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Ei, você sabe que som é esse? É o barulho que um grande partido político faz quando perde o que restava de sua sanidade. E aconteceu – claro, onde mais? – na rede Fox News no domingo, quando Mitt Romney comprou completamente a ideia de que o preço da gasolina está alto graças a um complô da administração Obama.

Essa alegação é mais do que só maluquice; é uma loucura tripla – uma mentira embrulhada em absurdo e coberta de paranoia. É o tipo de coisa que se costumava ouvir de pessoas que também acreditavam que água fluoretada era um complô comunista. Mas agora a teoria da conspiração do preço da gasolina foi formalmente endossada pelo possível indicado à candidato presidencial republicano.

Antes de chegarmos às maiores implicações desse endosso, vamos primeiro acertar os fatos sobre o preço da gasolina.

Primeiro, a mentira: não, o presidente Obama não disse, como alegam muitos republicanos, que ele queria preços mais altos para a gasolina. Ele disse uma vez que o sistema do comércio internacional de emissões levaria os custos de energia a "disparar" – uma escolha infeliz de palavras. Mas dizer que um sistema desses aumentaria os custos energéticos era só uma afirmação factual, não uma declaração de intenção para castigar os consumidores americanos. A alegação de que Obama queria preços mais altos é uma mentira, pura e simples.

E é uma mentira embrulhada em absurdo, porque o presidente dos Estados Unidos não controla o preço da gasolina e nem mesmo tem muita influência sobre esses valores. O valor do petróleo é determinado no mercado mundial, e a América, que só equivale a um décimo da produção mundial, não é capaz de alterar muito esses valores. De fato, o aumento recente no preço da gasolina aconteceu apesar do aumento da produção de petróleo dos EUA e da queda na importação.

E, por fim, há a paranoia, a crença de que os liberais em geral, e os oficiais da administração Obama em particular, estão tentando fazer com que manter um automóvel se torne insustentável como parte de um complô nefasto contra o modo de vida americano. E, não, eu não estou exagerando. É isso o que se ouve até mesmo dos conservadores mais comuns.

Por exemplo, no ano passado George Will declarou que o apoio à rede ferroviária fornecido pela administração Obama não tinha nada a ver com aliviar congestionamentos e reduzir impactos ambientais. Não, ele insistia que "o verdadeiro motivo pela paixão dos progressistas por trens é o seu objetivo de diminuir o individualismo dos americanos para torná-los mais suscetíveis ao coletivismo". Quem diria que Dagny Taggart, a executiva ferroviária heroína do romance A Revolta de Atlas era uma comunista?

Tudo bem, isso é tudo muito engraçado, mas é também profundamente assustador.

Como apontado por Richard Hofstadter em seu clássico ensaio de 1964 intitulado "O Estilo Paranoico na Política Americana", teorias conspiratórias loucas têm sido uma tradição americana desde que o clero começou a dar avisos de que Thomas Jefferson seria um agente dos Illuminati da Bavária. Mas ter um grupo de paranoicos com um papel marginal na vida política da nação é uma coisa; agora, é outra coisa completamente diferente quando esse grupo toma conta de um partido inteiro, até chegar ao ponto em que os candidatos devem partilhar, ou fingir partilhar, da paranoia desse grupo para receber a aprovação presidencial do partido.

E não é apenas o preço da gasolina, claro. Na verdade, as teorias conspiratórias estão proliferando tão rápido que é difícil acompanhá-las. Por isso um grande número de republicanos – e estamos falando de figuras políticas importantes, não apoiadores aleatórios – acreditam firmemente que o aquecimento global é uma grande mentira perpetuada por uma conspiração mundial que envolve milhares de cientistas, dos quais nenhum jamais quebrou o código de silêncio. Enquanto isso, outros atribuem a melhora recente nas notícias econômicas a um complô covarde de segurar os fundos de incentivo e ir soltando-os pouco a pouco até momentos antes da eleição de 2012. E eu não vou nem começar a falar da reforma na saúde.

Por que isso acontece? Pelo menos parte da resposta repousa no modo como a mídia de direita conseguiu criar uma realidade alternativa. Por exemplo, você ouviu falar sobre como o custo do "Obamacare" [o modelo Obama do sistema de saúde financiado pelo governo criado por Mitt Romney] acabou de dobrar? Isso não aconteceu, mas milhões de telespectadores da Fox News e ouvintes de Rush Limbaugh [formador de opinião conservador] acreditam que sim. Naturalmente, as pessoas que constantemente ouvem sobre as maldades cometidas pelos liberais estão prontas e dispostas a acreditar que tudo de ruim seja resultado de um com­­plô liberal covarde. E essas são as pessoas que votam nas primárias republicanas.

Mas, e quanto ao eleitorado mais amplo?

Se, e quando, ele conseguir ser indicado, Romney tentará, como posto por um infeliz assessor, limpar sua ficha – isto é, apagar o registro de que ele estava apelando para um direita louca e convencer os eleitores de que ele é, na verdade, um moderado. E é possível que ele consiga.

Mas esperemos que não, porque o tipo de apelo em que ele se engajou durante sua busca pela indicação é algo importante. Seja lá aquilo em que Romney acredite pessoalmente, o fato é que, ao endossar as fantasias paranoicas da direita, ele está contribuindo para levar adiante uma tendência perigosa na vida política da América. E ele deveria ser responsabilizado por suas ações.

Tradução: Adriano Scandolara

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