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Engraçado como algumas coisas repercutem. Na terça-feira, em sua participação na Expo Money Curitiba, o economista Luis Carlos Ewald soltou uma frase de efeito: "Se não teve filhos, não tenha. Eles custam até R$ 1,5 milhão". No contexto da palestra, cheia de piadinhas e comentários bem-humorados, o dito não causou estranheza. Ainda mais com ele sublinhando que tem quatro filhos. Mas depois...

O comentário ganhou as conversas pela cidade e deu o que falar nas redes sociais. Repetida, quase sempre, em tom de brincadeira, a frase justificava a opção séria de muitas pessoas de adiar a paternidade/maternidade. Talvez eu esteja ficando velho e mal-humorado, mas acho que tem algumas brincadeiras que, quando repetidas dessa forma, não pegam bem. Essa, em especial, aponta para uma visão de mundo materialista e egoísta, com a qual não posso concordar. Principalmente porque a questão parte de premissas falsas e da manipulação de números com o objetivo de impressionar o interlocutor. Nem deve ser culpa dele, mas de uma ideia que sobrevoa toda a nossa sociedade, e que tende a impor uma visão utilitária sobre as pessoas.

Ewald, que ganhou fama como o "Senhor Dinheiro" do Fantástico, disse que as despesas deflagradas por uma criança vão de R$ 800 mil a R$ 1,5 milhão. O economista não mencionou de onde tirou esse número, mas ele é semelhante a outras estimativas que já vi, cujo foco era o custo estimado para manter uma pessoa do nascimento até a conclusão de um curso superior – algo como 24 anos (ou 288 meses, ao todo). Parece um valor impressionante, mas é exagerado. Faça a conta: os tais R$ 1,5 milhão equivalem a um desembolso de R$ 5.208 por mês, R$ 173 por dia, R$ 1.200 por semana. O pai de alguma criança que você conhece gasta tudo isso?

Pode-se argumentar que as despesas crescem com a idade, em especial no que diz respeito à educação. Isso é verdade. Mas o efeito estatístico do custo baixo dos primeiros anos de vida torna mais difícil chegar a esses números. Nos primeiros meses de vida, o bebê mama de graça na mamãe e ganha presentes da família e dos amigos de seus pais. Os maiores custos começam a aparecer só lá pelos três anos de idade, com a escolinha. Há escola para todos os bolsos, das gratuitas às internacionais. É possível que os pais atinjam os tais R$ 5 mil mensais quando o filhote estiver na faculdade, se ele for fazer um curso caro, como Medicina. Até lá, os gastos serão bem mais suaves.

A conta de Ewald por certo inclui gastos com habitação, e vale a pena falar desse tema separadamente. É natural que uma das primeiras coisas que os casais pensam quando têm notícia de que terão um filho é em uma casa maior, com um quarto reservado ao bebê. Entretanto, o desejo de conquistar espaço está também relacionado ao ciclo de vida e à prosperidade relativa de indivíduos e famílias. Ninguém quer morar apertado por toda a vida. Por isso, não chega a ser incomum encontrar casais sem filhos morando em apartamentos de três dormitórios, em que um deles acaba transformado em escritório e outro em home theater, por exemplo.

Por último, a alimentação. É claro que uma família de três ou quatro pessoas gasta mais em comida do que um casal solitário. Mas aí entra a economia de escala, que se traduz por um antigo ditado popular: "Onde come um português, comem dois ou três". O tempo necessário para cozinhar duas ou quatro porções é, basicamente, o mesmo. O gasto de gás e energia também. E alimentos não são tão caros assim.

Criança, investimento?

Você pode, por outro lado, encarar os filhos como investimentos. Não como uma espécie de INSS, que vai sustentá-lo na velhice (se você pensa assim, melhor pagar um fundo de previdência privada), mas algo maior.

Pense comigo: por que razão nós economizamos? Economizar significa abrir mão de um prazer imediato (a aquisição de um bem ou serviço) em nome de um resultado futuro que lhe dará satisfação maior ou mais duradoura. É em nome dessa satisfação futura que investimos. Assim, você pode entender o investimento como uma modalidade econômica de busca pela felicidade.

Se você seguiu o raciocínio, já sabe onde pretendo chegar. Você pode obter experiências felizes de diversas maneiras, e elas, de certa forma, se assemelham. Viajantes apaixonados (eu me incluo nessa categoria) conhecem a deliciosa sensação de estar diante de uma paisagem inédita. Mas a alegria de estar no mirante da Torre Eiffel é parecida com a de subir ao topo do Empire State, por exemplo. As experiências da paternidade e da maternidade são distintas, mesmo para quem tem várias crianças. E são de longa duração – na verdade, elas nunca terminam, se perpetuam com netos e bisnetos... Nenhum ativo se compara a isso.

Resumindo

Filhos podem, sim, dar despesa. Mas creio que as pessoas deveriam fazer menos contas e brincar mais.

Mudando de assunto...

E o governo aumentou a alíquota de IOF para operações de crédito de pessoa física, de 1,5% para 3%. Diz que é para conter a inflação. Cabe observar que os juros médios atuais são de 118% ao ano, segundo levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac). Mas você acha que quem não liga em pagar quase 120% de juros vai se importar com 1,5% a mais de imposto?

Conclusão: o objetivo não é combater a inflação, é arrecadação.

Até mais!

A coluna volta semana que vem. Até lá, escreva para financaspessoais@gazetadopovo.com.br e envie seus comentários, sugestões e dúvidas.

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