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Se por questões políticas, econômicas ou simplesmente diplomacia, o fato é que Brasil recua, enfraquece posição e posa de bons amigos diante dos Estados Unidos. Só que desta vez quem paga a conta é o agronegócio. Se havia alguma esperança de que os norte-americanos retomassem os pagamentos relativos ao contencioso do algodão, pode esquecer. Na semana passada, durante evento patrocinado pelo USDA, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, o secretário Tom Vilsack disse que o país tem um bom relacionamento com o Brasil e que ele acredita em uma solução negociada para o caso. O economista-chefe do órgão, Joseph Glauber, foi mais direto e afirmou que não existe, por hora, qualquer iniciativa no sentido de voltar a fazer os depósitos. Ou seja, eles não vão pagar.

Com os repasses suspensos desde setembro de 2013, a campanha vitoriosa dos produtores brasileiros de algodão na Organização Mundial do Comércio (OMC), contra o todo-poderoso império econômico dos Estados Unidos deve mesmo é ficar na história. Até teríamos direito à retaliação, mecanismo previsto no painel da OMC que deu ganho de causa ao Brasil. A Câmara de Comércio Exterior (Camex), porém, já sinalizou de que não deve retaliar. A própria Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão) mudou o discurso. Sempre enfático na defesa e representação dos cotonicultores, agora considera a possibilidade de calote, sem ao menos esboçar reação, em uma postura similar à da Camex, que é a voz do governo.

Em uma análise bastante abreviada, vamos considerar que os pagamentos iniciados em 2010 e foram feitos até setembro do ano passado estão de bom tamanho. Afinal, com ­­US$ 12 milhões/mês foi possível fazer um caixa interessante no período. Por outro lado, tem a nova Farm Bill, a leia agrícola dos Estados Unidos, em vigor há duas semanas e que promete rever seus subsídios, inclusive do algodão, que foi um dos principais motivos da disputa entre os dois países na OMC. A interpretação, porém, não é tão simples assim. Primeiro, porque os pagamentos são devidos pelos prejuízos que os subsídios norte-americanos provocaram durante décadas aos produtores de algodão do Brasil. Essa dívida, então, tem a ver com o passado. E, depois, porque não há garantia de que a nova Farm Bill reduza, de fato, as distorções no comércio internacional.

Mas o que realmente dói é a passividade com que o assunto vem sendo conduzido. Os Estados Unidos deixarem de pagar e o Brasil deixar de receber não é um acordo, é um calote. E o mais grave é o Brasil não se posicionar, admitir um prejuízo que vai além da agricultura e que enfraquece o país nas relações internacionais, independente do segmento. Sem falar da zona de conforto e da arrogância dos EUA com o Brasil e com a OMC. Desconsideram uma determinação do órgão e, o que é pior, certos de que o Brasil não vai retaliar. O governo e também a Abrapa precisam, no mínimo, dar uma satisfação àquele que está na ponta do embate. O produtor de algodão, que neste caso representa o agronegócio brasileiro, precisa de respostas. E o Brasil precisa de atitude, porque senão fica fácil.

Os Estados Unidos espionam o Brasil (caso Edward Snowden), os Estados Unidos dão calote no Brasil e nós ainda vamos passear com eles no parque, como bons e velhos amigos. Acredito que os dois países têm interesses em comum e são grandes parceiros comerciais, relação que precisa ser valorizada. Contudo, a questão aqui não é apenas dinheiro, mas respeito, humildade e soberania.

Dentro da porteira

Enquanto isso, do outro lado, do lado de dentro da porteira, o produtor continua fazendo a sua parte. No ciclo atual, apesar dos problemas climáticos, a produção brasileira de grãos não deve romper a casa das 200 milhões de toneladas, potencial inicialmente previsto. Mas será um novo recorde, próximo de 195 milhões de toneladas. Outro indicador de referência da atividade é o PIB do agronegócio brasileiro. Conforme estudo da Assessoria de Gestão Estratégica do Ministério da Agricultura (Mapa), as riquezas geradas a partir do campo em 2014 devem superar R$ 1 trilhão. A se confirmar, o valor terá crescido 34% em dez anos.

O principal e maior de todos os desafios por aqui é o clima. O que não é de todo ruim, porque ele nos dá a certeza de que pelo menos deste lado da cerca a luta é mais justa. O inimigo é cruel e imprevisível, mas também é conhecido e declarado. Não está em Brasília e muito menos em Washington DC.

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