizar aos produtores a regularização de suas atividades, tirando-os da ilegalidade. O objetivo, ao contrário do que amplamente se propaga na mídia em geral, não é anistiar desmatadores ou incentivar o desmatamento, mas sim trazer a norma à realidade, para que não permaneçamos com um lindo texto de lei na gaveta e sua total inobservância na prática. Não há, por parte do novo código, qualquer flexibilização às regras de conservação futuras.
As margens de rios, consideradas Áreas de Preservação Permanente (APP) devem contar com mata ciliar de 15 metros, em caso de rios de até 10 metros de largura, que deverá ser recomposta caso inexistente. A crítica que se faz ao texto aprovado é que nada dispõe a respeito dos rios com mais de 10 metros, gerando a possibilidade de diversas interpretações a esse respeito. Para quem não desmatou e para as situações surgidas após a publicação da nova lei, as faixas de proteção variam de 30 a 500 metros em torno dos rios, lagos e nascentes (conforme seu tamanho) e encostas de morros.
O produtor poderá, também, incluir a área de APP no cálculo da Reserva Legal, parte da terra que deve ser mantida preservada, variando de 20% a 80% da totalidade do imóvel, dependendo de sua localização (80% em florestas da Amazônia Legal, 35% em cerrado da Amazônia Legal e 20% nos demais casos).
A União, os Estados e o Distrito Federal deverão, no prazo de 1 (um) ano, contado a partir da data da publicação do Novo Código, prorrogável por uma única vez, por igual período, implantar Programas de Regularização Ambiental - PRAs de posses e propriedades rurais, com o objetivo de adequá-las às novas regras. O imóvel rural deverá ser inscrito no Cadastro Ambiental Rural - CAR para que possa aderir ao PRA. Será assinado um termo de compromisso pelo proprietário rural, suspendendo-se as sanções decorrentes de infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008, relativas à supressão irregular de vegetação em Áreas de Preservação Permanente, de Reserva Legal e de uso restrito.
O PRA terá natureza de título executivo, ou seja, o cumprimento das obrigações nele assumidas poderá ser exigido judicialmente, sob pena de voltar a ser imposta a multa ou outra penalidade cuja exigibilidade se encontrava suspensa em razão da assinatura do termo de compromisso. Trata-se, como se vê, de medida de conversão de penalidades em serviços em prol do meio ambiente e não de simples anistia, como vem sendo difundido pela imprensa em geral.
Outra medida prevista no texto aprovado é a permissão de continuidade de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e turismo rural que já existiam em APPs até 22 de julho de 2008. Esses locais serão considerados áreas consolidadas.
O texto legal aprovado, que instituirá o Novo Código Florestal caso assim entenda a Presidência da República, pode não ser o ideal visto que dificilmente seria possível se chegar à conclusão sobre o verdadeiro "ideal" neste caso mas certamente contribuirá para que a norma de proteção às florestas possa ser efetivamente cumprida por aqueles que se utilizam diretamente desses recursos naturais e não fique, como tantas outras leis, apenas no papel.
Geroldo Augusto Hauer, G.A.Hauer & Advogados Associados sócio fundador geroldo@gahauer.com.br
(Colaboração: Fabiana Atallah, G. A. Hauer & Advogados Associados)



