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Financês

Será o ano do macarrão?

O caldo engrossou |
O caldo engrossou (Foto: )

O começo de 2008, o leitor deve se lembrar, foi marcado pelo medo da inflação. O IPCA de maio foi de 0,79%, em junho os índices voltaram a subir forte, os bancos e consultorias começaram alardear que o país poderia ultrapassar a meta de inflação, os juros voltaram a subir. Os alimentos puxavam a fila, e havia nesse movimento dois fatores mais fortes: a demanda crescente do mercado internacional, em especial da China; e o aumento da renda entre os brasileiros. Mas e para 2009, como ficamos?

Os dados da Secretaria de Agricultura do Paraná (Seab) não são muito animadores. Mostram quebras fortes na estimativa de safra para todas as grandes culturas, devido às chuvas irregulares em todo o semestre passado. Chama atenção especial o número previsto para o feijão: quebra de 38,6% na primeira safra, resultando em 374.987 toneladas – 12,5% menor do que a do período 2007/2008. Isso é ruim, porque o feijão foi o segundo produto que mais subiu no ano passado, segundo o IBGE: 65,5%. O Paraná é o maior produtor nacional, e o feijão do Sul do Brasil abastece praticamente todo o país no primeiro semestre.

Mais: o feijão vem subindo de forma consistente no mercado de Curitiba desde julho de 2007. Segundo dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), o preço médio subiu de R$ 1,76, em junho de 2007, para os R$ 4,64 de dezembro.

Trata-se de um produto que provoca um forte efeito psicológico em quem faz as compras da casa, porque está presente em praticamente todos os carrinhos de supermercado. Esse efeito, ao que parece, vai continuar. "O preço médio no varejo ficou durante quase todo o ano passado acima de R$ 4,00, e isso não vai mudar em 2009", diz a agrônoma Margorete Demarchi, do Departamento de Economia Rural da Seab. O impacto maior deve ser sobre o feijão preto, cujas regiões produtoras foram mais fortemente afetadas.

Isso significa que a sensação de preço alto – aquilo que conhecemos, de modo um pouco vago, como "carestia" – vai permanecer em 2009. Mas talvez essa sensação não seja totalmente correta, porque teremos um rearranjo nos preços em geral. E, novamente, os alimentos estarão no epicentro.

Produtos negociáveis no mercado internacional, como milho, soja, açúcar, tendem a cair de preço em 2009. Isso porque os clientes globais importarão menos: EUA e Europa estão em recessão, a China está crescendo bem menos do que no seu auge. Assim, o preço internacional deve cair, arrastando também o daqui. O impacto disso é indireto – o milho, por exemplo, vai influenciar a inflação por sua participação nas rações com que são alimentados os frangos que compramos nas gôndolas refrigeradas –, mas deve ser sentido. E vai equilibrar os aumentos do feijão e de outras mercadorias de consumo local. "Creio que os alimentos devem pressionar menos o bolso do consumidor", arrisca o economista Sandro Silva, do Dieese.

Mas como fugir do feijão caro, se ele é uma das bases da alimentação nacional? Sandro sugere pôr mais água no caldo e trocá-lo por outros pratos. Uma dica: o mercado de trigo vai estar mais amistoso, graças à tal recessão internacional. Isso significa que o preço das massas não deve subir tanto. 2009 talvez seja o ano do macarrão na mesa dos brasileiros.

Pouco peso

Uma última palavra sobre o feijão: seu peso no IPCA (o índice de inflação que serve de referência para a política de metas do governo) é bastante pequeno. "Se o preço dobrar, isso vai implicar em uma inflação de 0,36%", explica Silva, do Dieese.

Desaceleração

Por fim, algo que faz muita diferença na inflação é o crescimento econômico. Quanto mais o país cresce, mais renda as pessoas têm (ao menos em tese; no Brasil isso nem sempre foi verdadeiro), mais elas estão dispostas a consumir e maior é a sua propensão a aceitar aumentos de preço. Mas a perspectiva é de desaceleração, e por isso a inflação tende mesmo a estar mais contida. A correlação aparece nos dados da pesquisa Focus, que o Banco Central faz todas as semanas com as previsões feitas por bancos e consultorias. Há um mês, as instituições projetavam para 2009 um crescimento de 2,4% e um IPCA de 5,02%. Nos dados divulgados ontem, o prognóstico para o PIB era de um aumento mais modesto, de 2%. E o da inflação também recuou, para 4,8%.

Eufemismos

Dias atrás a Sadia informou que faria "paradas técnicas" em algumas de suas unidades no primeiro trimestre de 2009. Parada técnica é o que a Petrobras faz quando paralisa uma refinaria para ajustes industriais. Se alguém para uma fábrica porque o mercado consumidor anda fraco, normalmente se usa a expressão "férias coletivas".

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